Tuninho Villas - Divulgação
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Por Tuninho Villas*
O Sindicato Nacional dos Compositores Musicais vem a público questionar mais uma arbitrariedade envolvendo os direitos autorais. Depois do caso envolvendo quartos de hotéis e cabines de embarcações, temos agora uma medida provisória isentando paródias de obras musicais em jingles de campanhas políticas.

Sabemos que um bom jingle é importantíssimo numa campanha política, consegue realizar a difícil missão de compactar, em 30 segundos, o espírito e a estratégia de uma campanha com concisão e criatividade. Sabemos também que, segundo o dicionário, consiste em “curta mensagem musical de propaganda”. Sem dúvida, o jinglista, autor tem abrigo na Lei de Direito Autoral já que o jingle é obra intelectual protegida. A vigente Lei de Direito Autoral, Lei 9.610/98, em seu art. 47, dispõe o seguinte: “Art. 47. São livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito”.

Para o Direito Autoral, paródia traduz a ideia de humor, sátira. É permitida, conforme dispõe o mencionado art. 47. Ela satiriza pessoas ou fatos, como em programas humorísticos, por exemplo, que utilizam bastante esse recurso da imitação burlesca, com fim satírico ou jocoso, que provoca o riso. A deformação existente na paródia, em regra, não consiste em violação ao direito moral à integridade, inclusive a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que em seu artigo 27 diz que “todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica, literária ou artística da qual seja autor”. Em suma, a paródia consiste num limite ao exercício da prerrogativa extra patrimonial de respeito à obra. O parodista não precisa, pois, pedir prévia e expressa autorização do autor da obra parodiada.

O que alguns fazem nas campanhas políticas é violação à Lei de Direito Autoral, e não paródia, tomando para si a melodia de uma canção de grande sucesso e colocando sobre ela outra letra, contendo propaganda do seu nome, slogan de campanha etc. A finalidade, nesse caso, não é humorística, mas publicitária, ou seja, propaganda eleitoral. Não se encaixa, portanto, no permissivo legal disposto no art. 47 da Lei Autoral. A possibilidade do uso de paródia não pode ser interpretada de maneira desmedida, muito menos em dizer que seja de domínio público.

Campanhas políticas costumam gastar verdadeiras fortunas com plotagem de veículos, faixas, banners, cartazes, santinhos, bandeiras, adesivos, balões... Por que não pagar também pela música? Por que querer economizar justamente na parte do compositor, que é um trabalhador intelectual? Até quando teremos que suportar esse sucateamento da cultura e da educação em nosso país?

Um candidato que não respeita o Direito Autoral deve ser taxado como ficha suja para a cultura. Não merece voto algum. Será que todos nossos parlamentares respeitam a dignidade do trabalho do compositor? Não. Tanto que existem prefeitos que não querem saber de pagar direitos autorais decorrentes de execução pública. Tanto que existem políticos donos de emissoras de rádio que não anunciam os nomes dos compositores, infringindo frontalmente os arts. 24, II, e 108 da Lei Autoral. Emissora de rádio e TV que não diz nome de compositor deveria sofrer multa. As emissoras teriam que cumprir as finalidades informativas, educativas, artísticas e culturais, consagradas expressamente na Constituição Federal (art. 221, I).

Quero dizer, por fim, que o ponto nevrálgico da questão autoral é a moralização do processo de renovação de concessões de rádio e televisão. Como se sabe, o prazo de concessão para as emissoras de rádio é de 10 anos, e de 15 anos para as emissoras de televisão. Deve ser levado em conta as questões dos pagamentos de direito autorais para que haja uma renovação, ou seja, a quitação dos autores.

Será que os inúmeros políticos (deputados federais e senadores) concessionários de rádio e TV são favoráveis ao disposto no art. 113-A do texto em consulta pública do MinC, referente à reforma da Lei Autoral? Eis a redação: “Art. 113-A. Caberá ao Poder Executivo dispor, em regulamento, sobre a manifestação do Ministério da Cultura, no processo de renovação de concessões públicas outorgadas a organismos de radiodifusão, acerca da adimplência desses organismos no que tange aos direitos autorais”.

Após o projeto Ficha Limpa, começaríamos o Emissora Limpa. Havendo condenação transitada em julgado relacionada a dívidas de direitos autorais, a emissora não conseguiria a renovação da concessão. Mas será que os parlamentares legislarão contra si próprios?

Cabe a nós, compositores, unirmo-nos para exigir nossos direitos.

*Tuninho Villas é presidente do Sindicato Nacional dos Compositores Musicais (SNCM)