Luís Pimentel, colunista do DIA - Divulgação
Luís Pimentel, colunista do DIADivulgação
Por Luís Pimentel Jornalista e escritor

Rio - Como diziam as mães antigamente, quando o filho estava prestes a se meter em encrenca, "não brinque com o fogo" ("cuidado com o dedo na tomada, com a ponta do prego, com o caco de vidro" também se usava bastante). Hoje as crianças praticamente não brincam mais como fogo - nem com nada, pois brincar saiu de moda; agora levam a vida a sério, olhos e dedos paralisados no celular. Mas ainda podemos recomendar aos adultos: não brinquem com o fogo, pois o prejuízo pode ser irremediável.

Esse alerta, muito oportuno para quem sabe que pingo é letra e que fogo queima, foi feito pelo professor João Cezar de Castro Rocha, em artigo recente na revista Veja: "Em 1933, Adolf Hitler foi eleito para o Parlamento alemão. Isso mesmo: eleito. No momento em que foi levado a sério, já era tarde demais. Uma vez no poder, Hitler levou adiante seu programa político, que consistia em abolir toda atividade política! Ou seja, seus opositores foram sumariamente eliminados ou totalmente excluídos da vida pública. É sempre o que acontece quando um fascista é eleito, paradoxalmente graças à vigência da democracia".

A propósito, o título do artigo é "A ameaça do coração fascista".

A ameaça, queiramos ou não, é real. Refiro-me, sem meias palavras, às eleições presidenciais. Editoriais na imprensa do mundo inteiro se perguntaram, ao longo da última semana, como um candidato a mandatário supremo de uma Nação, com mentalidade tão rasteira e autoritária - defensor de preconceitos, de comportamentos neonazistas e até de fuzilamento de adversários, que não tem pudor de aparecer em vídeos de campanha ofendendo gêneros, espécies ou preferências sexuais alheias - pode chegar tão longe em uma campanha eleitoral.

A preocupação do mundo com as nossas eleições justifica-se quando vemos que o candidato mais bem votado no primeiro turno chamou de escórias os haitianos, senegaleses, bolivianos, sírios e os venezuelanos desesperados que pela fome foram empurrados para cá. Para ele, quilombolas são inúteis, índios são párias, negros são preguiçosos, sem-terra são vagabundos.

Escrevo que não se brinque com o fogo porque não estamos nos preparando para escolher o síndico do prédio ou o dirigente do clube, e sim o presidente da República. O eleito vai governar por quatro ou oito anos. Não vivemos num mar de rosas, mas sobre terreno bastante minado, convivendo diariamente com uma violência sem precedentes, uma onda de ódio avassaladora, hospitais e escolas públicos em petição de miséria, temos entre nós quase 30 milhões de desempregados.

Tudo aqui é pra ontem, e essas questões jamais serão resolvidas com prepotência, arrogância ou bravatas. Olho vivo no ninho, com o que estamos prestes a chocar. Todo ovo parece inofensivo, inclusive o da serpente.

Luís Pimentel é jornalista e escritor

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