Para minimizar essa indesejável possibilidade de desconcentração dos centros urbanos será necessária uma grande reorganização do seu uso e rotina. Por exemplo, incentivar o uso mais intenso da cidade nos momentos em que ela é menos utilizada e adotar definitivamente horários específicos para cada grupo de atividades econômicas, como indústria, varejo e serviços, aliás, o que já vem acontecendo como medida de controle da pandemia. Isso evitaria aglomerações em transporte público e congestionamentos. Estimular o uso noturno da cidade pode ser interessante mas demandará mais esforços do poder público para prover os serviços necessários, como segurança, iluminação e transporte.
Outra iniciativa a ser implementada é o estímulo à consolidação de novas centralidades, espalhadas pela cidade, em que haja oferta de residência, comércio, serviços e emprego. Tudo bem próximo, a uma caminhada de casa. Isso pode evitar que os cariocas se exponham e precisem cruzar a cidade em transporte público abarrotado. Talvez o estímulo à mobilidade ativa, principalmente ao deslocamento a pé, faça surgir a oportunidade de se rever o desenho urbano de centros de bairro do Rio à luz da ideia de que a cidade deve ser pensada, prioritariamente, para as pessoas, não para veículos.
Será importante rever a legislação urbanística de forma bem planejada para, por exemplo, flexibilizar a transformação de uso dos imóveis, de comercial para residencial. A oportunidade ideal de planejamento da cidade está na revisão do novo Plano Diretor, que está sendo discutido neste momento. É desejável prever o uso de ferramentas do Estatuto da Cidade com o objetivo de ocupar de maneira responsável e melhor as áreas não utilizadas da cidade já construída, bem como estimular o investimento em habitação de interesse social.
Iniciativas afoitas de revisão de legislação urbanística podem levar a consequências ruins e definitivas. É hora de observação e planejamento. É preciso estudar melhor as soluções que estão tendo bons resultados em outras cidades, como é o caso das operações urbanas consorciadas em São Paulo, que utilizam os certificados de potencial adicional de construção, os Cepacs. Trata-se de uma ótima alternativa para capitalizar os fundos municipais e permitir o investimento na solução de nossos problemas urbanos crônicos, como, por exemplo, o controle da favelização. Não é porque a operação no Porto do Rio não teve sucesso que não se deva usar essa ferramenta em operações melhor estruturadas em outras partes da cidade.
É fundamental traçar os cenários futuros. O momento exige cautela. Se tomarmos as decisões corretas o Rio terá a oportunidade de sair na frente e construir uma realidade melhor do que a que vivíamos antes do início da pandemia. Não podemos errar!
*Alexandre Arraes é médico e gestor público