Enoque Rafael - Divulgação
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Por Enoque Rafael*
Um dos trabalhos mais duros de um policial militar não tem relação direta com armas ou confrontos com criminosos. Por trabalharmos tão perto do perigo, sepultamos colegas de trabalho com mais frequência do que gostaríamos. Na condição de Capelão Veterano da Polícia Militar do Rio de Janeiro há mais de 30 anos, participo de perto desses momentos difíceis. Se, por um lado, reconheço a importância de poder dar uma palavra de consolo, por outro é desgastante ter que fazer isto tantas vezes. Apenas entre janeiro e agosto deste ano, segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), dez policiais militares foram mortos em serviço. Um número menor do que o do mesmo período de 2019 (14), mas ainda assim preocupante, especialmente se considerarmos o período de isolamento social em que vivemos.

A tarefa de oferecer algum conforto, ao mesmo tempo gratificante e árdua, me faz refletir sobre o risco constante a que todos os agentes de segurança – e não apenas os policiais militares – estão submetidos em um estado violento como o nosso. É inadmissível que esses profissionais ainda precisem, em alguns casos, ter cuidado com uniformes, identidades funcionais e demais objetos de trabalho, em uma tentativa de esconder o que fazem para que eles e suas famílias não sejam alvos de bandidos. Deveria ser motivo de orgulho e admiração, mas a inversão de valores é tamanha que
virou sinônimo de medo.

Um dos pontos que mais defendo é o apoio que a sociedade deve dar às forças de segurança, pois a defesa da população nada mais é do que a razão de existir da polícia. Esse suporte passa, obviamente, pelo estado, que precisa ter a preocupação de melhorar sempre as condições de trabalho e, por consequência, de proteção dos policiais. Isso sem falar na rede de assistência aos que sobrevivem a um confronto mas ficam com sequelas físicas ou psicológicas. Mas o cidadão também deve fazer a sua parte, colaborando, sempre que possível, para que a polícia faça um bom trabalho, inclusive denunciando agentes que desrespeitam a lei.

Por mais difíceis que sejam as condições, precisamos honrar a farda – e, no meu caso, também a batina – que vestimos e cumprir o nosso papel. Costumo dizer que, enquanto um PM estiver de pé, não vamos deixar de defender a sociedade. A ela cabe torcer e contribuir para que tenhamos uma segurança pública cada vez melhor. Somente assim este Capelão terá um pouco menos de trabalho. Amém.

*Enoque Rafael é Major e Capelão Veterano da Polícia Militar do Rio de Janeiro