David Anthony fala sobre seus projetos de gestão como secretárioAlexandre Brum
Por ADRIANA CRUZ
Publicado 11/03/2018 03:00

Rio - Combater a corrupção, conseguir verba e revogar ordens estranhas como a que impede até a entrada de água nas cadeias para beneficiar cantinas são as metas do secretário de Administração Penitenciária, David Anthony. "O exemplo vem de cima", diz ele.

Seu antecessor, coronel PM Erir Ribeiro, foi afastado por regalias concedidas ao ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), que estava na Cadeia Pública José Frederico Marques, em Benfica. Após mais um escândalo (o encontro de um 'motel' na unidade, revelado pelo DIA), dez agentes da Corregedoria estão baseados ali. Amanhã, ele apresentará ao interventor, general Walter Braga Netto, relatório com as demandas e sugestões para sua pasta.

O DIA: O senhor assumiu em meio a denúncias de corrupção, decisão judicial de afastamento do então secretário, o coronel PM Erir Ribeiro.

David Anthony: A intervenção chegou quando eu cheguei. Havia uma decisão judicial de afastamento do secretário que estava há três anos e de um subsecretário operacional, Sauler Sakalem, que estava há oito anos, e também o afastamento de diretores e de subdiretores por causa da criação de uma unidade prisional, segundo o Ministério Público, para favorecer... (presos da Lava Jato). Vamos botar ordem na casa.

Mas o senhor foi escolhido pelo governador Luiz Fernando Pezão.

Sim. Ele é o governador. Mas meu nome foi ratificado pelo general (Braga Netto).

Benfica é um presídio encomendado. E desde a sua criação até hoje só há denúncias de regalias.

Foi esse o motivo do afastamento do Erir. Quando eu cheguei já tinham assumido os diretores de Benfica e Bangu 8. Tinha que dar espaço para essas pessoas mostrarem o serviço delas e fiscalizar. Cheguei três semanas antes da intervenção. Tinha que montar equipe e percorrer os órgãos, como Tribunal de Justiça. Antes do Carnaval, já tinha nomes para mudar, mas foi uma decisão estratégica minha esperar.

Agora foram mudados 17 funcionários entre diretores e subdiretores.

Depois do Carnaval houve a intervenção e a inspeção no presídio de Benfica.

O senhor sabia da operação do Ministério Público para apurar 'motel' do presídio de Benfica?

Não e nem quero saber. Há independência entre os poderes. Prefiro não saber. Mas o resultado eu sei. Vinte sete presos têm direito ao parlatório. Mas o processo para ter esse direito é demorado. Leva uns seis meses. A mulher também é ouvida, passa por assistente sociais. Hoje, são 715 presos. Mas alí é porta de entrada do sistema. Fixos são de 470 a 500. A decoração tem em outras unidades. São os presos que preparam. Ali a questão era quem estava usando e se há uso indevido. Só há uso indevido se houver favorecimento.

Mas a direção foi mudada.

O favorecimento você não identifica de pronto. Só se encontrar alguém lá dentro. Temos que investigar. Mas não foi por causa da existência objetiva do parlatório.

Benfica coleciona escândalos de regalias. As pessoas ficam indignadas porque são para os presos da Lava-Jato.

Se a regalia existia e havia conivência não só da administração da unidade, mas pela apuração do Ministério Público, subia até à secretaria. Quando entro como interventor, essa regra de corrupção muda. É o que a gente estuda lá fora, internacionalmente, como o exemplo que vem de cima. O tom tem que vir do topo. Você sinaliza que não vai tolerar.Você quebra esse paradigma. Vou prender. Se tenho histórico de regalia, isso não é prejudicial só para a unidade e para a opinião pública, isso reflete para as outras unidades. Vim para mudar. Vou prender. Se tem regalia, a gente vai apurar para prender.

Vai haver punição por causa do 'motel'?

As imagens estão sendo analisadas, vamos ver se os processos de quem pediu autorização para o parlatório estão regulares. Estamos fazendo correição em Benfica. Dez agentes da Corregedoria não saem mais de lá, das 8h às 17. A direção foi mudada por causa da apreensão de material. Foram encontrados mais de R$ 7.404,00, tênis, roupas pretas, boné, coisas que não dão para o chefe da segurança alegar que não viu entrar. Aí bati o martelo.

E as outras mudanças?

Eu já ia mudar, mas não quis fazer antes do Carnaval. Outras mudanças podem acontecer.

Quantas punições a Corregedoria produziu nos últimos anos?

A Corregedoria hoje conta com uma delegada, a Ivanete (Araújo), que foi corregedora da Polícia Civil só para a processos administrativos. Foi solicitado pelo gabinete de intervenção ao Ministério da Segurança a sessão de um delegado federal, ainda não posso dar o nome. Estou mudando a estrutura. A Superintendência de Inteligência vai ser subordinada à Corregedoria. Vou ter equipes fazendo fiscalização. Aqui há uma qualidade grande de agentes. Eles não tinham chances de ocupar espaço.

Tem ideia de punição?

Posso levantar, agora não tenho como passar. O que podemos observar é um formalismo muito grande sem o resultado efetivo.

Qual o recado para o mau servidor?

Ele não encontra respaldo de cima. O agente que se envolve em corrupção busca explicação, justificar 'ah no Brasil é tudo assim mesmo. Meu chefe é assim'. Por isso, falo sobre o exemplo que vem de cima. Fui da Aeronáutica, oficial militar, trabalhei na área de inteligência, delegado de polícia, Corregedor do Detran, controlador do bilhete único. Meu histórico diz quem sou.

Em Japeri, houve cinco varreduras e todas com apreensão de celulares.

Estou sem o scanner corporal. Segunda-feira (amanhã), vou entregar relatório ao interventor das necessidades do sistema orçamentária e de logística.

Pode adiantar?

A gente está pedindo muita coisa, como viaturas, scanner corporal para todas as cadeias, mas preciso de manutenção, mais armamento, conclusão de unidade. Hoje não tenho praticamente verba de custeio. As unidades têm problemas de superlotação e estrutura depauperada.

Como o senhor encontrou a pasta?

Um caos. Encontrei mil armas que não tinham sido distribuídas, coletes à prova de bala no depósito. Distribuímos. O grande problema da corrupção são os nós administrativos. As normas precisam ser firmes e claras.

Exemplo?

Hoje, a cantina pode comercializar água, mas a visita não pode entrar com água. Isso é uma norma. Vou mudar isso.

E quem toma conta das cantinas?

Vou ter uma reunião na semana que vem com Ministério Público, Defensoria, Tribunal de Contas para apresentar o quadro. A licitação venceu em dezembro. As cantinas continuaram nas mãos das mesmas empresas sem licitação. É um quadro complicado. Estou auditando contratos, levantando efetivo e cada em área há abacaxi, vou descascar. Mas a gente enfrenta, chama o Ministério Público.

E os contratos de fornecimento de alimentos?

Foram feitos contratos emergenciais com as mesmas empresas por 180 dias que não puderam ser renovados. Não tinha contrato. Tinha um Termo de Ajustamento de Conduta. Você fornece e pago, são R$ 30 milhões, por mês. Isso não faço. Fizemos contrato emergencial mas abri para todas as empresas. Agora, tem gente de São Paulo e Pernambuco. Posso cobrar e a licitação será feita. Tenho reunião no Tribunal de Contas semana que vem. É transparência.

Qual o maior problema para o senhor, corrupção ou falta de verba?

Verba. Corrupção a gente sempre vai combater. Até 31 de dezembro, vamos entregar uma unidade. Trabalho mais racional de reforma de unidades. A gente vai deixar pronto projetos para o próximo governo em andamento.

A União anunciou linha de crédito de R$ 45 bilhões. Quais as metas?

A gente vai ver uma verba do Depen (Departamento Penitenciário Nacional) montar um grande sistema de câmeras. Hoje, só tenho três unidades com sistema profissional e as demais com sistemas caseiros, com os dados sendo armazenados no HD da unidade. Nosso projeto, é ter equipamentos em todas, que possamos ter acesso às imagens daqui, abrir link para o Ministério Público. É organização com total transparência. Com relação a linha de crédito aberta, também para equipamentos, tenho certeza de que a verba virá.

Os bloqueadores de celulares estão funcionando?

Qual é o grande problema? Você contrata a empresa para o bloqueio dos celulares. O que as empresas fazem? Por conta das reclamações de clientes, começam a aumentar a potência das suas estações. Então, não demora muito, aquele bloqueio começa a cair. Então, você tem o bloqueador, mas não é tão eficaz. Existe um projeto de lei que está no Senado para obrigar as operadores a não fazerem isso. Então, os R$ 9 milhões que tenho para os bloqueadores, poderia usar em outra coisa.

Os presídios do Rio vão deixar de ser 'home office' do crime?

Vão. Não tenho dúvida. Tudo que acontece aqui fora é mera reverberação do que tem lá dentro. Acontece aqui fora porque veio de lá de dentro. Vamos fortalecer a Corregedoria e a Inteligência que está espalhada em três espaços diferentes. O Erir entregou um andar inteiro do nosso serviço para Polícia Militar, em detrimento da inteligência daqui. Vou organizar a nossa inteligência em um espaço só.

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