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Por Roberto Muylaert Editor e jornalista

Depois da Copa da Rússia é um alento voltar a falar de Pelé, indo além dos gols que a gente cansa de ver da Copa de 1970.

Antes de Pelé, o Brasil era um país futebolístico mais ou menos como está hoje, com o complexo de vira-latas voltando, e a partir dele, uma porção de subcomplexos, do tipo "eles são grandões", "têm mais cultura geral", "os técnicos são bons estrategistas, mudam o time e a tática quando necessário, enquanto nós ficamos esperando o que vai acontecer, sem alterações".

Em matéria de pontapés, Pelé nunca se queixou de ninguém, apenas marcava o jogador, para devolver a agressão, discretamente.

É bom lembrar o que Pelé fez, para ver que ele foi o jogador que abriu caminho para o Brasil entrar no time dos grandes.

Pelé jogou no momento certo, quando era possível manter no Brasil, durante toda a sua carreira, alguém com aquela categoria. Época em que todo mundo voltava para o Brasil após a Copa. Agora, o pessoal vai descendo aos poucos: Madrid, Barcelona, Frankfurt, Paris

Se fosse hoje, ele teria ido para o exterior aos 17 anos, onde aos poucos poderia perder aquela leveza dos jogadores do Santos, que ganharam tudo que passou pela frente, até jogo contra o Boca Juniors na Bombonera.

Por falar em zagueiro alto, vale a pena transcrever o depoimento de dois jogadores da Itália, derrotada pelo Brasil por 4 a 1, em 1970: Fachetti, zagueiro, descreveu assim o primeiro gol, de Pelé: "Subimos juntos para cabecear, eu e Pelé. A lei da gravidade obrigou-me a descer ao solo. Perplexo, olhei para o alto. Ele permanecia, tal qual helicóptero, tentando a cabeçada. Conseguiu".

Albertosi, goleiro, viu assim o quarto gol do Brasil contra sua meta: "Fixei meu olhar em Pelé. A bola estava em seus pés. Ele não virou a cabeça. Não olhou para trás. Ninguém gritou pedindo a bola. Jogou um pouco atrás. Adivinhou que Carlos Alberto estava chegando. Só os duendes podem explicar o que houve".

A batida imagem do rei na Copa de 1970 mostra-o majestático, com a serenidade dos que sabem que sabem, condescendente com os súditos, a quem dá passes com frieza de geômetra.

Mas quem assistiu aos filmes do Santos jogando na França, logo após a Copa de 58, viu o que nunca mais se repetiria: as tabelinhas-relâmpago de Pelé com Coutinho, que às vezes a gente aplaudia como rei, até dar com o número nove às costas, na virada da comemoração do gol.

Com Pelé na seleção não havia mau tempo.

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