Irmã Elizabeth Alves dedicou sua vida a projetos sociais, sobretudo os voltados a crianças carentes e em situação de risco no Sul do estadoDivulgação
Por FRANCISCO EDSON ALVES
Publicado 28/03/2019 12:15 | Atualizado 28/03/2019 13:39

Rio - Ícone na luta e engajamento em projetos sociais, sobretudo os voltados para crianças e adolescentes carentes e em situações de risco no Sul Fluminense, a irmã de caridade Elizabeth Alves morreu nesta madrugada, aos 80 anos, no Hospital da Unimed de Volta Redonda. Ela estava internada desde sábado, quando sofreu um infarto, em Arrozal, distrito de Piraí. O corpo será velado a  partir de 15h30, na Capela Mortuária, no Aterrado, em Volta Redonda, e em seguida, em Arrozal. A previsão de chegada à igreja São João Batista é 16h30. A Missa de corpo presente será celebrada às 7h desta sexta-feira, e o sepultamento, às 8h, no Cemitério de Arrozal.

A freira começou a se dedicar a trabalhos sociais sociais no final da década de 1960, no bairro São Geraldo, quando chegou a Volta Redonda, a convite do então bispo da Diocesde de Barra do Piraí-Volta Redonda, Dom Waldyr Calheiros, para coordenar a Pastoral Rural de Quatis. Mas foi a partir de 1993 que seu empenho ganhou ainda mais destaque. Naquele ano, em companhia de sua irmã, Terezinha, foi encarregada de dar atenção a Piraí, que constava entre as 30 cidades com as maiores taxas de morte materna e infantil do País. Em três anos, transformou o município em referência nacional no combate à morte de crianças por desnutrição.  Na época, criou a estrutura da Pastoral da Criança, que se estendeu por outros 12 municípios da região.

Através da Cooperativa de Produção Alternativa (COOP-PROALT), que fica na Fundação Beatriz Gama, no bairro Retiro, em Volta Redonda, ela coordenava a produção da "poderosa multimistura (feita a base de farelo de trigo, fubá de milho, pó da folha da mandioca, sementes de gergelim e sem agrotóxicos), que, segundo cálculos da instituição, há 19 anos já teria ajudado a salvar mais de 15 mil crianças desnutridas nos 12 municípios que atua. A produção da multimistura é de 10 toneladas por mês, em média. 

Três anos mais tarde, em 1996, fundou a Casa da Criança e do Adolescente, em apoio aos trabalhos da Pastoral da Criança, criada por Zilda Arns (médica pediatra e sanitarista brasileira, irmã de Dom Paulo Evaristo Arns, fundadora e coordenadora internacional da Pastoral da Criança e da Pastoral da Pessoa Idosa, e que morreu em 2010). A casa passou a desenvolver diversos projetos, entre eles o Curumim e  o Cuidar, voltados para menores em risco social, especialmente vítimas de violência doméstica.

 “Temos um orgulho muito grande, pois nunca perdemos uma criança do Curumim para a marginalidade”, costumava comentar, Elizabeth. Outro orgulho da ativista social era o Casarão Cultural de Arrozal, que ela coordenou, atendendo pelo menos 10 mil pessoas ao ano. Também se dedicou à uma rádio comunitária, oficinas de artesanato e de jongo, dança e ao Museu do Negro. 

 Atendendo crianças de 0 a 6 anos, através da Pastoral da Criança, Elizabeth conseguiu estender o acompanhamento às famílias desamparadas até que meninos e meninas, vítimas de todo tipo de violência, completassem 18 anos de idade. "Conseguimos transformar menores que antes tinham tudo para seguir no tráfico de drogas, em tocadores de violino, por exemplo. Só com atenção e amor", afirmava em suas palestras.

Métodos naturais que alcançaram  98% de êxito para evitar gravidez ganharam fama, assim com atividades do Curumim, que atende crianças especiais ou em risco social, com pai e mãe encarcerados. A Ong de Elizabeth também ampara crianças internadas em hospitais. Já no No Viva Paz, outro projeto, famnílias são trabalhadas para a prevenção da violência.

No Cuidar, psicólogos, psicopedagogos e fonoaudiólogos tratam crianças violentadas . Até uma cooperativa de trabalho e produção gera renda e combate a desnutrição de crianças e gestantes. Há ainda parceria com serviços sociais da indústria e comércio para profissionalizar os adolescentes. A Casa da Criança chegou a ter mais de 250 voluntários, entre médicos, professores, pintores, encanadores, pedreiros, entre outros.

Elizabeth Alves nasceu em Vitória, no Espírito Santo. Entrou para o convento aos 17 anos e estudou teologia na Universidade Santa Úrsula, no Rio de Janeiro. Em nota, a Diocese de Barra do Piraí-Volta Redonda, lamentou a morte de Eluzabeth: "A diocese torna público todo o seu agradecimento pelo trabalho incansável da irmã Elizabeth que sempre demonstrou explicitamente sua preferência pelos pequenos, pobres e perseguidos, seguindo assim os ensinamentos do próprio Jesus", afirmou, no texto, o bispo dom Francisco Biasin. 

"O dia que irmã Elizabeth barrou militares do BIB"

Amigo de longa data de irmã Elizabeth, José Maria da Silva, o Zezinho, coordenador do Movimento pela Ética na Política (MEP-VR), lembra de um episódio marcante, envolvendo a religiosa. "Era início da década de 1970. Ainda na juventude, ela e sua irmã, Terezinha, impediram que oficiais do Exército, do então 1° Batalhão de Infantaria Blindada do Exército (1° BIB), de Barra Mansa, invadissem o Bispado, em Volta Redonda, à procura de supostos subversivos, como eram classificadas as pessoas que se opunham ao Regime. Elas seguiram as recomendações de dom Waldyr Calheiros, que na época, acobertava e dava apoio a trabalhadores perseguidos pela ditadura militar, abrigando-os no Bispado e promovendo a ida deles para esconderijos no Rio de Janeiro. A atitude corajosa de Elizabeth e Terezinha foi exaltada no meio católico e entre os trabalhadores daquela época", lembra Zezinho, que atuou com ela em várias frentes de defesa dos cidadãos.

"Irmã Elizabete se compara a Zilda Arns e a madre Tereza de Calcutá, na defesa dos pobres e crianças, na defesa da vida. Na região sul fluminense transformou assistência social em políticas públicas para crianças e adolescentes, sobretudo. Estará eternamente viva em nossos corações", resumiu Zezinho.

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