Por thiago.antunes

Rio - A ação policial que culminou na morte das nove pessoas, segundo a polícia, ou 13, de acordo com moradores da Nova Holanda, chocou membros de ONGs e associações que trabalham na Maré. Dálcio Marinho, do Observatório de Favelas, criticou o que classificou como falta de planejamento do Bope para entrar na comunidade.

Para ele, a morte de um policial durante a ação deixa claro que faltou organização à PM.

“Foi desastroso. A polícia agiu por impulso, sem coordenação. Como um batalhão como o Bope pode fazer isso?”, indagou Dálcio, um dos diretores da ONG que recentemente mapeou e nomeou todas as ruas da Maré, num projeto de retomada de cidadania que tem como parceira a Prefeitura do Rio: “Não somos contra a UPP, mas isso dificulta a relação do morador com a polícia.”

Faixa de moradores de rua no Complexo da MaréDivulgação

Luke Dowdney, da Luta Pela Paz, que oferece a crianças e adolescentes a chance de se integrar à sociedade através de boxe e artes marciais, estava desolado. Há 13 anos na comunidade, o britânico que adotou a Maré lamentou o ‘cartão de visitas’ para a chegada da UPP, prevista para este ano.

“Cada vez que temos operação policial aqui, acaba meu sonho de paz”, relata ele. A Luta pela Paz já formou 10 mil alunos desde que foi criada.
“Não entendo como estes jovens que fizeram o arrastão não foram presos na Avenida Brasil, já que tinha muita polícia lá. A vida de quem vive numa favela vale tanto quanto a de quem vive no asfalto.”

Édson Diniz, da Redes da Maré, que articula lideranças locais, acha que a ação põe em xeque a chegada da UPP à Maré. “Eles entraram nas casas sem mandado, com uma série de arbitrariedades. Ações como esta aumentam a desconfiança do morador.”

Fala de viúva emociona

O amor do sargento Ednelson dos Santos pela farda preta, que usava há 13 anos, foi lembrado pela viúva Fabiana, durante o sepultamento ontem à tarde, no Jardim da Saudade de Paciência.

“Ele amava o que fazia e até abdicava dos filhos porque acreditava na polícia”, desabafou, emocionando os 400 presentes, a maioria do Bope.

A comoção tomou conta dos policiais, que choraram e enterraram o amigo com honras militares. Num misto de dor e revolta, muitos seguiram direto da operação na Maré para o velório, onde consolaram os filhos da vítima. O menino de 12 anos usou camisa com o símbolo da caveira, que o pai tatuou no braço.

A operação da PM vai sufocar o tráfico na Maré e tem como objetivo a prisão do traficante Rodrigo da Silvaz Caetano, o Motoboy, chefe da quadrilha da Nova Holanda e que teria dado ordem para os bandidos fecharem as pistas da Av. Brasil.

Até quando? - Jaílson de Souza e Silva e Edson Diniz - Do Observatório de Favelas e da Redes da Maré, respectivamente

Qual o papel que se espera das forças do Estado? Como entender quando as forças policiais praticam a vingança usando seu poder armado? Como sentir-se um cidadão pleno de direitos morando na favela, diante de uma ação de massacre por parte daqueles que deveriam garantir a segurança?

A ação do Bope, Força Nacional e Batalhão de Choque na Maré parece não ter fim — e não terá, mesmo quando terminar. Escrevemos no calor da mobilização para que essa ação de extermínio de direitos e pessoas acabe. Conclamamos os governantes que isso tenha fim e que os policiais parem com sua prática de vingança contra a população local; mas não fomos ouvidos por eles, até agora. Mas fomos ouvidos nas redes sociais, pela mídia; e estamos sendo ouvidos por todos que não suportam mais a ação desse estado partido, que trata moradores das favelas como seres menores.

Queremos afirmar que os responsáveis por isso não são simplesmente os policiais; são, acima de tudo, o secretário de Segurança e o governador, que não atenderam aos nossos pedidos para que essas ações fossem paralisadas antes do massacre acontecer. E eles devem responder por isso, assim como aqueles que fizeram esse ato. Pois a morte de um policial por bandidos é lamentável; mas a morte de outras tantas pelas forças do Estado é arbítrio e um horror.

Bando temia pela munição no confronto

A PM apreendeu na Maré armas, drogas e munição. Segundo um policial que pediu anonimato, bandidos foram flagrados durante o intenso tiroteio pedindo a comparsas no radiotransmissor que ‘segurassem’ nos disparos pois a munição em mãos estava acabando.

Os militares encontraram três fuzis, uma metralhadora, duas pistolas, uma carabina, granada e munição de vários calibres, além de 20.150 sacolés de cocaína, 5.560 trouxinhas de maconha e 150 pedras de crack.

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