Por bianca.lobianco

Rio - Da janela de sua casa, no alto do Morro da Conceição, na Região Portuária, o artista plástico Paulo Gallier observa a paisagem da Praça Mauá descortinada pela queda do Elevado da Perimetral. Lado a lado, a modernidade do Museu de Arte do Rio (MAR) e a arquitetura clássica dos armazéns do Cais do Porto parecem ter sido sempre emolduradas pela Baía de Guanabara, sem que o ‘monstro de concreto’ que atrapalhava a vista da Praça Mauá tivesse existido. Esta, e quase todas as transformações pelas quais a região passou no último século, foram testemunhadas por um senhor que nasceu no local há 82 anos e é apontado por muitos como o morador mais antigo — e figura folclórica — do bairro. 

É justamente o resgate histórico, através de depoimentos de especialistas e personagens como ele, que presenciaram as várias mudanças da região, que uma série de cinco curtas-metragens lançada pela concessionária Porto Novo e disponibilizada, gratuitamente, na internet (www.retomadadoporto.com.br), busca.

“A revitalização da região fez com que prédios e histórias que permaneciam ‘submersas’ à Perimetral ressurgissem. Trata-se do berço da cidade, um local que abriga enorme potencial cultural e turístico”, ressalta o diretor das filmagens Marcelo Santiago.

O artista plástico Paulo Gallier vive há 82 anos na Zona Portuária%3A lembranças do desembarque dos pracinhas e de Carmem MirandaEstefan Radovicz / Agência O Dia

No menu de vídeos, peculiaridades e fatos históricos desconhecidos por muitos cariocas. A viagem pelos séculos passa pelos tempos do Brasil-Colônia, quando uma fortaleza foi construída no Morro da Conceição, em 1711, para impedir uma iminente invasão francesa ao Brasil.

Na época, a área que hoje compreende os bairros do Santo Cristo, Saúde e Gamboa era considerada nobre e formava a Pequena África, alcunha popular dada pelo intenso comércio de escravos. O nascimento do samba, que dizem ter sido na região, também é destrinchado por historiadores.

Dos últimos cem anos, histórias recontadas por personagens como Gallier, que não esconde a emoção ao lembrar dos tempos áureos do bairro. “Lembro de ter ido receber com meu pai, na Praça Mauá, os pracinhas que voltaram da Segunda Guerra Mundial e a última visita da cantora Camen Miranda ao Brasil. Era um local de celebrações”, descreve. Dentre as lembranças inusitadas, ele cita uma prostituta francesa, que causou furor entre jovens e marinheiros da região nos anos 40, por aportar no Brasil com saliências inovadoras para a época.

Orgulhoso do bairro, Gallier começa a sentir os reflexos positivos e negativos das modificações no bairro. “Estão descobrindo nosso potencial cultural. Em compensação, o preço dos aluguéis triplicou”, pondera.

Moradores torcem para que turismo seja explorado

O sucesso dos curtas-metragens e as descobertas históricas pelo grande público motivaram o lançamento de um longa-metragem sobre a região, previsto para o ano que vem e batizado, provisoriamente, como ‘A Retomada do Porto’.

Para os moradores da Zona Portuária, a expectativa é de que o potencial turístico local seja explorado. Empresários de localidades como o Morro do Carmo se estruturam para receber estrangeiros e brasileiros em seus ateliês e bares.

“Temos uma vista deslumbrante da Baía de Guanabara, arquitetura histórica e o bucolismo típico do local”, garante o artista plástico Gallier.

O pintor, que se auto-define como um ‘portal do morro’, devido ao alto número de turistas estrangeiros que recebe, gratuitamente, em seu ateliê, sonha com uma justa e definitiva homenagem: expor no MAR. “É no meu bairro, mas nunca fui convidado. Seria uma consagração”.

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