Por felipe.martins

Rio- A Constituição assegura a liberdade de associação, mas veda a de caráter paramilitar. O Código Civil classificava as pessoas jurídicas de direito privado em associações, sociedades, fundações e firmas individuais. Em 2003 o texto foi alterado, passando a distinguir partidos políticos e organizações religiosas. Mas o caráter paramilitar continua vedado a todos.

Ser paramilitar não implica a defesa de atos violentos nem o uso de armas. O que o caracteriza é a natureza da organização e a estrutura funcional fundada em disciplina e hierarquia, compreendendo o planejamento de ação pela direção e execução pelos subordinados. O uso de uniforme apenas exterioriza a natureza paramilitar, mas não é requisito para sua existência, assim como hinos e palavras de ordem.

Neste contexto de ascensão da truculência no Brasil, onde a civilidade está sendo substituída pela violência, é preocupante a formação no seio de seitas neopentecostais de grupos de “gladiadores de Cristo”. Igualmente a reunião, em ato religioso, de militares do Exército fardados e armados pelo Estado, onde se declaram “prontos para vencer o Mal”, tal como na Maré, sem explicitar que Mal vão exterminar.

Da mesma forma é preocupante a disposição de PMs em forma — com armas pesadas em punho — onde repetem os gritos do comando, tais como “somos autoridades instituídas pelo Senhor”, quando são apenas agentes de autoridade numa democracia, e não autoridades ou guerreiros míticos numa teocracia. E mais, gritam que “pelo Senhor lutamos”, possibilitando incompreensão dos limites legais para a própria atuação.

O nazismo teve raízes míticas, dentre as quais a crença na força Vril, que se acreditava capaz de despertar o passado. Não sem razão a suástica nazista era no sentido anti-horário, evocando o que se encontrava no subterrâneo e na irracionalidade.

Foi a formação de grupos religiosos e simpáticos ao nazismo — como a Liga de Defesa Nacional Cristã e a Legião do Arcanjo Gabriel (transformada em Movimento Nacionalista da Guarda de Ferro, nos anos 1920 na Romênia) —, que por meio de perseguições aos judeus e trabalhadores de esquerda fez fugir para o Brasil a família Gleiser, composta também por Berta Gleiser, que 20 anos depois se casaria com o antropólogo Darcy Ribeiro. A história somente se repete como farsa, mas pode produzir similares danos se desconsiderada em momento no qual havemos de defender as liberdades.

João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito

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