Rio - Professor do Pedro II, Tarcísio Motta será o candidato do Psol ao governo do estado. Vascaíno e portelense como Eduardo Paes, fã de Candeia, Cartola e Zeca Pagodinho, o historiador se apresentará ao eleitor como uma espécie de representante das manifestações de junho do ano passado, para atrair o voto dos insatisfeitos com a política.
Ou, como ele diz, “com a velha política”. Aos 39 anos, pai de três filhos, estudou sempre em escola pública, desde a infância, em Petrópolis, e na Universidade Federal Fluminense, em Niterói. Sempre militando em prol da educação. Diretor do bloco de rua Bagunça Meu Coreto, ele quer agora acabar com a farra na política no Estado do Rio.

O DIA: O senhor é um desconhecido do eleitor, que imaginava ver Marcelo Freixo como candidato do Psol. Como se deu a construção da sua candidatura?
Tarcísio: As manifestações de junho pediam uma perspectiva nova para a política, e o Psol discutiu como deveria se apresentar para esta eleição. A ideia era uma candidatura que tivesse a ver com estas manifestações. E eu tanto participei como tenho minha história vinculada à Educação. Como os deputados Marcelo Freixo e Chico Alencar vão permanecer no parlamento para fortalecer nossas bancadas, a gente fechou esta estratégia, e aceitei o desafio.
Quais as reais expectativas em relação à sua votação? Receber os votos que serão dados ao Freixo e ao Chico Alencar e dos descontentes com a política?
O Psol teve votação expressiva no Rio, em Niterói e São Gonçalo em 2012. A expectativa é crescer, e crescer muito. Vamos mostrar que governar não é apenas dirigir, mas criar condições para que as pessoas se autogovernem e participem. Junho não foi a negação da política, mas da velha política. É uma candidatura que só tem a crescer. Vamos disputar votos e ideias.
Será uma eleição contra o atual governador, um ex-governador e dois senadores. Uma tarefa difícil.
São todos representantes da velha política. São todos “Cabrais”. Se a ideia era o “Fora, Cabral”, se isso ficou tão forte em 2013, temos que mostrar que o problema do Cabral não era ele em si, mas a política que ele representa. E essa política está presente no Garotinho, no Lindbergh e no Crivella. E, claro, no Pezão. Eles representam o mesmo modelo. O PT faz parte do projeto de poder do PMDB do Rio. É vice do Eduardo Paes. Eles são mais do mesmo, são o que as ruas rejeitaram. E a gente quer ser a alternativa.
Que alternativa? O que vocês têm de diferente?
Não vamos aceitar financiamento de grandes empreiteiras, que vão financiar todas as outras candidaturas. Não teremos esse vínculo financeiro. Queremos um novo modelo para o Rio, que vai incorporar as lutas sociais, a pauta LGBT, a feminista, a legalização das drogas, a desmilitarização da PM. São pautas que estarão na nossa campanha e que vêm das ruas.
O senhor é a favor da desmilitarização da PM?
Desmilitarizar não é acabar com a polícia. É preciso explicar isso. Hoje a militarização é a resposta para qualquer conflito, e isso não está dando certo. Caveirões foram comprados, bilhões foram investidos, e mesmo assim as pessoas estão inseguras porque o processo de enfrentamento não dá resultado e leva a mais e mais mortes. A desmilitarização é boa para a própria PM. Significa pensar um novo processo de formação, de carreira única, onde todo mundo pode ter acesso aos postos mais altos da corporação. Ela concederia direitos aos policiais. O governador não tem o poder de desmilitarizar a polícia, mas de adotar políticas desmilitarizantes.

Por exemplo?
A UPP, que é um programa de controle e domínio de território.
O senhor é contra?
Não. Mas ela precisa ser mais do que isso. O governo a apresenta como polícia comunitária. Ela é na verdade o policiamento da vida comunitária, que fica subordinada à polícia. Isso é militarizar o cotidiano das pessoas. E a gente é contra. É preciso construir uma política de segurança que tenha a garantia de direitos básicos das pessoas.
E sua posição em relação às drogas?
A política antidrogas fracassou. É uma guerra aos pobres disfarçada. A quantidade de pessoas mortas neste processo é muito maior do que a de pessoas que estão morrendo por uso de drogas. Legalização não é liberação, não é incentivo ao uso. O álcool é droga que causa diversos males, e é tratado com problema de saúde, não com proibição. O tabaco, a mesma coisa. O governador tem que defender essa bandeira, levantada pelo Jean Wyllys, na Câmara.
E as greves? Se for eleito governador, o senhor automaticamente passa para o outro lado. Como o senhor se imagina mediando este conflito, já que não vai poder dar o salário pretendido no primeiro dia de gestão?
A primeira coisa a fazer é instituir a data-base do funcionalismo. Isso resolve parte enorme dos problemas, porque há a insegurança no servidor, se ele vai receber ou não reajuste naquele ano porque não há a obrigatoriedade da negociação. O professor, então, parte do princípio de que tem sempre que ir para a luta para conseguir a negociação. Isso dá para fazer imediatamente. A segunda coisa é que, no caso do Rio, nem é tão difícil de valorizar o servidor, porque a Lei de Responsabilidade Fiscal coloca o limite de 49% da receita para gastos com pessoal. O Rio não chega a 30%. Então, há uma margem grande para fazer isso. É uma questão de prioridades. É fácil de resolver? Não. Mas essa negociação vai acontecer.
Que leitura o senhor faz dos protestos de 2013 e da violência que afastou o povo das ruas?
A violência partiu, sobretudo, do Estado. As pessoas vinham para a rua em solidariedade às vítimas da violência policial.
Pelo Estado, mas não só pelo Estado, também por manifestantes.
A violência do Estado gera uma resposta violenta, que muitas vezes é autodefesa. Só que isso virou uma escalada de violência. Isso afastou muita gente. E aí a violência da polícia se torna mais efetiva, e a resposta também se torna mais violenta. O protagonismo para resolver tinha que ser do Estado, com política. Mas a gente não pode achar que só há duas formas: criminalizar os black blocs ou agir como eles. Não. Há que se entender o contexto de que a violência partiu do estado.

Nem sempre. A sede do PSTU foi depredada, bancas de jornais, carros, casas. E o PSTU está longe de ser o Estado, não?
Não é possível atacar a sede de um partido, de esquerda ou direita, por diferenças ideológicas. Está errado e não podemos ser coniventes com isso. E há mecanismos jurídicos para isso. Mas ação da polícia não é atacar a manifestação, mas garantir que isso não aconteça. No Leblon, a polícia deixou a coisa correr durante mais de uma hora para depois reprimir. Não é o papel dela. Polícia é prevenção. E aí saiu do controle de todos.
E a Copa? Vai torcer pela seleção brasileira?
Os protestos não podem se confundir com o ataque ao futebol, que faz parte da nossa cultura. Adoro futebol e vou torcer pela seleção. Mas... se não ganhar, tem a promessa do Eduardo Paes se matar em caso de vitória da Argentina (risos). É tentador. Minha recusa em torcer pela Argentina é muito menor nesta Copa (risos).
O Rio de Janeiro vai aceitar um governador com rabo de cavalo (risos)?
Ter cabelo comprido não é mais transgressor como nos anos 60. É melhor ter rabo de cavalo do que ter rabo preso (risos).
Para encerrar: entre Dilma e Aécio, o senhor vota em quem?
Há diferenças reais entre a política estabelecida pelo governo FHC e o governo petista, como a valorização do salário mínimo, o crescimento das universidades públicas e do Bolsa Família, só que isso é pouco. O PT não tinha o direito de fazer tão pouco. Mas ainda é cedo para responder isso.