Eugênio Cunha - Divulgação
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Por O Dia
Rio - Fico imaginando o que passaria em nossa mente se não houvesse frequentemente um smartphone em nossas mãos. Como seria nossos pensamentos sem o direcionamento tecnológico. Seríamos pessoas menos distraídas? Mais imaginativas? Einstein dizia que imaginar é melhor que conhecer. A tecnologia digital dos aparelhos móveis, apesar de suscitar cada vez mais nossa avidez por informações, parece estimular cada vez menos nossa imaginação.

De fato, ficamos sem tempo para esse “ócio criativo”. No sentido oposto, nos momentos mais fugazes buscamos saber se há alguma nova mensagem ou novidade no celular. Dos pequenos aos grandes espaços de tempo em que não suportamos mais uma espera. O mais das vezes, no elevador, no ponto do ônibus, aguardando um médico ou um recepcionista, temos nossos sentidos canalizados para o touchscreen.

Informação demais, reflexão de menos. Vícios em estímulos sensoriais, hiperatividade mental. Surge um embate em nossa estrutura cognitiva, formada milenarmente para a leitura no papel. Não existe em nós base genética para uma definição da forma como iremos adquirir o letramento. Os fatores da organização da leitura são formados culturalmente, por estímulos ambientais. Paulo Freire já dizia que a leitura do mundo precede a leitura da palavra.

Diferentemente de outras habilidades, como andar e falar, para ler e escrever não há uma programação automática do cérebro. Desde bem cedo, no contato social, crianças adquirem essas competências mediante a oralidade. Dessa forma, o cérebro vai descortinando o processo da leitura e da escrita. Trata-se de uma construção complexa e nada fácil, pois nem sempre a associação do fonema com o grafema ocorre de forma espontânea e natural.

Mas o que poderá advir a partir de agora quando o cérebro aprende cada vez mais em contato com os meios digitais? Hoje, parece haver um conflito no campo linguístico. Muda-se a mídia, muda-se a forma de aquisição do letramento. Cada mídia favorece processos cognitivos próprios. Sabemos disso quando constatamos que não é a mesma coisa ler um livro de papel e um e-book. Então, que tipo de leitores surgirão nas escolas a partir desse novo paradigma? Experimentarão estágios de leitura mais reflexivos e profundos? Terão capacidade de pensar ou imaginar por conta própria?

Podemos tentar imaginar as respostas. 
Eugênio Cunha é professor e jornalista