Por nicolas.satriano

Rio - Moradores do Complexo do Alemão demonstraram neste sábado, numa manifestação pacífica, que o “silêncio da dor na comunidade grita por paz e justiça”, como se lia num dos cartazes. Depois de 90 dias de intensos tiroteios, com seis pessoas baleadas nas últimas 72 horas — três delas morreram, entre elas o menino Eduardo Ferreira, de 10 anos —, pelo menos mil pessoas participaram da maior passeata pela paz já realizada desde a implementação das UPPs, há quatro anos. Há novo protesto programado para este domingo, às 10h, na Praia de Copacabana, na altura da Princesa Isabel.

Moradores protestaram neste sábado pela paz no Complexo do Alemão e relataram que PMs utilizaram gás de pimenta para impedir a população de descer e participar do atoFoto%3A Fabio Gonçalves / Agência O Dia

Durante o ato, o clima foi de tensão pela presença de mais de 300 policiais militares, apoiados por blindados (caveirões) e um helicóptero, que acompanharam a caminhada, da entrada da Favela da Grota, cruzando a Av. Itararé, até a Praça de Inhaúma. Um grupo de mototaxistas abriu o caminho. Nenhum incidente, porém, foi registrado. No microfone, entretanto, os organizadores do protesto, convocado pelas redes sociais, denunciaram que moradores das partes altas do complexo e da Vila Cruzeiro, na Penha, foram impedidos de descer por PMs, que teriam utilizado gás de pimenta. A assessoria das UPPs negou.

O corpo de Eduardo seguirá neste domingo para o Piauí, onde será enterrado. A mãe do garoto, Terezinha Maria de Jesus, 40, causou comoção ao tentar participar do movimento, mas passou mal e teve que ser retirada logo no início. Ao ver soldados do Batalhão de Choque perfilados, Terezinha não se conteve: “Assassinos! Vocês mataram meu filho, covardes!”, gritou várias vezes em direção à tropa, antes de ser amparada por parentes.

Mãe do jovem Eduardo se revoltou com policiais durante o ato pela pazEfe

Boa parte dos moradores, com medo de que os conflitos do dia anterior se repetissem, preferiu ficar em casa, mas estendeu lençóis e camisetas brancas nas lajes e janelas. “Não sejam omissos, saiam de suas casas para protestar. Hoje sou eu quem choro a morte do meu filho (o mototaxista Caio da Silva, 20, em maio do ano passado, de bala perdida) no Cemitério do Caju. Amanhã pode ser um de vocês”, conclamou Denise da Silva. Líderes comunitários de outras favelas e pessoas que tiveram parentes mortos em conflitos estiveram presentes e deram depoimentos. O ator Paulo Betti participou do ato. No fim do dia, houve distribuição de ovos na ‘Pazcoa do Alemão’.

'Sem proteção a ninguém', diz delegado

Os pais e duas irmãs de Eduardo partirão, hoje de manhã, em um voo para o Piauí, onde o menino será sepultado. Eles deverão ficar lá por cerca de dez dias. As passagens, o traslado do corpo — que já foi liberado do IML — e o enterro serão custeados pelo governo do Rio de Janeiro.

Em um encontro com os familiares ontem, o delegado Rivaldo Barbosa, chefe da Divisão de Homicídios, disse que a Polícia Civil não medirá esforços para punir os responsáveis pela morte do garoto.“Vamos nos empenhar ao máximo para chegar aos culpados. Não vai ter proteção a ninguém. É preciso definir quem atirou e punir os responsáveis” afirmou Barbosa aos pais de Eduardo.

A secretária estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, Teresa Consentino, disse que o estado tem que dar uma resposta correta à família.

Segundo João da Silva, da ONG Rio de Paz, 17 crianças foram mortas no Rio, vítimas de confrontos, desde 2007. “Essa política de segurança, que só mata jovens pobres, negros e favelados, está equivocada”, criticou.

Colaborou Gustavo Ribeiro

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