Rio - 'Não chora, não, mãe'. Essa foi a frase dita por Ketellen Gomes, de 5 anos, logo após ser baleada a caminho da escola, na tarde de terça-feira, em Realengo, na Zona Oeste. O corpo da pequena, de apenas 20 quilos, não resistiu à hemorragia e seu coração parou na madrugada de ontem. A menina é a sexta criança a ter os sonhos interrompidos, vítima de bala perdida, no Estado do Rio, somente neste ano.
Ontem, a polícia prendeu Thiago Porto, que seria miliciano e suspeito de ter feito o disparo, direcionado a um rival, identificado como Davi do Nascimento, de 17 anos. O adolescente foi baleado ao lado de Ketellen e morreu no local. Os outros dois homens que estavam com Thiago ainda não foram localizados.
Na porta do Instituto Médico Legal de Campo Grande, parentes de Ketellen falaram de como iriam lembrar da menina, que gostava de brincar de boneca, era carinhosa e adorava fazer massagens. "Era a filha mais agarrada comigo, dormia grudada em mim", disse o pai, Augusto Gomes. Ele ainda recordou da última vez que viu a filha. "Dei banho nela, coloquei uma 'xuxinha' no cabelo", lembrou, emocionado. A mãe, devastada, só chorava e não quis dar entrevistas. O enterro será hoje, no cemitério do Murundu, em Realengo, às 14h.
Ketellen foi a terceira vítima de bala perdida em menos de 24 horas. O gari Francisco Paulo da Silva, de 61 anos, que ontem capinava uma rua, foi baleado na cabeça por assaltantes em fuga, em Vicente de Carvalho. Ele tinha 28 anos de profissão. Já uma mulher, de 50, foi ferida na perna, no Jacarezinho, e passa bem.
Carinho de quem passa a mesma dor sem fim
O governador Wilson Witzel afirmou, na terça-feira, que "tiroteios não fazem parte da realidade do Rio de Janeiro", ao anunciar investimentos na área do turismo a empresários do setor. A declaração, contudo, vai de encontro aos números do site Fogo Cruzado. De janeiro a outubro, foram registrados 6.538 tiroteios no estado — média de 21 por dia.
"Eu estava lá com a Helena (primeira-dama do estado) em Lisboa e, de repente, passou um programa na televisão mostrando um tiroteio na favela, que não é a realidade do Rio de Janeiro. É a realidade, infelizmente, de algumas comunidades", argumentou.
Witzel completou que "nas áreas turísticas o índice de criminalidade violenta é praticamente zero. Nós tivemos dois incidentes com turistas. Se você for a Londres ou Nova Iorque e vier ao Rio, os índices de criminalidade dessas cidades são os mesmos".
No Twitter, o Witzel lamentou o caso Ketellen. "Lamento a morte da menina em Realengo, vítima de tiroteio entre bandidos. Determinei à Polícia Civil a apuração rigorosa do crime e dos outros que atingiram seis crianças neste ano".