Aurélio Wander Bastos
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Aurélio Wander Bastos Divulgação
Por Aurélio Wander Bastos*
A Constituição de 1988 passou por três profundas reformas. Uma delas, destinada a desestatizar a economia, privatizou empresas, inclusive a Vale do Rio Doce. Como ocorreu no Governo de Fernando Henrique Cardoso. Mais para a frente, no governo Lula, foram aprovadas e promulgadas emendas e projetos voltados para as reformas sociais. Distribuição de renda. Política sindical. Previdência.

Logo em seguida, no governo de Dilma Rousseff, entraram em cena mais de setenta revisões parlamentares para políticas de inclusão social, com efeitos, inclusive, na revogação de dispositivos na Lei de Licitações.
Tradicionalmente, essas verbas tinham destino social específico. Mas, com a alteração do dispositivo sobre licitações assistenciais, destinadas a projetos ambientais, indígenas, minorias, educação básica, etc, elas passaram a ser encaminhadas, não apenas no seu valor restrito, mas, de modo acumulado, em visível reversão de sua origem e natureza.

Essa reversão na Lei de Licitações levou e tem levado o Legislativo e o Executivo à distribuição, quase sempre aleatória, de verbas orçamentárias destinadas, em tese, a programas sociais que remanescem sem qualquer planejamento ou investigação executiva. E, sem critério contábil.

Nesse mesmo quadro reformista, sem um projeto ideológico definido, mas reconhecido como política liberal, no governo de Michel Temer, evoluíram as emendas de recolhimento ou retenção de despesas públicas (ou até mesmo de despesas privadas), como aconteceu com a reforma trabalhista e a reforma previdenciária aprovadas após o impeachment de Dilma Rousseff.

O país, nesse sentido, está mergulhado, não apenas em uma geleia geral, mas em um saco sem fundo. Onde as diferentes doutrinas políticas, entre si, se cruzam. 

O governo Bolsonaro, mesmo com uma ideologia definida, não tem quadros preparados para executar políticas de direita, quando muito de direita liberal. Esse é o sinal mais provável na evidência das ações de Paulo Guedes. O que não ocorre no Ministério da Educação. O ministro da Educação, Abraham Weintraub, no seu sentido mais extensivo, governa para a maior população de servidores do Brasil. Acostumados a conviver com governantes progressistas.

Assim também ocorre nos ministérios da Cidadania, Meio Ambiente e na Secretaria de Cultura. Onde a direita, dona dos cargos de direção, presume governar nessa tácita aliança, com quadros de esquerda (que já estavam lá, antes), em tácita aliança.

O Brasil, nesse contexto, vive momento em que as ideologias se desencontram. E, se confundem em quadro que pode evoluir para um autoritarismo populista. Em que os autoritários não se revelam (para não perderem o espaço governativo).
Aliás, ao contrário do que se esperava, alguns militares do governo têm uma proposta de expectativa desenvolvimentista. Estamos diante de um cruzamento eleitoral sem limites, com uma multiplicidade de partidos, impedidos de fazer alianças para as eleições municipais. Com políticos ligados ao fundo partidário e a um presidencialismo que somente evolui em coalizão, com o consentimento do Congresso, sem resultados finais. Onde o presidente da República fica à deriva de suas frases soltas e de uma Constituição engajada, sufocada por seus opositores ideológicos, no tempo histórico.

*Aurélio Wander Bastos é advogado, cientista político e professor emérito da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio)