Policiais realizaram uma revista na carga e encontraram mais de cinco toneladas de maconha - Divulgação / PRF
Policiais realizaram uma revista na carga e encontraram mais de cinco toneladas de maconhaDivulgação / PRF
Por Thuany Dossares

Rio - O tráfico de drogas está se sofisticando e já começa a usar artifícios que, até agora, eram comuns apenas entre políticos e empresários presos na Operação Lava Jato: os serviços de doleiros para a compra de mercadorias, movimentações financeiras e lavagem de dinheiro. A Polícia Civil já está investigando o caminho percorrido pelo dinheiro do tráfico até o exterior e a remessa das drogas até as comunidades do Rio.

O Departamento Geral de Combate à Corrupção, ao Crime Organizado e à Lavagem de Dinheiro (DGCOR-LD) está apurando como traficantes fazem para comprar drogas diretamente com seus fornecedores, nos cartéis de Colômbia, Bolívia e Paraguai, sem chamar a atenção do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

Como na Lava Jato

"O traficante tem que pagar determinada quantia na Colômbia, por exemplo, e procura doleiros que façam esse tipo de serviço, já que são eles que possuem uma rede internacional e esquemas de compensação próprios que, nos últimos anos, foram desvendados, inclusive, pela Operação Lava Jato. O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) não vai detectar (a operação), porque, no fim, você não tirou o dinheiro do país", explica o delegado Thiago Neves.

Segundo a especializada, o recurso de doleiros ainda é novidade no tráfico, e a modalidade de lavagem de dinheiro que vem sendo mais usada por traficantes é conhecida como mescla. Essas técnicas são usadas pelas três facções criminosas que atuam no estado: Comando Vermelho (CV), Terceiro Comando Puro (TCP) e Amigo dos Amigos (ADA).

"Muitas vezes, eles usam empresas de fachada que possuem CNPJ, mas que não funcionam. Quando é uma empresa que realmente existe e eles usam aquela conta para passar o dinheiro, isso é uma mescla. Essas contas são de passagem, para despistar a polícia. Usam o nome de terceiros e essas pessoas retiram um percentual, porque ninguém se expõe assim de graça. Mas, na maioria das vezes, não é uma ocultação de capital com o objetivo de lavar e transformar em outra coisa, é o fluxo financeiro para pagar a mercadoria", conta Neves.

O caminho do dinheiro do tráfico também está sendo monitorado pela Delegacia de Combate às Drogas (DCOD). De acordo com informações policiais, os cartéis de Medelín, na Colômbia, e os da Bolívia são os principais fornecedores de cocaína, enquanto a maior parte da maconha vendida e consumida no Rio de Janeiro e em toda a Região Sudeste vem do Paraguai. De acordo com a polícia, o quilo da pasta-base custa cerca de R$ 10 mil, já a maconha vale aproximadamente R$ 3 mil no mercado negro.

Depósitos pequenos

Segundo o delegado Reginaldo Félix, titular da DCOD, o pagamento é feito através de empresas laranjas de diferentes estados. "Os traficantes efetuam esses pagamentos através de Transferência Eletrônica Disponível (TED). Pedem para uma pessoa, usada como mula, ir até uma agência bancária e fazer o depósito em determinada conta de uma empresa ou comércio. Esse depósito pode ser feito em uma única vez ou dividido em outras agências, variando de R$ 3 mil a R$ 60 mil. Fazem vários TEDs até que esse dinheiro chegue às mãos de quem vai tratar diretamente com o representante do cartel no Paraná, Mato Grosso ou Mato Grosso do Sul", explica o delegado. 

Mudanças no acesso ao Coaf atrapalham

Em sete meses de investigações, a Polícia Civil já identificou empresários, comerciantes e fazendeiros no esquema do tráfico  internacional. De acordo com investigadores, os complexos da Maré e do Alemão, na Zona Norte do Rio, e o Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, são as comunidades em que o tráfico mais investe na compra de drogas.

Desde julho, no entanto, a Polícia Civil tem tido dificuldades para averiguar essas transações financeiras ilegais, devido à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que proibiu investigações e processos que usem a base de dados do COAF sem autorização prévia da Justiça.

“A decisão do Supremo foi expressa em suspender os inquéritos policiais que se iniciaram com Relatórios de Inteligência  Financeira (RIF) por dados compartilhados do Coaf. E a maioria dos nossos procedimentos é iniciado e instruído a partir de RIFs. Se não pudermos utilizar esse recurso, ficará muito difícil monitorar a movimentação financeira dos alvos investigados. Não tem como a Policia ou o Ministério Público adivinhar as contas, as pessoas físicas e jurídicas utilizadas em todo este processo de lavagem”, finaliza Thiago Neves.

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