Sérgio Cabral Gazeta do Povo
Por Bruna Fantti
Publicado 28/01/2017 23:16 | Atualizado 05/08/2020 10:15

Rio - No seu primeiro aniversário na prisão, na sexta-feira, o ex-governador Sérgio Cabral recebeu a notícia de que um grupo de bombeiros havia levado um bolo para a porta do presídio. Recebeu a ironia com raro bom humor. “Ele riu e disse: ‘e onde ele está?’”, afirmou um agente à reportagem. Não houve visitas nem canto de parabéns. Ainda no pátio, recebeu o cumprimento discreto do cantineiro. Passou o dia lendo. 

Os seus 54 anos foram comemorados somente ontem, quando recebeu a visita dos familiares e ficou até as 14h30 no pátio com a esposa, Adriana Ancelmo, que também está presa. Os encontros entre os dois, às quartas-feiras e sábados, já ocorrem há três semanas e estão dentro da rotina normal do presídio. Mas nem sempre foi assim, de acordo com quem conhece o dia a dia de Bangu 8 — onde Cabral está preso desde 17 de novembro acusado de desviar verbas de contratos públicos.

“Os presos ficam no pavilhão interno, com exceção da hora do banho de sol no pátio. Mas a cela dele fica aberta na parte noturna”, contou um inspetor.

O motivo dado aos outros presos para a abertura da cela C6, seria o seu tamanho. “É uma das piores celas de Bangu 8. Os beliches se tocam nas pontas. Mas foi estratégia, pois quando está muito calor à noite, ela é aberta e o Cabral vai para a biblioteca”, disse a mulher de um preso, que não é da lava-jato, mas que está no mesmo presídio. Um outro inspetor acrescentou que ele já chegou a dormir na biblioteca de madrugada. “Ele passa muito tempo lendo livros nela. Faz isso sempre. Fica isolado. Conversa somente com o diretor”.

A mudança no comportamento foi marcante após uma briga com Hudson Braga, seu ex-secretário de Obras,no Réveillon. “Já era noite, umas 21h. Eles estavam na cela e muitos presos começaram a chorar no pavilhão. Essas datas são difíceis. Me contaram que Cabral segurava o outro colega dele com a mão no peito, apontando o dedo , dizendo: se alguém falar algo sou eu! O outro, respondeu: ‘Você quer nos afundar junto. Vai delatar quem? Você mesmo?”. Ele se referia à possibilidade de delação premiada.

Segundo um agente, Cabral perdeu peso neste mês: “cerca de dez quilos”. “Ele não costuma jantar, sempre compra algo da cantina ou come frutas. No início, chegou a elogiar a comida. Pediu até para ir conhecer o cozinheiro, o que foi autorizado”. A rara exceção é a compra de lasanha na cantina. “Mesmo assim, ele pede para o cantineiro comprar a de frango com vegetais. E gasta mais que o permitido”.

Entre os parentes que já o visitaram estão a irmã Cláudia de Oliveira Cabral; a mãe, Magaly Cabral; o irmão Maurício Cabral; e os filhos José Eduardo Cabral e Marco Antônio Cabral, todos com carteirinha que foram expedidas no tempo recorde de sete dias.
Antes das visitas serem autorizadas pela Secretaria de Administração Penitenciária, Marco Antônio Cabral usou sua carteira de advogado para entrar. Atualmente, a utiliza somente para passar direto pela portaria (prerrogativa autorizada para defensores), mas leva a família no banco de trás.

“Aqui só tem uma entrada e uma saída. Os familiares nunca entraram na fila do ônibus ‘expresso da paz’ para ir até Bangu 8”, contou a parente de um preso, citando o apelido do coletivo obrigatório para o transporte das visitas. A informação foi confirmada por dois agentes que cuidam da portaria. No primeiro dia da greve dos agentes, Marco Antônio passou direto, mas foi barrado na entrada de Bangu 8. Uma das medidas adotadas pelos grevistas foi justamente a suspensão das visitas. A reportagem entrou em contato com os advogados de Cabral e de Marco Antônio, mas não obteve retorno.

Encontro íntimo ainda não foi autorizado com Adriana Ancelmo

Entre as denúncias contadas pelos agentes, e que foram encaminhadas ao Ministério Público, estão a de que Adriana Ancelmo se alimenta somente na cantina, com dinheiro recebido nas visitas. O valor seria incompatível com o que cada preso pode utilizar por semana na lanchonete: R$ 100. Além disso, ela encomendaria pratos para o cantineiro, com comidas que não deveriam ser autorizadas.

Cabral e Adriana já teriam se encontrado no gabinete da direção— mesmo local onde o secretário de Administração Pública, Erir Costa Filho, visitou Cabral. Erir foi comandante-geral da PM em 2012, no seu governo.

A visita no parlatório (visita íntima) já foi solicitada à direção. No entanto, o setor de serviço social não liberou, alegando pouco tempo para a autorização do benefício, o que teria contrariado o desejo da diretora da unidade onde Adriana se encontra.

O tratamento desigual dispensado à Cabral foi o que motivou o promotor André Guilherme Freitas, da Vara de Execuções Penais, a pedir a transferência do ex-governador para Curitiba — mesmo não sendo ele o responsável pela vistoria de Bangu 8.

O fato de que deputados, como Jorge Picciani e Cidinha Campos, terem usado a condição de parlamentares para realizar visitas a Cabral, motivou a denúncia. Na resolução 584 da própria Seap, deputados só podem entrar no Complexo “no exercício da função pública”, participando de uma sindicância, por exemplo. Caso contrário, devem esperar a expedição da carteirinha.

Procuradas pela reportagem, as assessorias dos deputados confirmaram as visitas. Em nota, a Seap disse que “as denúncias dos agentes não procedem”. E, em relação aos deputados, contrariando a própria resolução, disse que “os deputados possuem prerrogativas”.

A promotora responsável pela fiscalização de Bangu 8, Valéria Videira, informou que “fiscalizou o local e não encontrou irregularidades”. Ela não respondeu se solicitou as câmeras noturnas da unidade.

Já o promotor Freitas declarou que “se esse tratamento estiver ocorrendo, soa como absurdo os favorecimentos estarem acontecendo a olhos vistos, sem que nada de concreto seja feito. O secretário, se estiver ciente disso, parece continuar subordinado a Cabral”, afirmou ao DIA.

 

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