O pai, Paulo Roberto, e o filho, Léo Motta, se conheceram após 38 anos. A revelação da paternidade ao filho ocorreu há duas semanas - Gilvan de Souza / Agencia O Dia
O pai, Paulo Roberto, e o filho, Léo Motta, se conheceram após 38 anos. A revelação da paternidade ao filho ocorreu há duas semanasGilvan de Souza / Agencia O Dia
Por Waleska Borges

Rio - A história do ex-morador de rua Léo Motta, de 38 anos, que transformou sua experiência vivendo nas ruas da cidade no livro 'Há vida depois das marquises', ganhou um novo capítulo, que mais parece cena de novela. Criado em Cordovil, na Zona Norte, Léo — que foi dependente químico por 20 anos — sempre lamentou a ausência da figura paterna. "Nos piores e melhores momentos da minha vida, o homem que achava ser meu pai nunca estava lá". Há pouco tempo, a vida do rapaz teve mais uma reviravolta: ele conheceu o verdadeiro pai que nunca soube da existência.

O encontro de Léo com o pai, Paulo Roberto Carvalho, de 63, ocorreu no fim do mês de outubro. O comerciante, que tem outros cinco filhos, 17 netos e quatro bisnetos, só soube da existência dele em 2015. Segundo Paulo, quando se relacionou com a mãe de Léo, antes do seu atual casamento de 32 anos, ela era noiva. Por isso, escondeu a gravidez dele e da família.

"Ela confidenciou esse segredo a uma ex-namorada que tive, que se tornou sua sogra. Não queria que eu revelasse a verdade". A partir dali, Paulo acompanhou de longe todos os passos do filho. "Soube que ele estava nas drogas, e eu o procurava pelas ruas. Tentei encontrá-lo outras vezes, em vão. Me aproximei dele pelas redes sociais, mas ainda não era o momento de contar a verdade", lembrou Paulo, emocionado.

Léo Motta ganhou uma nova família e foi recebido com carinho pelos irmãos. Família faz planos para o futuro - fotos de Gilvan de Souza

Em setembro, quando Léo lançava o seu livro na Bienal, Paulo estava sentado na plateia. Foi ali que teve o primeiro encontro com o filho, ainda sem revelar a ele a paternidade. "Estava chorando por dentro. Peguei o autógrafo dele e dei uma pista do que estava por vir. Disse que nós dois tínhamos um livro para escrever juntos. Ele disse que tinha outro projeto, mas falei que o nosso livro seria mais importante", contou o comerciante, que vive com a família em Vista Alegre, também na Zona Norte.

Passada a Bienal, Paulo ligou para Léo e o convidou para uma feijoada. Ele foi acompanhado da mulher Cyssa Motta, de 29 anos, sem saber o que esperava. "Quando meus irmãos começaram a chegar, eu percebi como eram parecidos comigo. Então, brinquei que era para ele explicar aquela história. Naquela hora, todos começaram a chorar e me revelaram a verdade".

Léo disse que foi um encontro emocionante: "Sempre soube que faltava alguma parte de mim. Naquela hora, tirei uma foto de nós dois e mandei para minha mãe dizendo que a amava. Ela viu e disse que não tinha mais o que fazer", contou. Léo, que foi criado pela mulher que achava ser sua avó paterna, ainda teve um encontro com o homem que pensava ser o seu pai. "Eu disse que encontrei meu pai, mas ele só me respondeu que me entendesse com minha mãe".

LAÇOS DE FAMÍLIA

Pai também teve história de abandono e vida nas ruas

O comerciante Paulo Roberto, dono de um restaurante em Olaria, se emociona ao saber das histórias vividas por Léo. Ele lamenta saber que o filho foi cuspido no rosto e ganhou um copo de água gelada com sal de um homem para quem disse sentir sede. Com os outros filhos encaminhados na vida, Paulo também teve uma história de abandono e vida sob marquises.

“Aos 14 anos de idade, quando vivia nas ruas, fui adotado. Minha nova família me deu cama, um prato de comida quente e irmãos. Sou muito grato a tudo isso”, recordou-se Paulo. A família do comerciante também recebeu com carinho o irmão. Ao saber do segredo guardado pela mãe de Léo, Paulo o revelou à mulher Helena Carvalho, de 56, e aos filhos. Ele ganhou o apoio de todos para que procurasse o novo membro da casa.

“Foi uma bomba, mas boa. Incentivei meu pai a procurá-lo. Eles foram privados de momentos juntos entre pai e filho. Meu pai e o Léo precisavam se encontrar”, disse Clayton Carvalho, de 31. Para Helena, mulher de Paulo, tudo foi no momento certo: “Foi a hora que Deus preparou para os dois”. Com a nova família, Léo já pensa em recuperar o tempo perdido. “Agora não estou mais sozinho. Tenho uma família grande, uma esposa e a chegada de mais uma filha. Estou muito feliz”. A história de encontro de pai e filho, segundo
Léo, vai resultar em mais um livro de sua autoria: “O título será ‘38 e um Abraço’, que é a minha idade e o abraço que demos”, adiantou.

Solidariedade e prevenção às drogas

A vida sofrida nas ruas sob sol, chuva, revirando os lixos, com fome e, muitas vezes, sob olhares preconceituosos de estranhos, jamais será esquecida por Léo. Por isso, hoje, ele tenta passar sua experiência. Entre as quase 150 palestras que já realizou, desde o início do ano, Léo também conversou com dezenas de jovens carentes de comunidades.

“As palestras são de prevenção ao uso de drogas”, explica Léo. Segundo ele, os jovens se surpreendem com
as suas histórias: “Muitos conhecem o lado destruidor das drogas. Eles ficam surpresos com minha história de superação”. Além das palestras, Léo faz ações de solidariedade. Uma delas vai ocorrer no dia 15 de dezembro entre os atendidos pelo Centro Presente, programa pelo qual iniciou sua história de superação. Léo vai distribuir comida de Natal e produtos de higiene pessoal à população de rua. 

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