Rio - Quem foi rei, nunca perde a majestade. Pontos comerciais tradicionais da Zona Norte do Rio, que eram praticamente únicos, quase sem concorrência no século passado, ainda sobrevivem e desbancam o fechamento de lojas, que em 2017 chegou a nove mil na capital. Os tempos áureos ficaram para trás, edificações cresceram ao redor, mas muitos estabelecimentos antigos ainda estão firmes. Como foram fundados, servem de fontes históricas, e referência, não só geográfica, mas, sobretudo, de bom atendimento e qualidade.
É o caso do Bar Três Marias, que acaba de rebatizar o antigo Bar Dona Maria, na Tijuca. Depois de 61 anos à frente do reduto de encontro de sambistas famosos, como Beth Carvalho, Noca da Portela e Nelson Sargento, sempre atraídos pela cerveja gelada e petiscos a bom preço, a portuguesa Maria Ramos, de 96 anos, passou o ponto de boa conversa e comidinhas na calçada para a família de Victor Costa, 22.
"Iniciamos reforma para vender apenas salgadinhos. Mas recebemos tantos apelos que decidimos mudar apenas o nome. Numa cadeira de rodas, dona Maria Ramos se emocionou ao ver que daríamos continuidade ao que ela construiu", conta Victor. "Voltei a frequentar pelos famosos pasteizinhos, o carinho dos garçons e os ensaios do Bloco Nem Muda Nem Sai de Cima", justifica o fotógrafo Berg Silva.
No Andaraí fica outro 'herói da resistência' o Império das Cortinas, fundado há meio século por Hercílio Feitosa Silva, 86 anos, e mais conhecido como Fábrica de Cortinas. "Somos teimosos. Não abandonamos o barco nunca", diz, orgulhoso, Hercílio, que, com a esposa, Enoé, e outros dois parentes, confecciona, à mão, cerca de 70 cortinas personalizadas por mês. "Cada uma tem seu DNA", avisa.
Especialista em economia, Marilúcia dos Santos, ligada à Confederação Nacional do Comércio e Bens, diz que a longevidade de lojas que mantêm o estilo, amparada na fidelidade da clientela e no bom atendimento, tem papel fundamental para o desenvolvimento dos bairros. "São exemplos de persistência e sucesso", avalia.