Arte: O Dia
Por João Batista Damasceno Doutor em Ciência Política e juiz de Direito
Publicado 08/12/2018 03:00

Rio - O ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin, durante julgamento de habeas corpus em favor do ex-presidente Lula, no último dia 4, afirmou que "não deixo de anotar que houve procedimentos heterodoxos, mesmo que para finalidade legítima". O problema exposto pelo ministro nos faz perguntar se os fins justificam os meios.

Paulo Mercadante, pensador social brasileiro, indagou sobre o agir entre os compromissos com a civilidade e a ética da finalidade. Sem se referir a tortura, assassinatos ou desaparecimentos escreveu obra intitulada 'Militares e Civis: a Ética e o Compromisso'. Nela descreveu duas categorias de militares durante a ditadura que durou 21 anos no Brasil. Uma categoria era a dos herdeiros do Movimento Tenentista que tinham compromisso com as instituições, seus modos de funcionamento, e que conceberiam serem decorrentes de relações sociais. Portanto, sabiam não poder fazer as coisas exclusivamente do jeito que quisessem. E outra categoria, composta pelos militares da linha dura, capazes de qualquer comportamento, ainda que heterodoxo, para atingir finalidades previamente estabelecidas. Era o grupo da ética da finalidade.

Nesse contexto, é possível dizer que os militares que transformaram quartéis em centros de tortura e promoveram mortes e desaparecimentos tiveram uma conduta heterodoxa visando às finalidades das suas atuações, sem considerações aos compromissos com a civilidade ou o Direito.

Em seminário promovido pela Fundação Internacional para a Liberdade, presidida pelo conservador escritor peruano Mario Vargas Llosa, em Madri, o ex-juiz Sergio Moro disse que "durante estes quatro anos [de atuação na Lava Jato], me perguntei se não tinha ido longe demais na aplicação da lei, se o sistema político não iria revidar".

Nenhum juiz quando atua no âmbito da legalidade se questiona se foi longe demais. Esses autoquestionamentos somente são possíveis quando se atua à sua margem e, normalmente, quando já se afastou muito das margens da lei. Em data recente, o ministro Dias Toffoli afirmou que "é hora de o Judiciário se recolher. É preciso que a política volte a liderar o desenvolvimento do país e as perspectivas de ação", explicitando o fenômeno da politização da Justiça.

Num Estado de Direito todos estão subordinados à Lei, inclusive o próprio Estado que a edita. Os agentes públicos, mais que os particulares, pois o particular pode tudo o que a lei não proíbe, mas o agente público somente pode o que a lei manda.

Sem cumprimento do ordenamento jurídico, os agentes públicos perdem a superioridade ética que lhes é conferida para executar as leis. Mas, de todos, aqueles que mais devem velar pelo cumprimento da lei são os juízes. Afinal, estão encarregados da sua aplicação e, ao Supremo Tribunal Federal é atribuída a função precípua de guarda da Constituição, sem heterodoxia.

João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política e Juiz de Direito

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