Fórum Grita Baixada - Divulgação
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Por O Dia
Rio - Você conhece alguém que desapareceu, que nunca mais foi visto? De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSG), entre 2007 e 2016 foram registrados 693.076 boletins de ocorrência por desaparecimentos. Esse número corresponde a 190 pessoas por dia ou 8 desaparecimentos por hora.

Existem muitas causas para os desaparecimentos: transtornos psíquicos, conflitos familiares, dentre outros... no entanto, boa parte dos casos também podem estar relacionados a atos criminosos. Desta forma, na origem dos desaparecimentos forçados estão também os homicídios associados a atuação ou omissão do Estado, vinculados a mortes decorrentes da atuação policial, sequestro, tráfico de pessoas e de órgãos, numa tentativa de dificultar a investigação material de um ou mais assassinatos.

A prática do desaparecimento forçado foi amplamente utilizada pelo Estado brasileiro durante a ditadura militar, mas essa forma de atuação criminosa está longe de ser coisa do passado. Dada a gravidade do assunto, o Fórum Grita Baixada (www.forumgritabaixada.org.br) em seu Boletim do Projeto Direito à Memória e Justiça Racial, abordou o tema dos desaparecimentos forçados. De acordo com o Boletim, apenas nos 5 primeiros meses deste ano 531 pessoas desapareceram na Baixada Fluminense, um aumento de 6,2% em relação ao mesmo período de 2018.

Os dados oficiais, ainda que alarmantes, não representam a totalidade da realidade brutal da Baixada Fluminense. Isso porque, não consideram o recorrente problema da subnotificação nos casos de homicídios e desaparecimentos. Fato é que aproximadamente 60% do total dos casos de pessoas desaparecidas no estado ocorrem na Baixada Fluminense. Outro agravante é que a metodologia dos dados oficiais não especifica os casos de desaparecimentos forçados, dificultando ainda mais a possibilidade de quantificar o real número de pessoas vítimas da violência urbana.

Apesar de nosso país ter assinado em 1994 a Convenção Interamericana de Desaparecimentos Forçados de Pessoas (CIDFP), a prática hedionda persiste no Brasil, especialmente contra os mais pobres e negros. Falta um marco legal no Brasil. Projetos de leis sobre desaparecimentos forçados já estiveram em discussão no Congresso Federal, mas nunca o Estado demonstrou vontade política para votá-los e aprová-los; qual seria o motivo? Lembramos que para efeito da CIDFP, em seu artigo II, o desaparecimento forçado é “a privação de liberdade de uma pessoa ou mais pessoas, (...) praticada por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas que atuem com autorização, apoio ou consentimento do Estado, seguida de falta de informação ou da recusa a reconhecer a privação de liberdade ou a informar sobre o paradeiro da pessoa, impedindo assim o exercício dos recursos legais e das garantias processuais pertinentes.

O Brasil, como signatário da Convenção está comprometido a não praticar, nem permitir, nem tolerar o desaparecimento forçado de pessoas; responsabilizando os autores desses crimes a partir do seu sistema de justiça. Fica então a pergunta: o que o Estado brasileiro está fazendo efetivamente para reduzir os desaparecimentos forçados? A pergunta gera incômodo ao constatarmos o envolvimento do próprio Estado, por ação ou omissão. Diante do problema, realizar estudos e pesquisas sobre o tema é garantir na democracia brasileira a construção de uma memória coletiva que sirva para a luta por reivindicação de mudanças estruturais históricas. A criação de uma categoria específica para os desaparecimentos forçados, conforme apresentado pelo Fórum em audiência pública realizada em 26 de abril na ALERJ já seria um primeiro passo importante, pois permitiria um diagnóstico e serviria como instrumento para a elaboração de políticas públicas específicas.
Adriano de Araujo, Fransérgio Goulart e Lorene Maia são da Equipe Fórum Grita Baixada