A poluição causada pela CSN revolta moradores, que denunciam problemas de saúde respiratória nas redes sociais e imprensaFrancisco Edson Alves/ Agência O DIA
Por FRANCISCO EDSON ALVES
Publicado 23/07/2018 15:50 | Atualizado 23/07/2018 22:10

Rio - A Companhia Siderúrgica Nacional poderá ser multada em até R$ 300 mil por emissões fugitivas (materiais poluentes) na atmosfera de Volta Redonda, no Sul Fluminense, conforme a própria empresa admitiu e o O DIA publicou hoje com exclusividade. Em nota ao jornal, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) afirmou ter destacado um auto de constatação, que pode gerar a infração, depois de ter enviado técnicos à Usina Presidente Vargas (UPV), em decorrência das emissões e das denúncias feitas pela reportagem. O órgão também adiantou que um novo Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) está sendo elaborado, obrigando a CSN a investir cerca de R$ 400 milhões na modernização dos equipamentos de controle de emissões de substâncias poluentes no ar.

Desde o mês passado, o DIA vem mostrando, em série de reportagens, o sofrimento de moradores do município, por conta de pó preto de escória (rejeitos da produção do aço nos Altos-Fornos e Aciaria) que saem das chaminés da usina e do depósito sem controle, operado pela Harsco, na periferia; de cor avermelhada (resultado da queima de sucatas), além de possíveis gases maléficos de seus Altos-fornos e Aciaria da CSN.

No sábado, a empresa admitiu ter constatado problemas relacionados ao controle de materiais poluentes em sua produção. Em nota, revelou que "identificou emissões fugitivas pontuais na semana passada", garantindo já ter levantado as causas e que já estaria “tomando medidas técnicas” para sanar os problemas.

Na nota desta segunda-feira, o Inea informou que, “em busca de uma solução definitiva do problema e do fim dos incômodos que a CSN tem causado a população, está sendo elaborado um plano de ação a ser formalizado junto a empresa”.

“O plano, que inclui investimentos da ordem de R$ 400 milhões, será submetido à Comissão Estadual de Controle Ambiental (Ceca), e, se aprovado, no dia 20 de setembro permitirá a concessão de uma nova Autorização Ambiental, que garantirá a continuidade da operação da Usina, em prazo também a ser determinado pela Ceca”, diz o texto.

Ainda no nota, O Inea garantiu estar “consciente dos problemas enfrentados pela população”, afirmando que não tem economizado esforços no sentido de obter da empresa soluções que não sejam meramente paliativas. “Não podendo deixar de considerar que trata-se de uma siderúrgica que já opera há mais de 50 anos, mas que ainda assim precisa se adequar às normas ambientais”, finaliza o documento.

Entenda o problema

Fontes pontuais são as de fácil localização e que possuem mecanismos de controle e direcionamento do fluxo de poluição emitido, por chaminés ou de um escapamento, por exemplo.

De acordo com Resolução 382/2006 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) emissões fugitivas são definidas como lançamentos difusos na atmosfera de qualquer forma de matéria sólida, líquida ou gasosa, efetuada por uma fonte que não possui dispositivo projetado para dirigir ou controlar seu fluxo. Dessa forma, as emissões fugitivas provêm de fontes emissoras difusas.

De acordo com a United States Environmental Protection Agency (EPA), estas emissões são não intencionais e partem de tubulações e vazamentos de equipamentos em superfícies seladas ou impermeáveis, e até de dutos subterrâneos.

Apesar da definição do Conama para emissões fugitivas, no que diz respeito a emissões atmosféricas, o termo é comumente restringido a liberações difusas de compostos orgânicos voláteis (VOCs) na atmosfera, ou seja, de qualquer composto orgânico que sofra reações fotoquímicas na atmosfera. Os VOCs reagem na atmosfera formando principalmente o ozônio (O3), que apesar de ser benéfico quando na estratosfera, ao se concentrar na troposfera (camada atmosférica onde vivemos) pode ser extremamente prejudicial para a saúde e para o meio ambiente.

MPF-VR e deputados investigam denúncias

Problemas relacionados à poluição na CSN, seja de gases ou partículas de poeiras, são investigados pelo Ministério Público Federal (MPF-VR) e estão na mira de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj).

No bairro Brasilândia e adjacências, as pilhas do material, que já alcançam mais de 30 metros de altura (o recomendável seriam até 4 metros), são ameaças ao Rio Paraíba do Sul e à saúde dos moradores. O MPF-VR aceitou denúncia da ONG Associação Homens do Mar (Ahomar) e abriu inquérito para apurar responsabilidades. O MPF também recebeu denúncias de moradores, da Comissão Ambiental Sul (CAS) e ONG Baía Viva. Ainda durante a série de matérias, o Inea garante ter determinado a redução dos montes de escória, que invadem uma Área de Proteção Preservação Permanente (APP).

Em uma outra nota anterior, a CSN admitiu que a escassez de chuvas pode estar contribuindo para o aumento "de partículas de diversas fontes de poeira no ar" e que tem adotado "várias medidas (sem detalhar quais) para reduzir incômodos à comunidade". Denúncias na internet mostram moradores limpando quintais e reclamando de doenças respiratórias em toda a cidade. Representantes das entidades afirmam que há "um bom tempo" os moradores não conseguem acesso imediato a registros da qualidade do ar em Volta Redonda.

"É uma caixa preta. Os painéis que deveriam informar publicamente o nível de qualidade da atmosfera (bom, regular ou ruim), 24 horas por dia, controlados pela própria CSN, estão fora do ar há meses, assim como a página do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), que deveria prestar o serviço. Mesmo se o site estivesse funcionando, só há dados disponíveis até dezembro de 2017", criticou Adriana Vasconcellos, presidente da CAS.

"Há 11 anos, sondagem popular já denunciava os efeitos negativos da poeira siderúrgica para os pulmões e pele dos moradores. Em 2015, provamos no MPF-VR, usando imãs, que há limalha de ferro em poeira que invade as casas", lembrou José Maria da Silva, o Zezinho, integrante da comissão.

Em resposta aos moradores, o Inea informou que as medições de qualidade do ar em Volta Redonda são feitas por nove estações, sendo uma delas na região do pátio de escória da própria CSN. O órgão explicou que a CSN opera e mantém oito estações de qualidade de ar e uma de meteorologia, "porque é prática do controle ambiental que atividades responsáveis por emissões se responsabilizem pelo monitoramento do entorno, atendendo a instruções do Inea".

Problemas recorrentes

Possíveis falhas no controle de emissão de material particulado em sua produção de aço na atmosfera, fizeram a CSN emitir nota aos acionistas, anunciando, dia 20 de junho, ter conseguido "mais 90 dias de autoridades ambientais para operar a Usina Presidente Vargas". Prazo para "continuar a busca de solução consensual definitiva das questões ambientais".

O Inea, acusado pela Ahomar de suposta "conivência" com o descontrole do depósito de escória, por estar há oito anos analisando pedido de licença da Harsco, revelou que o monitoramento do ar é feito de uma em uma hora nas estações automáticas, e a cada seis dias, por 24h, nas convencionais. "Nos últimos dois meses a qualidade ficou entre regular e boa", assegurou

Já no site da Secretaria de Meio Ambiente da Prefeitura de Volta Redonda, o internauta parece cair numa pegadinha, ao ser orientado a acessar a página fora do ar do Inea. O órgão alega que seu portal está "passando por modernização" e que a CSN "aprimora a tecnologia" dos painéis de informações inoperantes. 

Pé atrás com punição

Representantes comunitários e de defesa do meio ambiente ouvidos pelo DIA veem com desconfiança o anúncio de mais um TAC a ser firmado entre a CSN e Inea, como os de 2000 e de 2010. "As autoridades têm é que cobrar o cumprimento de outros TACs anteriores, que nunca foram cumpridos em sua totalidade. Na verdade, servem de cortina para que a empresa continue castigando a cidade com poluição", resumiu o consultor ambiental Amaranto Júnior. A CSN e o Inea não comentaram o assunto.

Ele lembrou, por exemplo, que em 2016 a CSN foi condenada, a partir de um parecer da 6ª Procuradoria de Justiça de Tutela Coletiva do MPRJ, a pagar R$ 13 milhões pelo descumprimento do TAC de 2010. O TAC previa investimentos no controle de efluentes líquidos, águas pluviais, emissões atmosféricas, riscos potenciais e ruídos na UPV. Na época, a CSN alegou ter enfrentado "problemas alheios à sua vontade", como a dificuldade de contração de empresas especializadas para execução de certos serviços".

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