Ely Arêas, 42 anos, levou 12 facadas, em Nova Iguaçu. O acusado é o ex-marido, de quem ela havia se separado por causa da violência
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Ely Arêas, 42 anos, levou 12 facadas, em Nova Iguaçu. O acusado é o ex-marido, de quem ela havia se separado por causa da violência Reprodução
Por Raquel Siston*

Um relatório da Defensoria Pública do Rio escancara uma realidade que boa parte da sociedade ainda evita reconhecer. Uma análise de 107 processos de tentativa de feminicídio ou feminicídio consumado apontou que, das 116 vítimas que listam a pesquisa, 89% delas são ou eram mães de crianças e adolescentes com idades entre 2 meses e 17 anos. Dos perfis analisados, de mulheres com idades entre 21 e 40 anos, 45 delas têm filhos, 10 não possuem e 61 não informaram. Além disso, 40% das vítimas eram casadas ou viviam em união estável, e 42% delas tiveram uma relação anterior com os acusados.

Quase todas as vítimas foram submetidas a episódios anteriores de violência doméstica. As agressões ocorrem em momentos e locais em que elas se encontram mais vulneráveis. Segundo o estudo, aproximadamente 73% dos crimes ocorreram em período de descanso, e a incidência é a mesma para os casos registrados na residência da vítima, ainda que ela não morasse com o agressor.

O estudo mostrou, ainda, que dos autores dos crimes, 40% têm idades entre 31 e 40 anos e, em 44% dos atos, são utilizadas facas e 17%, armas de fogo. Também segundo o relatório, uma em cada três agressões é atribuída à dificuldade em aceitar o fim do relacionamento. Outros motivos são ciúmes, discussões, vingança - inclusive por prestar queixa de crime anterior - gravidez e recusa da mulher em ter relação sexual.

"A pesquisa revela que, em 55% dos casos analisados, há relato de violência doméstica anterior. No entanto, as vítimas deixaram de formalizar o registro em razão de medo ou coação praticada pelo réu", explica a coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher, Flavia Nascimento.

A pesquisa mostra também que a maioria dos crimes - 75 deles - aconteceu na capital fluminense, e que as zonas Oeste e Norte têm o maior número de registros, representando 60% e 29% dos casos, respectivamente. O registro de ocorrências na Região Central é de 7%, e 4% na Zona Sul. O tempo de relacionamento do casal não é fator determinante para a violência, segundo os dados, que analisaram que algumas relações tinham apenas um mês antes do crime; já outras, décadas de duração.

O tempo entre o fim do relacionamento e o ataque pode ser de 24 horas a 18 meses. Ainda que a Lei do Feminicídio tenha qualificado a prática do homicídio quando a vítima é mulher e os motivos do crime tenham relação com essa condição, em alguns processos as denúncias não consideram a tipificação.

Rotina de medo: mulher leva 12 facadas

“Os números mostram que, passados quase cinco anos da Lei (do Feminicídio), muitos casos ainda são denunciados como homicídio. Trazer à luz um levantamento como esse (da Defensoria Pública)é um passo importante para combater a violência de gênero, em especial no ambiente doméstico”, afirma Flavia Nascimento, coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria.

Um caso recente, que infelizmente ilustra bem o raio-x traçado pela pesquisa, foi o de Ely Arêas, 42 anos. Moradoras de Nova Iguaçu,na Baixada Fluminense, ele levou 12 facadas, quando estava sozinha em casa, no bairro Jardim Nova Era, no último sábado, 29 de fevereiro.

A família de Ely acusa o ex-marido da vítima, Pedro Silva, com quem a vítima tem duas filhas e estava separada após 22 anos de casamento. De acordo com a prefeitura da cidade, Ely está internada no Hospital Geral de Nova Iguaçu e seu quadro de saúde é considerado grave.

Segundo parentes de Ely, o comportamento violento do ex-marido é que a teria levado a decidir pela separação.Ainda de acordo com parentes da mulher, após cometer o crime, Pedro Silva teria ligado para o irmão de Ely, dizendo quea havia matado.

Ela resistiu, mas as marcas da violência brutal ficaram porto do o rosto, além de perfurações no pescoço, nos pulmões, tórax e nas costas.

O suspeito está foragido. Procurada, a Polícia Civil ainda não se manifestou sobre o caso.


Lugar de mulher é com a mão na massa
Alunas do curso Mulheres à Obra: aprendizado traz empoderamento, confiança e autoestima
Alunas do curso Mulheres à Obra: aprendizado traz empoderamento, confiança e autoestimafotos Divulgação
Se o ditado diz que lugar de mulher é onde ela quiser, por que não com a mão na massa? Há 3 anos, o curso “Mulheres à Obra”, que chega a sua 7ª edição neste Dia Internacional da Mulher, capacitou mais de mil mulheres a usar ferramentas elétricas e solucionar reparos domésticos. As aulas, teóricas e práticas, ajudaram diversas mulheres a encontrarem uma nova profissão ou hobby e derrubaram barreiras de preconceito.

De acordo com Isabel Gomes, diretora de marketing da Palácio Ferramentas, loja de materiais de construção que ministra o curso, o principal objetivo do projeto é proporcionar a independência das mulheres. “Além das questões de empoderamento feminino, ninguém gosta de ficar dependente de outra pessoa. A gente conseguiu dar mais conhecimento, encorajar e fazer com que nossas alunas perdessem o medo de certos reparos domésticos”, explicou a diretora.

Nos últimos dois anos, a artesã Léa Salles conseguiu conquistar uma grande lista de clientes para fazer serviços que aprendeu. Mas, ela conta que a maior satisfação foi surpreender os familiares com uma simples instalação de chuveiro, que precisaria da contratação de um profissional da área. “Meu genro disse que havia comprado um chuveiro novo e estava esperando o profissional para instalar. Na mesma hora eu falei: deixa que eu faço! Surpreendi todo mundo que estava lá, me senti a 'top' na instalação", brincou a artesã.

O curso foi também um marco para a instrutora Emanuela Fidélis, que começou a lecionar na demonstração para clientes, mas sentiu que podia ir além. Hoje, ela vê a diferença que os ensinamentos fizeram na vida de suas alunas. “O impacto alcançado foi muito além das minhas expectativas, mais de mil mulheres tem autonomia para solucionar reparos domésticos. Eu não consigo mensurar a gratidão de ser a instrutora técnica desse projeto", afirmou a instrutora.

Aos 26 anos, Ellena Stellet se define como cenógrafa, fotógrafa e pedreira nas horas vagas e pretende acrescentar mais uma profissão nesse currículo: youtuber. Com o conhecimento que adquiriu no projeto, passou a divulgar suas façanhas no Instagram e o próximo passo é seguir para plataforma de vídeos. A jovem relata que entendeu a importância do curso quando precisou construir uma peça de cenário, antes feita por um marceneiro. “Quando o meu chefe chegou, o material estava pronto. Os meninos do setor nem acreditaram que fui eu quem fiz. Depois daquilo, eu me senti muito mais capaz. Eu entendi que conhecimento é empoderamento também.”

As novas habilidades foram como um recomeço para a administradora Patrícia Braga, 53, que enfrentava uma depressão por não conseguir recolocação no mercado de trabalho. "Foi uma distração, é uma motivação encontrar as meninas. Não tem mistério mulher mexer com máquinas e fazer o serviço que essa sociedade diz que é masculina", sentencia.

De 10h às 14h dos sábados entre o 7 e 28 de março, o curso oferece aulas de ferramentas elétricas, impermeabilização e tintas. A taxa de inscrição é R$100 e parte do investimento é revertido em crédito para compras a partir de R$200. As turmas aceitam até 40 alunas cada e aulas acontecem na Rua Camerino, nº 130, no Centro do Rio. As inscrições devem ser feitas no site da loja e o telefone para outras informações é (21) 2103-7373.
Elas conquistam espaço no universo masculino
A mecânica de motores aeronáuticos Priscila Menezes, de 26 anos, conta que precisou de tempo para conquistar seu espaço na profissão. Aos 18 anos, quando ainda cursava Biomedicina, decidida a conquistar sua independência financeira, se tornou Jovem Aprendiz na oficina de revisão de motores aeronáuticos GE Celma. Filha do dono de uma ferramentaria, ela decidiu investir na carreira e hoje faz uma graduação em Engenharia Mecânica.

"Há oito anos não era tão natural quanto é hoje em dia. Lembro de duas ou três mulheres trabalhando como mecânicas. Atualmente, porém, há muitas mulheres conquistando espaços antes inimagináveis', comemora Priscila.

Para a diretora de Recursos Humanos da GE Celma, Jaqueline Tibau, é importante que homens e mulheres tenham as mesmas oportunidades no mercado. "As empresas devem garantir a equidade nas entrevistas. Fazemos campanhas para estimular a inscrição de mão de obra feminina, dos mais técnicos até os cargos gerenciais", explica.
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