Paulo Baía, sociólogo e cientista político da UFRJ - Divulgação
Paulo Baía, sociólogo e cientista político da UFRJDivulgação
Por Paulo Baía*
Ao avaliarmos as três últimas eleições municipais no Brasil, de 2012, 2016 e 2020, vemos um aumento sistemático, contínuo, dos índices de ausências nas eleições. As abstenções são de difícil explicação, as motivações e causalidades são múltiplas.
O voto nulo e o voto em branco são uma indicação de rejeição do eleitor a todas as candidaturas ou ao processo eleitoral, o eleitor comparece ao local de votação, digita sua repugnância e confirma. Em 2020, temos um genérico guarda-chuvas explicativo de que o medo de contágio pela covid-19 é o móvel das ausências. Com certeza o medo da pandemia e da infecção pelo coronavírus foi motivo para várias ausências, não para explicar sua enormidade e seu crescimento nas cidades do Rio de Janeiro, São Paulo, Recife, Porto Alegre.
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As cidades citadas estão em ritmo de "normalidade" em termos de mobilidade urbana e presença de pessoas nas ruas. As atividades socioeconômicas estão ativas, com comércio aberto e o sistema de transporte funcionando, embora o comitê gestor da crise sanitária de minha universidade, UFRJ, recomende o distanciamento e afastamento social, a Fundação Oswaldo Cruz também.
Assim, falar que a covid-19 foi a responsável pelo recorde histórico de abstenções eleitorais não é razoável. Tenho uma hipótese, que me veio à ideia ao lembrar que o falecido jornalista Ricardo Boechat não votava há anos por considerar o voto obrigatório um acinte, como me chamou atenção a jornalista Renata Suter.
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O Cel PM e ex-deputado Emir Campos Larangeira me perguntou se a abstenção não seria um ato de "Desobediência Civil". Constatei nos mapas eleitorais que, nas eleições para presidente da República, governadores e renovação da Câmara dos Deputados e Senado Federal, existe um processo semelhante de aumento das abstenções nas eleições de 2010, 2014 e 2018.
Passei a considerar que a abstenção eleitoral é um "movimento" não planejado e voluntarista de "Desobediência Civil" contra o voto obrigatório no Brasil do século 21. A ideia não é bem recebida no Congresso Nacional e nos meios políticos e militantes de maneira ampla.
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O voto facultativo foi descartado sumariamente do processo constituinte de 1987 e 1988. Em várias democracias modernas e contemporâneas, o voto é uma escolha, votar ou não votar é legítimo e legal, é um ato de cidadania.
O que os amigos e amigas percebem sobre as abstenções crescentes na última década nas eleições brasileiras? É uma "Desobediência Civil"?

*Sociólogo e cientista político