Por tabata.uchoa

Rio - A vida de Júlio César, Gileno e dos xarás Antônios – o Lustosa e o Pereira – é andar por esse país. Esses bravos operários, dignos personagens da música do Rei do Baião, vivem atrás de obras Brasil afora e, com os grandes empreendimentos em curso no Rio, a cidade se tornou morada para eles, pelo menos, enquanto os projetos não acabam.

Operador de guindaste nas obras da Linha 4 do metrô, o piauense Antônio Lustosa de Oliveira, 46 anos, montou casa em São Paulo para a mulher e o filho, em 95, e se muda sozinho para onde tem obra. Faísca, como é conhecido desde a época em que trabalhava com maçarico, se despediu dos dois em 2014 para encarar o maior projeto de insfraestrutura do país atualmente, mas faz questão de passar os fins de semana em casa duas vezes por mês.

O piauiense Antonio Lustosa veio trabalhar na construção da Linha 4 e já está de olho em outros projetos prometidos para a expansão do metrôJoão Laet / Agência O Dia

O currículo é de aventureiro: trabalhou em gasoduto em Manaus, em barragens em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul, construiu ponte em Roraima, estrada em Santa Catarina, o Rodoanel paulista, e o Porto de Sepetiba. “No Nordeste, o único trabalho é a roça. Era trabalhar hoje pra comer amanhã, por isso não deu nem pra estudar. Eu tinha que sobreviver”, conta o guerreiro, com jeito simples e simpático de falar.

Faísca estava há quase dois anos desempregado quando foi convidado por amigos para construir a Linha 4, que deve ser inaugurada até o segundo semestre. Antônio está prestes a realizar seu maior sonho: ver o filho, de 20 anos, formado. “Consigo pagar faculdade particular e ele já tá no terceiro ano. É futuro engenheiro civil!”, comemora, de olho nas próximas obras de metrô prometidas pelo governo, e ameaçadas pela crise financeira.

O também piauiense Antônio Pereira da Silva, de 56 anos, é encarregado de solda na Linha 4, mas é mais antigo na cidade do que o xará. Desde 1999 no Rio, ele trabalhou nas obras do Estádio do Maracanã e hoje atua na futura estação Jardim de Alah. Todo orgulhoso, ele conta que foi escolhido para dar o primeiro chute no jogo inaugural do novo Maraca, tocando a bola para Ronaldo Fenômeno. No metrô, ele Antônio também participou da construção das estações Siqueira Campos, Cantagalo e General Osório. “Entrei para construir e saí de lá andando de metrô. Quero que isso se repita agora”, conta.

Depois de ajudar a construir o Maracanã%2C Antônio Pereira atua na obra da Estação Jardim de AlahJoão Laet / Agência O Dia

Nordestinos são maioria na construção

Depois do Rio, os estados do Nordeste são os que fornecem a maior quantidade de profissionais para as obras da cidade. Na construção da Linha 4 do metrô, 30,8% dos operários são nordestinos, enquanto 66,5% são do Sudeste, 1,1% do Sul, 0,9% do Norte, 0,3% do Centro-Oeste e 0,4% são estrangeiros.

No BRT Transbrasil, prometido para 2017, 53% dos trabalhadores são do Estado do Rio, 10% são cearenses, 9%, paraibanos, e 7%, maranhenses.

Pavilhão de São Cristóvão mata a saudade de casa dos trabalhadores

O armador Júlio César Souza, 31, deixou Teixeira, povoado de 15 mil habitantes no Sertão Paraibano, em 2013, para participar da construção de um prédio no Rio. No ano seguinte, foi chamado para a construção do BRT Transbrasil, que vai conectar Deodoro ao Centro. Ele saiu da Paraíba por causa da seca. “Eu estava desempregado. Lá, a gente depende da chuva para o cultivo de hortaliças. Não deu pra continuar”, relata Júlio César, que trabalha nos pré-moldados e vigas dos viadutos do Transbrasil.

Júlio César também já construiu shoppings no Paraná e em Minas. O Rio foi o primeiro destino para onde conseguiu levar a mulher. No início, eles moraram na casa de um tio dela e, depois, alugaram quitinete em Curicica. O armador quer continuar na cidade até juntar dinheiro suficiente para abrir um negócio em sua cidade-natal. Para matar saudade, o casal frequenta a Feira de Tradições Nordestinas, em São Cristóvão. “A comida e o forró pé-de-serra de lá lembram muito o lugar da gente”, destaca Júlio César, que, às vezes, ainda estranha a barulheira da cidade grande.

Sem tempo para conhecer o Cristo e o Maracanã

Outra obra que está atraindo novos cariocas é a do VLT. Natural de Barra da Estiva, Bahia, Gileno Nascimento, 38 anos, é encarregado de obras e chegou em setembro pela primeira vez ao Rio.

Há 11 anos na construtora Azevedo Travassos, onde começou como ajudante, ele deixou a mulher e o filho de 11 anos em Sumaré, São Paulo. “Para realizar os sonhos da própria família, vale a pena sacrificar a convivência”. Sobre a obra, diz que é gratificante participar de um empreendimento desse porte e, depois do último teste, sente ainda mais que o trabalho está sendo útil.

Apesar de ser um novo carioca, ele trabalha tanto que até hoje não conseguiu conhecer o Maracanã e o Cristo Redentor – lugares que mais admirava pela televisão. O primeiro trecho do VLT, entre a Rodoviária e o Santos Dumont, será inaugurado em abril. O segundo, da Central à Praça 15, em setembro.

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