Publicado 09/05/2019 03:00 | Atualizado 09/05/2019 08:52
Rio - Criou muita polêmica ontem a apresentação de um projeto de lei (PL) na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) cujo teor é o fim da reserva de vagas para negros, pardos e indígenas em universidades pública estaduais fluminenses. O autor da proposta é um deputado que se diz “100% conservador” e, no ano passado, já tinha mexido num vespeiro de grandes proporções.
Durante a campanha eleitoral de 2018, Rodrigo Amorim (PSL) quebrou uma placa com o nome da vereadora Marielle Franco (Psol), assassinada em março daquele ano. O projeto não acaba, no entanto, com as cotas em outras hipóteses, como para filhos de policiais militares.
A proposta ainda vai ser analisada pela Alerj e pode ser aprovada ou não. O trâmite normalmente é demorado. O próximo passo será passar por emendas nas comissões e no plenário da Casa. Apesar disso, manifestações contrárias ao projeto de lei já estão sendo organizadas para o próximo dia 13, data que marca a Abolição da Escravatura.
“Estamos organizando um ato com todos os cotistas à frente da Alerj. Além disso, estamos solicitando audiência com o governador, o procurador-geral do Estado e o presidente da Alerj”, disse Frei David, coordenador da ONG Educafro, principal órgão incentivador da política de cotas.
Amorim — que é advogado e foi o deputado mais votado em 2018 com 140.666 votos (1,83% do total) — justificou-se: “A política de cotas em razão da cor tem sido alvo de fraude. A autodeclaração leva, por muitas vezes, um indivíduo caucasiano a se autodeclarar negro. O objetivo é fazer um ajustamento daquilo que pode ser uma importante ferramenta de inclusão social e de livre acesso para uma educação de qualidade”, disse ao jornal O DIA.
Se virar lei, o projeto não vai alterar, no entanto, a reserva em universidades estaduais (como Uerj e Uezo) para alunos da rede pública, deficientes físicos e filhos de agentes de segurança, caso de PMs, policiais civis e bombeiros. Estudantes que já ingressaram no ensino superior por meio do sistema de cotas também não seriam afetados.
Inscrita em um pré-vestibular comunitário que funciona na Uerj, Natalia Nogueira, de 18 anos, quer cursar Pedagogia na unidade. Inspirada na irmã, que ingressou numa universidade pública por meio da cota racial, a jovem acredita que o programa seja capaz de proporcionar chances no mercado de trabalho. “Há muitas portas fechadas para nós. Não dão oportunidade a algumas pessoas por serem negras. Por isso, é importante que seja mantida”.
O presidente da Comissão de Educação da Alerj, Flavio Serafini (Psol), disse que vai tentar barrar o projeto. Segundo ele, a comissão vai se reunir em breve para debater o tema com profundidade. “Não podemos menosprezar os números que comprovam o sucesso das cotas”.
Apesar de acreditar que haja fraude no modelo, a estudante Maria Carolina Costa, 24, defende o programa. “Cotas são válidas, mas é preciso avaliar o que está acontecendo. Na minha turma, por exemplo, há fraudadores”.
Cotas desde 2004
No Brasil, o sistema de cotas foi criado em 2004. Foi adotado pela UERJ, primeira universidade do país a criar o modelo em vestibulares para cursos de graduação por meio de uma lei estadual que estabelecia 50% das vagas para alunos egressos de escolas públicas. Depois da UERJ, foi a vez da Universidade de Brasília (UnB) implantar uma política de ações afirmativas em seu vestibular. A instituição foi a primeira no Brasil a utilizar as cotas raciais.
Após 15 anos desde o início do sistema de cotas, o percentual de negros que concluíram a graduação passou de 2,2%, em 2000, para 9,3% em 2017. Apesar disso, os negros ainda não alcançaram o índice de brancos diplomados. Entre a população branca, a proporção atual é de 22% de graduados, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além da Uerj, caso seja aprovado, o projeto de lei vai impactar diretamente na Universidade Estadual da Zona Oeste (UEZO) e na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF).
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