Por bferreira

Rio - Há muito tempo eu não me emocionava tanto com uma entrevista. Há muito tempo eu não conhecia uma pessoa tão forte, tão corajosa e tão sofrida. Ela se chama Daniele Camargo Lima. É gaúcha, da cidade de Rio Grande, massoterapeuta de profissão, mãe de dois filhos, e está fazendo 50 anos este ano. Em 2007, foi atropelada por um ônibus. Ficou gravemente ferida, passou sete meses numa cama de hospital, fez mais de 20 cirurgias e hoje é campeã de maratona aquática, e está pronta fisicamente e cheia de esperança e ânimo.

De onde ela tira esta força não consigo imaginar, mas a gente pode sentir a energia que veio da dor e se transformou em disposição enquanto ela conta sua história. Eu me arrepiei o tempo todo enquanto ouvi seu relato. Daniele teve lesões muito profundas nas pernas e na mão esquerda. Ela se lembra de um momento do acidente, quando, ainda debaixo do ônibus, colocou parte da mão no lugar. Tem consciência de que poderia ter sido ainda pior se um pedestre não tivesse gritado com o motorista do ônibus, que não tinha percebido o atropelamento, e impedido que ela fosse atropelada, uma segunda vez, pelas rodas traseiras do veículo.

Daniele é muito grata à equipe médica do hospital, num tratamento todo feito pelo SUS, que reconstruiu suas pernas e sua mão. Foram muitos enxertos, ela nem sabe quantos, mas se lembra da dor e da sensação de participar das discussões sobre uma possível amputação das pernas, que durou parte dos meses em que ficou no hospital. Achava que tinha perdido os glúteos e não tinha nem coragem de perguntar aos médicos. Quando deixou a cama do hospital, mal ficava de pé. Perdeu também a cartilagem dos joelhos. Sentiu muita tonteira quando se levantou da cama pela primeira vez e ainda fica tonta quando sai do mar. Mas tem uma certeza: nenhuma dor será maior do que as dores que já teve.

Para aliviar as dores que ainda restaram decidiu nadar. Em mar aberto. Sem poder usar as pernas, porque não pode contar com o movimento das pernas, faz dos braços suas nadadeiras e se tornou maratonista, participa de competições, coleciona medalhas. As dores ainda são muito fortes. E para combatê-las dispensa remédios de toda sorte e faz do exercício seu analgésico. Quanto maior a dor, mais caminhadas ela faz, e mais musculação, mais natação. Quando a ciática ataca ela dobra o tempo da bicicleta, dobra os quilos dos pesos dos exercícios, aumenta o tempo da caminhada.

A vida de Daniele gira em função do mar e dos exercícios. Nada todo dia, caminha todo dia, faz musculação todo dia. Vive em permanente atividade, para não engordar, para se exercitar, para viver melhor, para diminuir as dores e para ganhar mais uma competição. Dia 6 de setembro o acidente completa 7 anos. Ela quer presentes. Comemora a data, feliz. E tem toda razão: é uma vencedora. Que venham as Paralimpíadas-Rio 2016!

E-mail: comcerteza@odia.com.br

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