Por paulo.gomes

Rio - A ocupação do edifício Hilton Santos, na Avenida Rui Barbosa, uma das áreas mais nobres do bairro Flamengo, por cem pessoas, já era prevista por moradores vizinhos. Em dezembro do ano passado, O DIA publicou uma reportagem alertando para os riscos de invasão. O imóvel, na Avenida Rui Barbosa, foi invadido na madrugada de terça-feira por um grupo ligado ao Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST).

Antiga sede do Clube de Regatas do Flamengo, está arrendado pela empresa REX, do empresário Eike Batista, que pretendia adaptar o imóvel para abrigar ali um hotel quatro estrelas. Com a crise no conglomerado de Eike, as obras nunca aconteceram.

Segundo líderes do grupo, que estava acampado em alguns pontos da Cinelândia, os invasores seriam oriundos de outras duas ocupações: de um imóvel da Cedae, na Via Binário, e de outro da Telerj, no Engenho Novo.

À tarde, duas viaturas do 2º BPM (Botafogo) faziam a segurança na entrada do imóvel, de 25 andares e 454 quartos. Os policiais impediam a entrada de mais pessoas, água e alimentos. A estratégia é obrigar que as famílias deixem o prédio, que, totalmente depredado há três anos, não tem energia elétrica e nem água potável.

Policiais do 2ºBPM (Botafogo) reforçaram a segurança em frente ao edifício do empresário Eike Batista%2C no Flamengo%2C que foi invadido na madrugada desta terçaReprodução / TV Globo

“Já estamos passando fome e sede, mas vamos resistir. Nós só queremos ter um lugar digno para morar”, disse Alexandre Silva, 37. Segundo ele, entre os invasores, que arrombaram cadeados para entrar, a metade é composta por mulheres, seis delas, grávidas.

A assessoria do Flamengo informou que “a direção do clube está atenta aos acontecimentos”, mas alegou que cabe à REX solicitar a reintegração de posse à Justiça. O mesmo argumento foi usado pela prefeitura. Pela manhã, dois representantes da empresa de Eike Batista tentaram negociar a saída dos sem-teto. A assessoria da EBX não retornou os telefonemas nem o e-mail enviado até o fechamento desta edição.

A crise nas suas empresas obrigou Eike a repensar os investimentos para a reforma do prédio, da ordem de R$ 100 milhões. O imóvel foi alugado em 2012. Abandonado, o edifício passou, em 2014, a pedido da Associação de Condomínios do Morro da Viúva (Amov), por vistorias da Vigilância Sanitária. Foram encontrados ninhos de ratos, caramujos africanos e muito lixo.

Alerta feito em dezembro

Terça-feira, através de nota, a presidente da Associação de Condomínios do Morro da Viúva, Maria Thereza Sombra, lembrou que “há meses”, as autoridades, o Flamengo e o Grupo EBX foram avisados sobre o risco. Ela se reuniu com dois representantes do EBX, Gunnar Pimentel e Fábio Melensek. "Conversamos a respeito da insegurança e insalubridade do local. Ambos prometeram tomar providências e informaram que vão pedir a reintegração do imóvel”, disse a presidente da associação de moradores.

Moradores de prédios vizinhos, na Av. Oswaldo Cruz, se disseram “indignados”. “É um descaso total das autoridades. Vai desvalorizar nossas propriedades”, desabafou o médico Luizmar Santiago, de 57 anos, que mora há 40 anos na localidade.

Dirigente do Flamengo já temia por invasão ao edifício

Também no final do ano passado, o vice-presidente de patrimônio do Flamengo, Wallim Vasconcellos, foi sucinto sobre a responsabilidade da administração do Morro da Viúva. "Toda responsabilidade é da EBX. Estamos conversando continuamente com eles para buscar uma solução, mas já nos disseram que não há jeito. Além da vizinhança, que pode sofrer com doenças, há o perigo do prédio ser invadido", relatou Vasconcelos.

No último dia 26 de março, cerca de 300 famílias deixaram de forma pacífica o terreno da Cedae. A maioria das pessoas que ocupavam o local é proveniente das invasões ao antigo prédio da Companhia Docas, apelidado de Bairro 13; e do antigo edifício da operadora de telefonia Oi, no Jacaré, na Zona Norte. O primeiro foi demolido e o segundo invadido pela PM, ambos em fevereiro e abril de 2014, respectivamente.

Um negócio sob sigilo

Pelo contrato feito com a EBX em 2012, o Flamengo receberia inicialmente R$ 17,6 milhões e, com a operação do hotel, teria 2,63% da receita bruta, com um mínimo mensal garantido de R$ 270 mil. Mas as transações sempre foram muito sigilosas. O Flamengo não revela detalhes.

Em 2013, chegou-se a noticiar que o Grupo EBX havia desfeito o arrendamento, mas a empresa já teria pago R$ 18 milhões ao clube, em duas parcelas. Na ocasião, a ex-presidente Patrícia Amorim teria usado metade do dinheiro para colocar salários de jogadores em dia.

Outro empreendimento de Eike com as obras emperradas é o antigo Hotel Glória, adquirido em 2008 ao custo de R$ 80 milhões. Em reforma desde 2010, o hotel, rebatizado de Glória Palace, teve a fachada tomada por pichações, imperando o aspecto de abandono. Eike o vendeu ao grupo suíço Acron por cerca de R$ 260 milhões, mas o empresário fechou um outro acordo para participar do desenvolvimento do empreendimento.

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