Publicado 12/10/2021 06:00
Piso de caquinho, cobogó, azulejo português, cadeira espaguete na calçada, barriga no balcão, samba de esquina, golzinho de rua, banho de mangueira, santo na marquise de casa, almoço de domingo no quintal... Sobram referências que juntas seriam poucas se eu tivesse que definir o subúrbio carioca. Memórias afetivas numa estrada que historicamente vive uma linha ténue entre alegria e mazelas.
Enxergo na Zona Norte um retrato do Brasil. Um pedaço de terra que tem vastas riquezas próprias e que segue pisando no próprio cadarço e levando a vida catando cavaco. Como subprefeito, nesses últimos dez meses, comprovei o quanto a Zona Norte sofreu nos últimos anos. Foi um tempo de abandono. Por isso que precisamos resgatar o orgulho de ser suburbano, de forma real, simbólica e imaginária.
Na realidade, é preciso reordenar a casa, desde os serviços mais básicos. A Zona Norte precisa de zeladoria que impacta muito na vida do cidadão. É necessário: podar uma raiz de árvore que pode causar um acidente com um idoso; mudar a mão de uma via para minimizar a perda de tempo no trânsito e também garantir que o caminhão da coleta passe no dia acordado para não acumular lixo na porta de casa. É preciso agir na rotina do cotidiano.
De forma simbólica, precisamos valorizar o chão e não deixar morrer o pertencimento. Quando se dá o título de Patrimônio Cultural Carioca a um bar, em Ramos, gerido há décadas por uma mulher, estrangeira, e local onde Pixinguinha tomava uns goles, você vai muito mais além e consegue fazer com que diferentes pessoas se sintam ali representadas e valorizadas no seu lugar de criação. Ao criar uma Zona de Cultura financeiramente fomentada em Madureira, cresce exponencialmente a possibilidade de a arte ser o ganha pão de jovens que levarão os pormenores da essência local para o Brasil e o mundo afora.
No imaginário, revitalizações como as do Buraco do Padre e do Jardim do Méier transformaram áreas muito degradas e permitiram acreditar que o seu local não perde em nada para vizinhos de além-mar. Afinal, quem é do Méier não “bobeier” e até dizem que o Jacaré tá melhor que Paris!
E como resgatar orgulho de uma região com 75 bairros, 320 comunidades e 2,5 milhões de pessoas? Não tem receita mágica. É muito trabalho e pouco sono. É o famoso pé no chão. É ocupar espaço e mostrar presença tanto na execução dos serviços de rotina quanto na capacidade de receber demandas e executá-las. Porém, como toda grande base de dados, há a necessidade de uma análise qualitativa, atenção a real necessidade de quem convive ali todo o dia.
É o também famoso ouvido grande. Por mais que um gestor público tenha conhecimento do local de trabalho, é o morador que acorda e dorme naquele endereço e sabe mais do que ninguém dos problemas e quase sempre te mostra um caminho assertivo para a tomada de decisão.
À frente da Subprefeitura da Zona Norte, pude vivenciar situações inimagináveis onde a vida sofrida de pessoas passa muito longe da Cidade Maravilhosa. Mas nosso governo tem a missão de resgatar o orgulho suburbano e governar com mais atenção e carinho aos que mais precisam. Queremos influenciar positivamente a história dessa região. Sem dúvidas, os maiores combustíveis para fazer o Rio voltar a dar certo são o amor e o orgulho de ser suburbano.
Diego Vaz é subprefeito da Zona Norte do Rio
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