Arte: O Dia
Por Damaris Giuliana Gestora de Comunicação de MSF em Moçambique
Publicado 07/12/2018 03:00

Rio - Quando Maria*, 39, mãe de quatro filhos, chegou ao hospital central da Beira, no centro de Moçambique, pesava 33 kg. Tinha pernas e pés inchados e não conseguia andar nem comer. Sua cabeça explodia de dor.

A bateria de exames que a equipe de Médicos Sem Fronteiras (MSF) fez na sua chegada confirmou que Maria, que vive com HIV há sete anos, tinha tuberculose e meningite criptocócica, doença infecciosa rara em pessoas saudáveis. Sem tratamento imediato, a inflamação das membranas que cercam o cérebro e a medula espinhal pode rapidamente levar à morte.

Por dificuldades pessoais, Maria tomava antirretrovirais uma ou duas vezes por semana em vez da dose diária necessária. Muitas pessoas que precisam tomar comprimidos para o resto da vida encontram desafios para se manter em tratamento.

Sem a medicação adequada, o vírus HIV se multiplica e ataca as células CD4 do sistema de defesa do organismo. Em condições normais, uma mulher da idade de Maria tem de ter mais de 500 CD4. Quando ela chegou ao hospital, seu CD4 estava em 53.

Há 36,9 milhões de pessoas com HIV no mundo e apenas 21,7 milhões em tratamento. A Organização Mundial da Saúde estima que até a metade dos diagnosticados com HIV que iniciaram tratamento já estejam com o sistema imunológico enfraquecido, com CD4 abaixo de 200, ou seja, com Aids. A grande maioria mora em países de baixa e média renda, muitos em zonas rurais sem acesso à Saúde. Apesar de melhorias revolucionárias na testagem e manejo do HIV nos últimos 30 anos, taxas de mortalidade por Aids seguem altas, com 940 mil mortes em 2017.

Em Moçambique, onde quase metade da população vive abaixo da linha da pobreza, cerca de 1,8 milhão de pessoas vivem com HIV. Em 2017, quase oito pessoas morreram de Aids por hora. Presente em Moçambique desde 1984, MSF passou a apoiar o ministério da Saúde na área do HIV em 2001, com oferta de diagnóstico e cuidados paliativos; pouco tempo depois, também com tratamento para HIV.

Desde março deste ano, MSF tem apoiado o ministério da Saúde na implementação de um modelo de cuidados para Aids na emergência de um hospital público da capital, Maputo. A abordagem é similar à do tratamento de trauma, agindo rapidamente sobre o doente com imunidade muito baixa. Além de prestar atendimento, MSF doou equipamentos laboratoriais e treinou profissionais de Saúde para oferecer diagnóstico imediato para infecções oportunistas, como as contraídas por Maria.

Em julho de 2018, MSF expandiu a abordagem para Beira, implementando esses cuidado na emergência no hospital central, exatamente quando Maria deu entrada. Essa capacidade de oferecer testes rápidos e iniciar tratamento imediatamente já reduziu o índice de mortalidade por Aids nesta unidade para quase a metade.

Após um mês internada, Maria teve alta e passou a ser acompanhada em outra unidade do governo apoiada por MSF. Ganhou 13 kg em três meses. Lá, infelizmente, foi diagnosticada com câncer de colo de útero e levada de volta ao hospital central para cirurgia. Apesar do problema, seguramente terá condições melhores de enfrentar a doença do que em seu estado anterior.

Neste mês, o Dezembro Vermelho, quando se intensificam as ações de conscientização em relação à Aids, é importante lembrar que prevenir mortes significa manter as pessoas em tratamento regular, num ambiente empático e solidário. Isso inclui apoio ao tratamento com conselheiros que possam detectar quando os pacientes estão com problemas para mantê-lo, além de acompanhamento sistemático. É o que fazemos em 27 países da África, Ásia e Leste Europeu, com atendimento gratuito de qualidade para quase 216 mil pessoas.

*Nome fictício, para preservação da intimidade da paciente

Damaris Giuliana é gestora de Comunicação de MSF em Moçambique

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