Braga Netto deixa a função no dia 31 de dezembroFernando Frazão / Agência Brasil
Por Agência Brasil
Publicado 04/07/2018 04:48 | Atualizado 04/07/2018 04:49

Rio - Em entrevista concedida, nesta terça-feira, o interventor federal na segurança pública do Rio, general Walter Braga Netto, disse que equipar e treinar os policiais do estado é um dos legados que pretende deixar do seu comando. Assim como um modelo de gestão que inclui a valorização do policial e das corregedorias. Braga Netto é categórico ao dizer que a intervenção vai até 31 de dezembro, mas espera conversar com o futuro governador, caso este queira. Ele diz que a prorrogação da intervenção é "completamente desnecessária". "Se não, vocês vão ficar dependentes o resto da vida".

O general garante ainda que o carioca e o fluminense irão ver "uma melhora palpável, cada vez mais, até o fim do ano". Segundo ele, já há uma mudança de postura do policial. "O policial tem de respeitar a população e a população tem de ver a polícia como uma autoridade. Hoje em dia, a palavra autoridade perdeu muito o conteúdo. O pessoal confunde autoridade com autoritarismo", diz. "O crime nunca vai acabar. O que vai acontecer é que este crime de ostentar fuzil nós vamos combater com firmeza", completa.

O senhor esperava encontrar uma crise dessa proporção no Rio de Janeiro?

General Walter Braga Netto: Eu fui o coordenador dos Jogos Olímpicos para o Exército. Participei de praticamente todas as operações no Rio de Janeiro. O que a gente via num crescente era a deterioração econômica do Rio. O que nós estamos fazendo na intervenção, neste primeiro momento, é uma melhoria gigantesca de gestão. Estamos conseguindo resultados, mas o recurso federal tem uma burocracia que tem de ser seguida, mesmo com dispensa de licitação. O TCU me pautou normas que tenho de seguir. O recurso ainda não foi utilizado. O que foi dado inicialmente foi um choque de liderança e gestão que fez cair os índices. Quando começarem a chegar as aquisições, isso deve melhorar muito. A população brasileira é muito imediatista. Ela quer o resultado assim: começou a intervenção hoje e, no dia seguinte, caíram todos os índices de criminalidade. Isso é paulatino. O Instituto de Segurança Pública vai lançar agora os índices de junho e você vai ver que eles caíram de novo.

Braga Netto comanda a intervenção até dezembroFernando Frazão / Agência Brasil

Quais índices caíram?

Roubo de carga, de veículo. O próprio roubo de rua caiu. Você tem várias maneiras de ver a estatística. Se você compara todo o período do ano passado com todo o período deste ano, há uma distorção, porque houve uma greve (da Polícia Civil) em janeiro, fevereiro e março. Então, a Polícia Civil não fez diversos registros. Mesmo assim, os índices caíram.

O senhor falou da lentidão e da burocracia na liberação das verbas.

Eu tenho de especificar cada verba. Já foi feita toda a burocracia de mais ou menos 40% do valor que a intervenção recebeu. Isso dá quase R$ 500 milhões. Boa parte em cima de coletes, uniformes, armamento, viatura, material para a polícia técnica. (Todo esse recurso) está praticamente pronto para ser liberado.

No início, o senhor anunciou que a intervenção seria dividida em três partes. Haveria um choque, depois treinamento e aparelhamento, e finalmente a mudança na estruturação das polícias. Em que fase estamos?

O primeiro gabinete que eu montei era uma estrutura de um quartel. Por quê? Porque eu recebi uma ligação no dia 15 de fevereiro e a minha publicação saiu no final de fevereiro. O anúncio foi em fevereiro e a aprovação para eu poder trazer pessoal de fora, que não seja militar, foi só em junho. Você imagina o seguinte: eEu te digo que eu tenho uma vaga com um DAS 6 (direção e assessoramento superior no nível mais alto). O senhor vem trabalhar comigo? Mas tem um probleminha, eu te falo isso em abril e digo que a estrutura não está aprovada. Como a estrutura não está aprovada, não passou pelo Congresso, você não vai receber agora, nem vai receber retroativamente. Ou seja, você vai pensar umas dez vezes antes de vir. Por isso é que a estrutura básica é de militares e por isso só agora começamos a chamar pessoal da AGU, do TCU, do governo do estado. Eu não gerencio, mas acompanho as finanças do estado. Tenho de tomar muito cuidado para não gerar custos ao governo estadual. Porque em 31 de dezembro acaba a intervenção.

Interventor participa de solenidade da Polícia MilitarFernando Frazão / Agência Brasil

O senhor vai conseguir cumprir o prazo? O Congresso já aprovou a prorrogação desses cargos comissionados até junho de 2019.

Esses são os cargos basicamente técnicos que vão fazer a gestão. A intervenção acaba. O que fica depois de 31 (de dezembro) é o pessoal que vai fazer a transição e o legado. Eu já estou treinando esse pessoal. Quando nós sairmos, eles vão continuar a transição. Como eu falei, não há necessidade de permanecer a intervenção. Nós estamos deixando esse planejamento pronto. Há necessidade de mantê-lo e não deixar depois a segurança pública ser contaminada novamente por indicações políticas. Segurança pública tem de ser técnica, tem de ser por meritocracia.

O que o senhor está fazendo é uma estrutura para ser continuada?

Exatamente! Estou ensinando a eles. Nosso pessoal está ensinando a eles. Aqui no Rio, o pessoal tinha perdido o hábito de planejar e de cumprir o rito administrativo. As compras eram muito por oportunidade. E não é assim. O pedido tem de ser feito dentro de uma logística. Os pedidos eram muito regionalizados. Não se pensava no Estado do Rio de Janeiro como um todo.

O senhor teve dificuldades?

A gente teve uma fase de adaptação. Não tivemos problemas operacionais. Também não me meti a ensinar para eles (policiais militares e civis) a fazer operação. Eles sabem fazer isto muito bem. Até melhor do que a gente. O que nós mostramos para eles é que havia necessidade de se fazer uma sequência logística. E pensar na vida útil dos materiais. Vou te dar um exemplo: o cara me pede 4 mil viaturas. Eu vou lá e compro. O que vai acontecer? Elas vão ficar velhas ao mesmo tempo. Eu vou precisar comprar mais 4 mil viaturas. Mas se eu tiver uma diagonal logística, eu vou lá e compro 2 mil este ano, 2 mil daqui a dois anos. E uso esse material para manutenção. Daqui a dois anos, ele vai ter 2 mil novas e 2 mil antigas em condição de uso. O que acontecia aqui é que ia rodando, rodando, até acabar.

Interventor participa de solenidade da Polícia MilitarFernando Frazão / Agência Brasil

Como é esta reestruturação das policias de que o senhor fala?

Vou te dar o exemplo da UPP da Mangueirinha. O pessoal dizia assim: "quando acabar a UPP, vai ficar abandonado". A UPP da Mangueirinha acabou, os quatro batalhões da área foram beneficiados porque receberam o pessoal da Mangueirinha. E Mangueirinha continuou sem nenhum problema. Ninguém vai abandonar nada. O que nós estamos fazendo é um estudo e uma distribuição mais adequada.

Quanto tempo demora esta reestruturação?

Isto vai ter de continuar. Eu vou dar início. Não fui eu quem planejou isto não. A própria PM já tinha planejado. A PM não teve oportunidade de implementar. Nós demos uma ajustada no planejamento.

Tem muita gente que pede a prorrogação da intervenção...

Completamente desnecessária. Se não, vocês vão ficar dependentes o resto da vida. Não vai sair nunca. A qualidade do policial civil e do policial militar é muito boa. Tem gente que dá problema? Tem, como em qualquer instituição. Ela precisa ser valorizada e o chefe tem de ter liderança sobre a sua tropa.

Ele coordenou as ações de segurança dos Jogos Olímpicos do RioFernando Frazão / Agência Brasil

O seu planejamento prevê tirar esta banda que dá problema?

As corregedorias estão funcionando. Não só da Polícia Civil, como da Militar. Em todos os níveis. O pessoal acha que a corregedoria vai atacar só o nível mais baixo. A corregedoria está atuando em (casos de) oficiais, praça, delegado, agente. Já tem vários casos. Fortalecemos a corregedoria não só da polícia como da Seap.

E quando o senhor acha que acaba?

Não tem data. Se não houver uma fiscalização constante, você sempre corre o risco de alguém se desvirtuar. Seja policial, das Forças Armadas, político, qualquer poder. Meu pai dizia o seguinte: "a oportunidade não faz o ladrão, revela". Então, você sempre tem de ter uma fiscalização. Nós vamos mostrar que ela está funcionando e se fortalecendo. E a nossa intenção é prover meios que facilitem o gerenciamento destes problemas. Estamos falando de tecnologia para deixar como um legado.

De que tipo?

Transformar o Centro Integrado de Comando e Controle numa central que concentra todo o tipo de informação. Você vai olhar a localização de todas as viaturas que estão andando. Vai facilitar a gestão e o controle. O comandante vai ter ciência de quantas vezes a unidade dele foi acionada pelo Disque Denúncia. Se recebeu 19 acionamentos, mas só respondeu a três. Por quê? Só que ele vai ter acesso a essa informação, como o secretário vai ter acesso e a corregedoria também. A fiscalização é que faz a pessoa funcionar.

Braga Netto está a frente da intervenção desde fevereiroFernando Frazão / Agência Brasil

Neste período da intervenção, aconteceram duas situações críticas: o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes e a operação no Complexo da Maré, que resultou na morte do estudante Marcos Vinicius...

Quem fala sobre a Marielle é só a Homicídios. E não fala nada. Está correndo em segredo de Justiça. Temos equipes dedicadas exclusivamente ao caso. O pessoal está investigando para fazer uma aquisição de provas bem sólida. Não adianto nada do caso porque nem eu pergunto. Nem eu pressiono. Só pergunto ao secretário se está andando e ele fala que está andando muito bem. Quanto ao caso da Maré, foi aberta investigação por parte da Secretaria (de Segurança) para poder acertar os procedimentos do uso de helicóptero, na questão do horário de escola, utilização de armamento letal e menos letal. Estão ajustando os protocolos.

O Rio de Janeiro é uma vitrine e a segurança é um problema do Brasil inteiro, em todas as esferas. A intervenção no Rio vai ajudar ou prejudicar nas eleições?

A eleição não tem nada a ver com a intervenção. O que pode acontecer é que o modelo que estamos usando, de planejamento de gestão, seja adotado em outros estados. Não há necessidade de intervenção, mas um modelo de gestão que tenha de ser adaptado a cada região do país. Eu já rodei o país inteiro. Cada região tem um tipo de procedimento. São "países" diferentes. Aqui tem milícias, não é uma só, e diferentes facções. Em São Paulo tem uma facção só. Em cada estado, a abordagem da questão de segurança é diferente.

Quando é que o morador do Rio de Janeiro vai se sentir totalmente seguro?

Eu não posso dizer para você quando vai se sentir, mas eu garanto que ele vai ver uma melhora palpável, cada vez mais, até o fim do ano. Você já vê pela própria postura do policial militar. Você já vê mais viaturas. O policial tem de respeitar a população e a população tem de ver a polícia como uma autoridade. Hoje em dia, a palavra autoridade perdeu muito o conteúdo. O pessoal confunde autoridade com autoritarismo. O crime nunca vai acabar. O que vai acontecer é que este crime de ostentar fuzil nós vamos combater com firmeza.

Ele afirma que a autoridade do policial precisa ser valorizadaFernando Frazão / Agência Brasil

Quantas pessoas vão ficar no grupo de legado para fazer a transição em 2019?

Autorizados são sessenta e poucos, mas eu tenho 45. Não vão ficar todos. Deve ficar um terço ou menos. Depois de junho nós saímos. Este prazo de junho não significa que eles sairão em 30 de junho. Pode chegar em abril e a gente concluir que terminou.

Muda alguma coisa depois de 31 de outubro?

Em 31 de outubro, eu vou procurar o novo governador e apresentar para ele o que está sendo feito. Caberá a ele decidir tocar. Mas para mim o que vale é o decreto presidencial.

Para ele, o fluminense vai sentir mudanças significativas na segurança pública até o fim do anoFernando Frazão / Agência Brasil

Você pode gostar

Publicidade

Últimas notícias