Por bferreira
Rio - O Direito Penal tem servido para justificar várias práticas excludentes. Na América, a criminalização de dados tipos de drogas foi o instrumento que o Estado utilizou para reprimir a ascendência social de negros e hispânicos. O proibicionismo, ao contrário do que se preconiza, trata-se de arma usada para disfarçar o preconceito e levar pobres e negros ao cadafalso. Apesar de tratadistas colocarem o crime de uso e mercancia de drogas no capítulo da proteção à saúde, seu efeito prático é o encarceramento de ‘indesejáveis’. Se a razão fosse realmente a proteção à saúde, o julgamento dessas práticas antissociais deveria ser submetido a profissionais da saúde, e não à polícia e ao Judiciário.
Foi no Império que surgiu o primeiro decreto dirigido “aos escravos e outras pessoas” que portassem drogas. A identificação dos sujeitos da ação tipificada demonstra com facilidade a intenção ideológica do legislador de direcionar a punição para certo tipo de agente social. Embora de forma disfarçada, mas nem tanto, o legislador manteve-se fiel a essa ideologia de exclusão social tanto aqui quanto na América do Norte. Esse resultado encontra-se patente no perfil encontrado entre os aprisionados do sistema. A utilização da “guerra às drogas” tornou-se instrumento de controle social que, apesar dos recursos bélicos investidos, só serviu para baratear o produto considerado ofensivo à saúde, aumentar os números de usuários e vítimas indiretas das drogas, além de retroalimentar o mundo da corrupção.
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Não obstante, o Estado tem enganosamente investido numa forma equivocada de combate às drogas, reprimindo apenas uma parcela de usuários e comerciantes, uma vez que permanece em pleno funcionamento o cartel que financia toda essa estrutura capitalista, enquanto permanecem as vítimas sem as informações necessárias para decidir com liberdade sobre sua forma de vida. Não se trata de fazer qualquer tipo de apologia ao uso de produtos que eventualmente, pelo seu uso indevido ou excessivo, possam causar danos à saúde, assim como o sal, o açúcar, as gorduras e as várias drogas lícitas. Mas o desejável é que sejam tratados todas as drogas e seus usuários com o cuidado e o controle necessários para evitar que uma guerra fratricida continue matando inocentes dos dois lados.
Siro Darlan é Desembargador do TJ e membro da Associação Juízes para a Democracia