Ricardo Bruno - Divulgação
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Por Ricardo Bruno*
Em editorial de 6 de novembro, o jornal O Globo pressiona o governador Claúdio Castro a privatizar a Cedae em qualquer circunstância, até mesmo se a operação contrariar o interesse público. Longe de uma análise sensata de virtudes e falhas do modelo em elaboração pelo BNDEs, o texto é uma peça publicitária dos interesses empresarias envolvidos na desestatização da empresa.

Criticar o governador por ter feito uma ponderação lúcida a respeito das efetivas vantagens do processo é atestado público de insensatez. Mais: é revelação inconteste do comprometimento do jornal com interesses puramente empresariais, apartados do bom senso, distantes das demandas reais da sociedade fluminense.

Cláudio Castro dissera apenas que não entregará a estatal ao setor privado sem convicção de que o modelo seja efetivamente vantajoso à sociedade. A frase é uma ode ao bom senso, ao equilíbrio e à razoabilidade. A crítica não passa de uma deslavada defesa de interesses empresarias certamente escusos presentes no propósito de “entregar” a Cedae a qualquer custo, sob qualquer pretexto, em qualquer circunstância.

Ao defender a privatização açodada da Cedae, O Globo se mostra contra os interesses da sociedade, cumprindo um papel menor, reservado aos ventríloquos dos negócios empresariais nem sempre transparentes.

O editorial esgrime dados irreais na tentativa de convencimento de sua duvidosa posição. Trata como verdade absoluta o hipotético investimento de R$ 32 bilhões. Fala também em universalização dos serviços de água e esgoto em até 20 anos, de modo assertivo e inexorável. São argumentos que fazem lembrar a reforma trabalhista aprovada no governo Temer, que iria gerar alguns milhões de empregos. Ou aprovação do teto de gastos que faria o Brasil crescer em ritmo chinês. Na verdade, são apenas falácias.

O que O Globo não diz é que a privatização da Cedae vai na contramão de um movimento mundial de reestatização dos serviços de équa e esgoto. Em 2010, Paris remunicipalizou a distribuição de água, após a constatação de que serviços eram precários e com tarifas demasiadamente altas. Uma auditoria verificou que os preços praticados eram 30% acima dos valores indicados para o equilíbrio financeiro da operação. As concessões às empresas Suez e Veolia foram suspensas e os serviços transferidos novamente à Eau Paris.

Na última década, 267 cidades em 33 países rescindiram contratos de privatização dos serviço de água, após a constatação da incompatibilidade da inciativa privado em operar um setor tão sensível socialmente, que, de resto, constitui a garantia de fornecimento de um bem essencial à vida. Na maioria dos casos, houve rescisão dos contratos, numa evidência do caráter drástico da medida.

Há que se considerar também o monopólio natural do setor. Não há concorrência na distribuição de água e na coleta de esgoto. Portanto, a privatização não será regulada pelo mercado. A transferência do monopólio estatal ao setor privado é perigosa, razão pela qual não tem funcionado em várias partes do mundo. Para que os riscos sejam controlados é necessário sim que haja uma rigorosa regulação pública a fim de não permitir que a lógica dos lucros escorchantes suprima dos estratos sociais de baixa renda até mesmo o direito à água – um bem essencial.
 
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*Jornalista