Por thiago.antunes

Rio - O pessoal reclama de corrupção porque não entende como ela faz bem para o país. Trata-se de uma legítima parceria público-privada, em que empresas remuneram políticos pelas tarefas que eles desempenham a seu favor, autorizando obras e projetos mil, gerando empregos e renda para todos.

Patriotas e abnegados, políticos trabalham muito e, por isso, deveriam até receber hora extra. Mas, se a União tivesse que pagar tudo o que merecem, seria um grande prejuízo para os cofres públicos. É aí que entra essa compensação não oficial — que os ignorantes confundem com corrupção.

Parece estranho, mas foi isso que aprendi em ‘Diário da cadeia’, de Eduardo Cunha (Pseudônimo). Trata-se de proeminente deputado evangélico, temente a Deus, pai e marido exemplar, empresário de sucesso, rico, ex-presidente do Congresso, articulador da derrubada da presidente Dilma, preso por determinação do juiz Moro. Um cidadão irrequieto, paranoico, que se sente perseguido pela imprensa e pelos inimigos políticos, que invejam sua grandeza. Um injustiçado.

Com tempo de sobra para escrever, Eduardo Cunha (pseudônimo) prepara um livro sobre o impeachment e, em paralelo, registra suas memórias do cárcere entre o seu início, em outubro, e o fim do ano, quando o diário é suspenso de forma surpreendente.

Surpreendente, também, é ele contar por que seu amigo PC Farias foi assassinado. Tanto que é a partir daí que ele comenta notícias e abre suas opiniões a respeito de Temer, Dilma, Lula, Geddel, Collor, Janaína Paschoal, Palocci, Zé Dirceu, o diabo a quatro...

Não é à toa que, na vida real, a Justiça está querendo proibir a venda do livro, num claro sinal de que vivemos num país bastante míope. Afinal, em tempos de pós-verdade, o que importa se personagens da ficção são pessoas de verdade, em carne e osso e sem alma? E daí se o narrador não perdoa ninguém da vida política dos últimos 30 anos? E por que haveria, considerando que são (quase) todos especialistas da pós-mentira Qualquer semelhança não é mera coincidência.

No fim das contas, ‘Diário da cadeia’ é uma obra delirante, sátira da melhor qualidade, que ora lembra o Verissimo dos bons tempos, ora lembra os ótimos diários da Dilma na ‘Piauí’. Eduardo Cunha, o verdadeiro, não teria habilidade para construir um livro tão bem sacado, cínico, inteligente, bem-humorado. Li, gostei, ri muito, recomendo. Ah, sim: você sabe quem é o autor? Conte aí.

Você pode gostar