Por felipe.martins

Rio - A morte de Eduardo Felipe Santos Victor, de 17 anos, chama a atenção para uma estatística que não para de crescer no Rio: os autos de resistência. As investigações do caso ocorrido terça-feira no Morro da Providência só mudaram de rumo devido ao flagrante em vídeo que moradores fizeram dos PMs da UPP forjando um confronto com o jovem. Mas os registros de mortes em confronto com a polícia são alarmantes. Entre janeiro e agosto foram 459 casos no estado, uma alta de 18% em relação ao mesmo período do ano passado. É como se a polícia matasse 57 pessoas por mês ou 1,91 por dia. Na Capital, onde aconteceu a maioria dos casos, foram 227 registros contra 174 no ano passado, uma alta de 30,4%.

Christian Andrade, 13 anos, morto em Manguinhos, Rodrigo Lourenço, 30 anos, encontrado morto no São Carlos, Ramon Moura, morto no Complexo de São Carlos, Herinaldo Vinícius, 11 anos, morreu baleado no Caju, Eduardo Ferreira, 10 anos, morreu baleado no Alemão, DJ Diego Luniére foi ferido no Morro do Fallet e morreuDivulgação

“Pode ser que esses números sejam um alerta de que a tendência à queda da violência nas comunidades que testemunhamos esteja sendo revertida”, avaliou o diretor da Anistia Internacional no Brasil, Átila Roque. O órgão divulgou em agosto um relatório detalhando 220 autos de resistência ocorridos em 2011. “Até abril de 2015 a Polícia Civil não havia concluído 183 destes inquéritos, ou seja, 83% deles”, criticou Roque. 

Além dos autos de resistência, outras mortes nas favelas são causadas por balas perdidas e por erros de policiais. Em setembro, Christian Andrade, de 13 anos, foi morto quando jogava futebol em Manguinhos. Já Herinaldo Vinícius de Santana, 11, foi baleado ao ser confundido com bandido por PMs da UPP Caju. Ele corria por um beco da favela para comprar uma bola de ping-pong. Balas perdidas tiraram as vidas de Eduardo de Jesus Ferreira, 10, em abril no Alemão; e do DJ Diego Luniére, 23, em maio no Fallet. Em todos os casos, os moradores acusam a polícia e as vítimas não tinham passagem pela polícia.

As mortes dos motoboys Rodrigo Marques Lourenço, 30 anos, e de Ramon Moura de Oliveira ainda são um desafio nas investigações. Eles foram encontrados no alto do Morro do São Carlos assassinados a facadas em maio. Os moradores acusam PMs do Bope que faziam operações na região. Nas mortes de Patrick Ferreira Queiroz, 11, em janeiro, no Camarista Méier e Felipe Ferreira de Souza, 16, na Maré, os registros foram de auto de resistência.

No caso ocorrido no Morro da Providência, em 2004, citado ontem pelo DIA, os policiais da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) investigados por envolvimento nas duas mortes em confronto foram inocentados na Justiça.


Moradores querem oportunidades

O DIA solicitou às polícias Civil e Militar, e ao Ministério Público informações sobre os andamentos dos inquéritos ou processos. Somente a PM respondeu que nas mortes de Eduardo, Christian e Herinaldo, há inquéritos investigando as ações dos policiais.

“Observei em meu estudo que a maioria dos autos de resistência vai para o arquivamento do procedimento no momento em que o Ministério Público (MP) decide que essas mortes não contrariam o ordenamento da Justiça e que são, portanto, mortes legitimadas pelo poder jurídico”, diz o delegado Orlando Zaccone. Ele analisou 300 casos de autos de resistência ocorridos no Rio entre 2003 e 2009. Desses, 297 foram arquivados.

De acordo com a Anistia Internacional, em 2011, nos 20 países que tinham pena de morte no planeta, 676 pessoas foram executadas. No mesmo ano, apenas nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, 970 pessoas morreram em autos de resistência.

“A UPP é um projeto maravilhoso, mas os governantes prometeram muito mais do que polícia e nada chegou”, critica Gilmar Lopes, morador da Ladeira dos Tabajaras. “As trocas de tiros viraram rotina. Nem sei mais em que patamar estamos por causa da volta dos confrontos. A UPP é uma janela de oportunidade para receber investimentos”, disse Charles Siqueira, do Morro dos Prazeres.


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