William e o ator e músico Jefferson Brasil, durante a gravação do filme
William e o ator e músico Jefferson Brasil, durante a gravação do filme "Pacified"Reprodução
Por Natasha Viana* e Rafael Nascimento

Rio - Cerca de 50 pessoas participaram de um protesto na frente do Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ), no Centro do Rio, na manhã deste sábado, pedindo a libertação de William Preciliano Bezerra da Silva, de 20 anos, preso há 10 dias sob a acusação de sequestrar e torturar policiais militares no Morro dos Prazeres, em Santa Tereza, Região Central do Rio, em novembro do ano passado. William foi preso quando tirava a carteira de habilitação no posto do Detran do Largo do Machado, na Zona Sul, no último dia 9. A família alega que ele é inocente e advogados dizem que uma foto dele durante a gravação de um filme na comunidade, em que aparece com uma réplica de fuzil, foi usada quatro meses depois para reconhecê-lo como um dos criminosos envolvidos no ataque aos PMs da UPP local. 

No inquérito em que William e mais 12 pessoas foram denunciadas, a juíza destacou que o réu foi reconhecido por nove policiais, através de uma foto em que aparece carregando um fuzil, como sendo um dos responsáveis por torturar e ameaçar os militares para que saíssem de locais estratégicos, permitindo que o tráfico retomasse a venda de entorpecentes na região. No momento em que os PMs ficavam reféns de criminosos, William amparava a mãe que passava mal em casa.

Segundo José Preciliano da Silva, de 56 anos, pai do jovem, o jovem foi ao posto do Detran para tirar a habilitação, um presente de aniversário dado por ele. "Meu filho é um excelente filho, nunca me trouxe problema. Tudo que eu faço é pra ele. Ele fez aniversário dia 18 de julho e não quis festa, mas quis tirar a habilitação. Quando recebi a informação que ele tinha sido preso, perguntei o motivo e o policial disse que ele estava devendo. Na quinta eu tentei visitá-lo com o presidente da associação de moradores e um amigo, mas como estava de bermuda não consegui. Não vejo meu filho há dez dias, é uma falta muita grande", disse.

A família de Willian Preciliano Bezerra da Silva faz manifestação na frente do Fórum do Rio, na Praça XV, para denunciar a prisão do jovem - Maíra Coelho / Agência O Dia

Segundo os advogados de defesa, Jairo Escovedo e Vinícius Saldanha, seis policiais militares reconheceram o jovem, no entanto o reconhecimento só aconteceu quatro meses após o caso. Alegaram, ainda, haver conflito nos depoimentos dos policiais. "Um policial falou que o William ameaçou durante todo tempo e estava muito nervoso, enquanto outro disse que ele estava calmo e só queria dar um papo, já outro policial disse que ele estava longe, na quadra, e só vigiou; e um outro disse que ele não participou", disse Jairo Escovedo. "O mais estranho é que desde o fato os policiais estão de licença médica. A decisão da juíza foi publicada ontem no final do expediente, o que prejudicou o nosso trabalho. Na segunda vamos pedir um habeas corpus", completou Vinícius Saldanha.

Jovem estudioso e com boas notas

A diretora do Colégio Estadual Monteiro de Carvalho, onde William se formou em julho, informou que ele tinha 95% de frequência e os próprios professores garantiram o bom desempenho dele. Segundo a irmã de criação, Gerlene Bezerra Silva, de 37 anos, o rapaz sempre participou de projetos sociais, inclusive foi assim que conheceu os diretores do filme e conseguiu fazer a figuração em "Pacified". Dona de uma lanchonete no Méier, ela informou que ele sempre ia ajudar e era maravilhoso. "Nunca teve passagem pela polícia. Isso é uma injustiça. Mais uma vez a justiça comete injustiça", completou.

Pais e irmã de Willian Preciliano Bezerra da Silva seguram fotos do jovem - Maíra Coelho / Agência O Dia

Muito abalada, a mãe de William passou mal assim que soube da notícia e lamentou a ausência do filho. "Eles tiraram meus pés e minhas mãos. Estão tirando meu filho de mim. Tentei visitá-lo, mas não deixaram. Em 21 anos de vida, eu nunca fiquei uma noite sequer sem dormir com ele. Quando ele dormia fora, era na irmã e sempre voltava no dia seguinte. Eu sempre ensinei que ele não deveria entrar em confusão para ter o direito e ir e vir garantido. Eu nunca pensei que iria passar por isso", disse a dona de casa muito abalada.

Jovem passava diariamente em frente a UPP

A defesa de William Preciliano Bezerra da Silva, juntamente com os parantes, fizeram um mapa mostrando a proximidade entre a casa do rapaz e a UPP. Segundo seus defensores, o jovem jogava bola em uma quadra ao lado de onde os PMs ficavam. "As segundas, terças e sábado o William jogava lá na quadra. Pra chegar até o local ele precisava passar pelos militares. Quando acabava as partidas, ele ainda ficava no local conversando. Se ele era acusado de ser um dos envolvidos, por que eles esperaram cinco meses para prendê-lo? Por que não o detiveram no momento em que ele passava por ali? Por que ele só foi preso cinco meses depois?", questionou o advogado Vinícius Saldanha.

Abaixo assinado

Após ser preso, moradores da comunidade do Prazeres e de pelo menos oito comunidade do Rio se uniram e fizeram um abaixo assinado dizendo que conhecem William e sua índole. De acordo com os pais do rapaz, hoje existe uma mobilização na comunidade para a liberação do rapaz. Até agora mais de mil pessoas assinaram a petição pedindo que a Justiça do Rio reconsidere e o liberte. "Idosos que moram no alto dos Prazeres descerem e assinaram dizendo conhecer o meu filho. Muitos amigos do futebol, da igreja e de vários comércios — que conhecem o meu filho — estão mobilizados e estão dispostos a deporem para falar sobre a índole dele", contou o pai do rapaz.

Além do abaixo assinado, uma declaração da produtora do filme "Pacified", produzido pelo diretor norte-americano Paxton Winters e produzido pela empresa Reagent Media, enviaram uma declaração sobre a participação do rapaz no filme. No documento, que foi anexado ao processo que tramita na 5ª Vara Criminal do Rio, os produtores Paula Duarte Linhares e Marcos Jardim Tellechea disseram que William não tem qualquer envolvimento com o crime e se dizem indignados com sua prisão.

"Trata-se de um verdadeiro absurdo as notícias que recebemos acerca da prisão de Willian Preciliano Bezerra da Silva. Como produtores de cinema tivemos a felicidade e a honra de conhecer jovem tão cioso, talentoso, honesto e decente nos meses em que ele atuou em filme de nossa produção, especificamente PACIFIED. Ele destoava de muitos jovens que conhecemos naquele período, pois não tinha sito violentado pela pobreza e descaso do estado, sendo estas minhas afirmações claras e objetivas no sentido de que Willian não estava entregue ou coadunava com a triste realidade do tráfico de drogas e o embate deste último com o Poder Público. Pelo contrário. Trata-se de um jovem estudioso, interessado, com família estruturada, sem qualquer risco de violência em suas características pessoais. Em resumo: aos que o conhecem — e sei que a comunidade de bem está revoltada com sua prisão — é verdadeiro escárnio a acusação que contra ele recai", diz o documento.

O ataque à UPP Prazeres

O ataque à UPP dos Prazeres e contra sete PMs da base ocorreu em 20 de novembro. Um bando de criminosos renderam quatro dos PMs em uma quadra da comunidade, há 50 metros da base da UPP. Os policiais foram levados para um local onde outros policiais já estavam rendidos por outros criminosos. Eles sofreram tortura psicológica durante uma hora e foram liberados em seguida. No depoimento, o policial afirmou que ele e mais seis agentes foram levados até uma quadra na comunidade, e tiveram suas armas roubadas. Segundo o depoimento desse PM, os suspeitos, então, teriam pedido que os policiais deixassem a localidade conhecida como "Doce Mel", além do fim do patrulhamento em um local conhecido como o "Beco do Agnaldo".

*Estagiária, com supervisão de Adriano Araujo

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