Por felipe.martins
Coordenador da Ceds critica falta de apoio do governo Dilma para a implementação de políticas públicas para LGBTsCristina Granato / Divulgação

Rio - Na última semana, teve fim a 3ª Conferência Nacional LGBT, realizada em Brasília. O evento foi cercado de polêmica ainda antes de acontecer, ao excluir do quadro de convidados os gestores públicos de programas para LGBTs nos municípios. A oposição LGBT ao governo Dilma acusou a organização de partidarizar a reunião. A plenária, segundo ativistas, foi marcada pela desorganização. As propostas apresentadas eram recicladas de conferências anteriores. O clima era de fim de festa. As discussões giravam em torno de como o movimento LGBT deveria se comportar com o fim do governo petista. Um dos excluídos, o coordenador da Diversidade Sexual da prefeitura do Rio, Carlos Tufvesson, disse ter ficado "perplexo" com a ausência do convite pela organização

O DIA - A concepção da Conferência Nacional LGBT é a de ser um fórum para a discussão de políticas públicas. No entanto, neste ano, justamente os gestores foram deixados de fora. Como o senhor viu isso?

Carlos Tufvesson - Sempre participei de reuniões de organização das conferências como militante antes de estar na prefeitura. Por mim, isso foi visto com bastante perplexidade. Não consigo imaginar políticas públicas sem a participação dos gestores municipais, estaduais e federais. Ao mesmo tempo, isso se reflete à eterna não relação que houve com o ente federal. O que é mais absurdo nisso tudo é a proibição do acesso de um gestor da área e a recusa de um ofício protocolar da Prefeitura do Rio.

Apesar da negativa, Alessandro Melchior, coordenador de políticas públicas para LGBTs da prefeitura petista em São Paulo, participou como convidado da Conferência. O senhor acha que pode ter havido retaliação a gestores que integram governos de partidos a favor do impeachment?

Realmente prefiro não imaginar desta maneira. Até porque, pessoalmente, não sou favorável ao impeachment pelas razões que se apresentam na denúncia. Caso essa retaliação ficasse comprovada, supostamente seria prevaricação.

O mandato da presidente coincidiu com a sua presença a frente da Ceds (Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual). Como o senhor avalia a gestão da presidente Dilma na área de Direitos humanos para LGBTs?

Neste governo, os números oficiais de crimes contra as minorias (negros, mulheres, intolerância religiosa, LGBTs) em alta há seis anos, falam por si só. O governo Dilma tem manifestações recordes contrárias aos direitos dos LGBTs em nosso país. Em nenhum outro governo, um presidente falou em entrevista que um material contra bullying seria "propaganda de opção sexual". Em nenhum outro governo foi proibida uma campanha de prevenção às DSTs para jovens LGBTs, mesmo após ter sido apresentada pelo ministro da Saúde. Em nenhum outro governo manobrou-se para que fosse retirado o relatório da criminalização da homofobia quando o mesmo já estava na Comissão de Direitos Humanos do Senado. Fruto de anos de articulação de vários militantes. Nunca a chantagem foi tão aceita quando se tratava do assunto LGBT neste governo.

Como gestor, o senhor teve apoio do governo federal para implementação de políticas públicas?

Infelizmente, nunca tive. E não foi por falta de pedido de cooperação, só acredito em trabalho feito assim, ou de oferecer ajuda para a criação de políticas federais. Com exceção da adoção do Relatório SINAN - a Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual da Prefeitura do Rio de Janeiro incluiu a homofobia no relatório, em 2012. Como eu disse, essa política pública nasceu no nosso município e foi reconhecida a importância pelo então ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Ele tornou essa norma para todo o Brasil. Uma norma federal e usada até hoje. Esse é apenas um exemplo de como a colaboração entre os entes da federação poderiam ter levado as políticas públicas s para as minorias mais a frente. Lamentável.

Movimento trans recebeu atenção do governo federal, mas ainda insuficiente 

Um dos principais projetos da Ceds é o Damas, que capacita travestis e transexuais para o mercado de trabalho. Em outra frente, Tufvesson articulou campanhas contra a homofobia e a transfobia veiculadas nos meios de comunicação. É notório tanto o esforço do coordenador da CEDs na prefeitura quanto de Claudio Nascimento, no Rio Sem Homofobia, do governo do estado, em capacitar o servidor público no atendimento ao cidadão LGBT. No entanto, ainda há muito a avançar, principalmente na área da saúde. No movimento trans ainda é grande a queixa de mau atendimento na rede pública com o desrespeito à identidade de gênero. 

Se há um legado de Dilma no segmento LGBT é o da ampliação de direitos para pessoas trans. Em 2013, houve a regulamentação para os homens trans do direito ao processo transexualizador no SUS (conhecido ainda erroneamente como mudança de sexo) já garantido às mulheres em 2008 pelo governo Lula. Contudo, o serviço ainda engatinha com uma fila de espera de até cinco anos para o paciente. Atualmente, são apenas quatro os hospitais que fazem a cirurgia em todo o país.

E no apagar das luzes do governo, depois de protestos de homens e mulheres trans, Dilma autorizou o uso do nome social nos órgãos públicos federais em decreto publicado na última sexta-feira.

No entanto, o discurso da presidente na Conferência acabou evidenciando a apatia do governo ao elaborar contundentes políticas públicas para LGBTs. Ao elencar conquistas dos últimos anos, ela citou o direito ao casamento civil para pessoas do mesmo sexo, uma vitória sem nenhuma participação do governo federal. A criminalização da homofobia e da transfobia só teve respaldo de Dilma quando usada para contrapor o discurso homofóbico de Marina Silva nas eleições presidenciais, contrário ao casamento civil entre pesosas do mesmo sexo.  Dilma prometeu apoiar a criminalização da homofobia. Prometeu e esqueceu. Em outra área, Jean Wyllys tentou conseguir de Dilma apoio a Lei João W Nery que garantiria aos transexuais a mudança de nome no registro civil, mas não obteve sucesso.




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