Rio de Janeiro 10/01/2019 - Bares centenários da cidade do Rio de Janeiro. Na foto acima Bar Brasil  Adauto Sebastião. Foto: Luciano Belford/Agência O Dia - Luciano Belford/Agência O Dia
Rio de Janeiro 10/01/2019 - Bares centenários da cidade do Rio de Janeiro. Na foto acima Bar Brasil Adauto Sebastião. Foto: Luciano Belford/Agência O DiaLuciano Belford/Agência O Dia
Por Yuri Eiras

Rio - João do Rio, escritor do início do século XX, era frequentador do Bar Luiz. O sambista Geraldo Pereira, diz a lenda, morreu depois de trocar socos com Madame Satã na porta do antigo Capela, na Lapa. Vinícius de Moraes era um bebedor de marcar os cotovelos do balcão. Os botequins são parte da memória afetiva do Rio e, muito deles, centenários, resistem bravamente aos destemperos da crise, da violência e da concorrência dos restaurantes modernos.

Estabelecimentos como o Bar Luiz, na Rua da Carioca, que comemora hoje 133 anos com roda de choro, são verdadeiros museus informais. "Quando estou num bar como o Luiz, ou o Bar Brasil, a sensação que eu tenho é que estou contribuindo para que a história da cidade se mantenha viva", comenta Gabriel da Muda, cantor, compositor e bebedor. "O que me encanta mais é estar num Rio despretensioso. A internet deu muita voz a essa turma que quer tudo perfeito. Esses bares são muito desconectados disso. Eles têm o tempo deles", conclui Gabriel.

A clientela do Armazém São Thiago, em Santa Teresa, ainda é parecida com a de antigamente. "Resistimos pela tradição. Ainda temos aquele freguês que vem do trabalho, bebe uma, conta uma história furada e vai para casa", explica Ricardo Pose Garcia, terceira geração de proprietários — a casa começou com o avô, um espanhol. Não é diferente no Bar Brasil, de 1907, onde Gustavo Marins resiste, apesar da concorrência dos depósitos e camelôs da Lapa. "Muitos funcionários perto da aposentadoria trazem os mais novos aqui e, aí, o hábito vai se mantendo", conta.

Rio de Janeiro 10/01/2019 - Bares centenários da cidade do Rio de Janeiro. Na foto acima o Bar do Gomes Ricardo Pose e Carlos Fionda. Foto: Luciano Belford/Agencia O Dia - Luciano Belford/Agência O Dia

Bebedor desde antes de ser dono da Casa Porto, no Largo da Prainha, de 2013, Raphael Vidal garante que a tradição do botequim carioca é referência para o seu espaço. "São todos feitos da história do nosso povo. De quem serve e de quem é servido. Quando pensei em criar uma birosca para viver foi nisso que me inspirei: a moela milanesa daqui deveria ser feita de memória popular. Sigo a tradição". 

Paulo Thiago, jornalista e coautor, com Zé Octávio Sabedelhe, do livro 'Memória afetiva do botequim carioca', garante que beber em locais tradicionais da cidade é um ato de resistência. "Certamente um ato político, no sentido amplo do termo, como quem luta pela preservação da memória cultural da cidade, pois a boemia é um dos elementos que dão identidade a uma cidade".

"Os bares centenários contam a história da cidade. Você saber que ali bebeu um Noel Rosa ou que a Madame Satã frequentava tal estabelecimento, ou que o filé à Oswaldo Aranha foi inventado no Cosmopolita, na Lapa, é um elemento que vai além do trivial. Tem um sabor afetivo".

Clientela paga até boleto para manter bar aberto no Centro

Rio de Janeiro 10/01/2019 - Bares centenários da cidade do Rio de Janeiro. Na foto acima o Bar Joia Dona Alayde. Foto: Luciano Belford/Agencia O Dia - Luciano Belford/Agência O Dia

Quem passa pela fachada humilde do Bar do Joia, na esquina da Rua da Conceição, no Centro, não faz ideia de quanta história se passou por ali desde 1909. O estabelecimento ficou nas mãos de Dona Alayde depois da morte do marido, o Seu Joia, em 2007. De lá para cá, os fregueses fazem de tudo para ajudar. “São os amigos que levam o bar à frente. Nos reunimos semanalmente, calculamos contas, pagamos boletos. Reformamos há alguns anos e fizemos uma vaquinha para ajudar”, conta Márcio Pedreira, um dos que fazem parte da diretoria de clientes fieis do centenário bar, decorado com pôsteres do Botafogo e mulheres nuas. “Isso era coisa do Joia, mas nunca me importei”, garante Dona Alayde.

Roda de samba para segurar a freguesia

Rio de Janeiro 10/01/2019 - Bares centenários da cidade do Rio de Janeiro. Na foto acima Fernando Pires. Foto: Luciano Belford/Agencia O Dia - Luciano Belford/Agência O Dia

Aberto desde 1907, o Armazém do Senado, no Centro, precisou se virar ao longo dos anos. Continua mercearia — compra-se de isqueiro a quilo de feijão —, mas ganhou cara de bar. Às sextas-feiras, uma roda de samba anima a esquina e traz a clientela. A estética, porém, continua a mesma. O balcão de mármore é
original e ainda mantém as marcas de faca. “Herdamos do meu pai, um português. Todos os outros donos também eram portugueses. Por ter jeitão antigo, a gente recebe muita gente curiosa. Centenas de vezes fomos cenário de novela de época”, conta Fernando Pires, que toca o Armazém à frente com o irmão Henrique. 

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