Luís Pimentel, colunista do DIA - Divulgação
Luís Pimentel, colunista do DIADivulgação
Por Luís Pimentel Jornalista e escritor

Rio - "A literatura me levou ao Colégio Militar. E foi esse colégio que me levou à literatura", disse uma vez numa entrevista, o peruano Mario Vargas Llosa.

O grande escritor contava que o pai, assustado com os seus interesses lúdicos e pouco viris, temia que o filho, dado às artes e à poesia, se tornasse gay. Resolveu interná-lo em ambiente onde prevaleciam o excesso de disciplina e a ausência absoluta de liberdade. Para combatê-los, o hoje Prêmio Nobel escrevia sem parar. O tiro de canhão saiu pela culatra (ou "culetra", com o pedido de perdão pelo trocadilho infame).

Lembra-me um pouco a história (ou anedota) do Serginho, que quando menino vivia desenhando e costurando lindos vestidinhos de boneca. Os pais não permitiam, porque "desenhar e costurar vestidos era coisa de gay". Na adolescência, Serginho queria ser bailarino. "Nem pensar! Isso é coisa de gay". O mesmo disseram mais tarde, quando ele falou que queria fazer um curso para ser cabeleireiro. Resultado, hoje Serginho tem mais de trinta anos, é gay, e não tem uma profissão sequer (embora tenha tido tantas aptidões abortadas) para se sustentar na vida.

A razão é simples: nada é só isto ou só aquilo, porque como descobriu o inquieto 'Menino maluquinho', do inquieto e brilhante Ziraldo, "todo lado tem dois lados". Livro infantil que publiquei há algum tempo, chamado 'História de dois lados', tem um verso que diz: "Esta história tem dois lados: um que aponta prum lado, outro que aponta pro outro/O lado direito é destro, o lado esquerdo é canhoto".

Falando para crianças numa escola que o adotou, ouvi essa pergunta: "Mas o lado esquerdo também pode ser destro e o direito o canhoto. Não?".

Fiquei olhando para o menininho, que olhava para mim com a maior cara de sacana, com aquela expressão de "agora te peguei" que eles sabem fazer tão bem, e respondi o que me veio à cabeça na hora.

"Acho que sim, cara. Depende do ângulo de quem está olhando."

Daí, formulei mais uma tese, dessas que a gente formula sem saber exatamente para que serve. A de que tudo no mundo depende do olhar, ou da intenção de quem está olhando (sejam os pais do Vargas Llosa, do Serginho ou do leitor do Maluquinho). E me lembrei do bom e velho João Guimarães Rosa, que mineiramente escreve em em seu "Grande sertão":

"Pão ou pães, é questão de opiniães..."

Pois e não é?

Luís Pimentel é jornalista e escritor

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