Por karilayn.areias

Rio - Ao comecinho dos anos 1960, minha geração de estudantes na mitológica Faculdade Nacional de Direito crispava-se na escolha das duas ideologia em que o mundo se dividia. Éramos de esquerda ou de direita, a favor do socialismo (União Soviética) ou contra (Estados Unidos), pró estatismo ou pela iniciativa privada.

Nós, os jovens, nos movíamos pelo radicalismo da época. Em que sonhar era imperativo. Quando salvar o mundo era necessário. Onde a placidez de pensamento se antepunha ao idealismo em brasa da revolução.

Hoje, passadas tantas décadas, a ideologia acabou, e só restaram os escombros entristecidos de interrogações. Que ainda hoje indagam se vale mesmo a pena o Estado tomar conta dos cidadãos, ou se a livre iniciativa tornaria mais leve a vida de todos. Em tempos de normalidade, o meio-termo seria recomendável, cabendo ao Estado tarefas básicas de Educação, Saúde, transporte e Segurança.

Mas vivemos nestes dias outra realidade, em que o despudor dos administradores públicos, e dos políticos no geral, jogaram o país na falência, na ruína e na quase abominação da cidadania.

Na cultura, a área em que me detenho, a situação se torna muito mais agônica e urgente. Não de hoje, sempre foi a última a ser aquinhoada pelo Orçamento da República, com dotações abaixo de qualquer decência. Agora, contudo, os entraves e o abandono se ampliaram, e prostraram em exaustão os agentes culturais e até os equipamentos públicos.

Os choramingos acima qualificam a indignação de todos os que pugnamos pela cultura, que se entende como a soma de bens de essência, ou seja, o reconhecimento de nós mesmos e a consciência da grandeza de um povo.

Há pouquíssimos dias, assisti a três provocações de resistência cultural. O primeiro foi o Prêmio anual à dignificação da MPB, em festa (sem patrocínio) no Theatro Municipal. Ali foram aclamados os melhores em cada segmento da diversidade do canto popular.

O segundo foi a montagem da peça teatral ‘Dalva e Herivelto’ (sem patrocínio) no Teatro NET, de Copacabana. Uma estratégia muito bem encontrada para se realçarem os cem anos de Dalva de Oliveira, considerada por Villa-Lobos e Tom Jobim a maior cantora do Brasil. E o terceiro, a festa da Literatura com a entrega do Premio Machado de Assis (sem patrocínio), na Academia Brasileira de Letras, celebrando também 120 anos. Uma ABL sem pedir esmolas a quaisquer governos, bastando-se a si mesma pela administração eficaz de seus acadêmicos.

Três eventos que testemunham a força individual de promotores com coragem, da iniciativa privada, da fé no fazer.

Ou seja, uma prova da necessidade de crer nos esforços dos indivíduos, libertos (embora com sacrifícios) do jugo de um Estado paquidérmico.

Pesadão sempre. E agora também falido.


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