Eliza Morenno - Divulgação
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Por Eliza Morenno*
O acesso à internet tem definido desde a continuidade da aprendizagem escolar até a entrada em shows de grandes artistas. Nós já sabíamos que a internet ocuparia parte considerável de nossa vida, mas nenhum de nós poderia supor que isso aconteceria tão rápido e com tamanha urgência a ponto de mais uma vez aumentar os abismos sociais e até determinar como o entretenimento chega às nossas casas.

As lives se tornaram um ponto de encontro no web-espaço, de @ivetesangalo à @AzaNjeri, das aulas de dança com o professor @deivisondudu aos treinos da @anitta. Os limites geográficos desapareceram e todas as segundas-feiras pessoas do Brasil inteiro se reúnem pelo aplicativo do zoom para discutir iniciativas para livro e leitura nos encontros virtuais da @bancadadolivro. O fato é que quem tem acesso à internet pode ficar horas em contato com outras pessoas usufruindo inclusive de conhecimentos que fora da web seriam cobrados.

Tenho amigos que detestam e chamam de modinha, outros já deixam a cerveja separada para a paquera na live da cantora Teresa Cristina, que já rendeu até uma conta no Instagram denominada cristiners. Eu mesma não passei batida e deixei meu “eu te amo” estampado nos comentários que sobem numa velocidade tão rápida quanto a passagem de uma estrela cadente.

No contexto pós-pandemia a relação que construímos com o web-espaço terá nos transformado de muitas maneiras, mas e fora dele? Me pergunto quantos de nós sabem exatamente onde está a biblioteca pública mais próxima. A quantos quilômetros se encontra o teatro do bairro, se é que tem um. Me pergunto se os grupos teatrais que têm disponibilizado suas peças para preencherem os vazios cotidianos terão nossos corpos preenchendo os vazios da plateia quando suas peças voltarem aos palcos. Me pergunto sinceramente se estamos aprendendo a valorizar os equipamentos físicos próximos a nós, pois é nesses lugares que os profissionais exercem seus ofícios de fato e é nesses lugares que precisaremos exercer nossa real presença.

Nem só de lives viverão os artistas. Eles precisarão do apoio de toda a sociedade quando o foco sair da rede e voltar para a rua. O primeiro show da Teresa Cristina pós-pandemia vai precisar de um grande espaço para acontecer, pois espero que esteja lotado de pessoas interessadas em beijos e abraços, mas sobretudo dispostos a agradecer pelas horas afetivas que a artista dedicou gratuitamente durante a quarentena.

As bibliotecas públicas e comunitárias precisarão dos contadores de histórias que estão mediando leituras diariamente via aplicativos, mas precisarão sobretudo das famílias que desfrutam desses encontros virtuais cobrando políticas públicas que garantam a esses profissionais que sejam remunerados por suas atividades. A atenção que estamos dando aos artistas e que eles estão nos dando durante a pandemia tem nos feito muito bem e poderá fazer muito mais depois da mesma, pois nem só de lives vive uma cidade, nem só de lives viveremos nós.
*Eliza Morenno é atriz, arte-educadora, especialista em literatura infanto-juvenil e fundadora da Poesia Viral Produções