Ainda que episódios de migração forçada tenham sido constantes na história, foi apenas em meados do Século XX que as primeiras legislações sobre refúgio foram criadas. Ao fim da Segunda Guerra Mundial, mais de 11 milhões de pessoas se viram deslocadas de seus países de origem. Como forma de responder à crise que se instalava, 155 países assinaram em 1951 a Convenção de Genebra, que definia como refugiado qualquer pessoa com fundado temor de perseguição, por razões de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política, no seu país de origem. Na prática, signatários ficavam proibidos de rechaçar ou expulsar um refugiado de seu território. Desde essa data, diversos outros instrumentos jurídicos foram formulados, em âmbito regional e internacional, para expandir a definição do que se entende por refúgio.
Conceitos jurídicos, porém, dificilmente são capazes de dar conta da complexidade dos fenômenos migratórios recentes. Atualmente, pessoas que são forçadas a sair de seus países por motivos de desastres ambientais ou mudanças climáticas, por exemplo, não recebem status de refugiado. Tampouco são refugiados os que não cruzam fronteiras nacionais, os chamados deslocados internos. Pessoas evacuadas de seus locais de origem em decorrência de obras de desenvolvimento estatais, como barragens e atividades de mineração também dificilmente receberiam proteção. O status de refugiado também é negado a muitos indivíduos de Estados que não podem mais garantir a segurança pública ou serviços básicos a seus cidadãos. Todos esses, que não se encaixam no conceito clássico, são frequentemente taxados de falsos solicitantes de refúgio, categoria cada vez mais utilizada para deslocar milhares de pessoas para a ilegalidade.
No Brasil, vivem mais de 10.000 refugiados reconhecidos, fora os que estão em processo de reconhecimento. Em 2017, as nacionalidades que mais pediram proteção no país foram venezuelanos, cubanos e haitianos. O Brasil, ainda que tenha historicamente recebido menos migrantes do que seus vizinhos sul-americanos, vem se tornando moradia de um número sem precedentes de venezuelanos. Esses, mesmo que nem sempre categorizados como refugiados, claramente não têm escolha de ficar em um Estado que mal pode lhes prover alimentação adequada, e por isso têm recebido o direito à residência e trabalho em nosso país.
O desafio que se impõe, tanto no Brasil quanto em âmbito global, é o de assegurar que migrantes, solicitantes de refúgio, e refugiados não sejam vítimas de políticas de imobilidade. Enquanto esperam que Estados Nacionais decidam sua sorte, muitos se veem separados de suas famílias, com dificuldades de ter seus diplomas e profissões reconhecidos e vivendo em ambientes fechados ou precários, segregados daqueles considerados cidadãos. Estão, por assim dizer, congelados no tempo e no espaço.
Médicos Sem Fronteiras atua nesses contextos, e nossas atividades vão além de oferecer tratamento médico e psicológico às pessoas em movimento. O objetivo do trabalho é também resgatar a dignidade de imigrantes e refugiados, permitindo que se reconheçam e possam se auto cuidar nesses novos territórios.