Projeto Marmitinhas do Amor criado pelo empresário Bruno Domingos, em Brasília, distribuindo comida para moradores de rua em Brasília - Arquivo Pessoal
Projeto Marmitinhas do Amor criado pelo empresário Bruno Domingos, em Brasília, distribuindo comida para moradores de rua em BrasíliaArquivo Pessoal
Por ANA CARLA GOMES
Bruno Domingos conhece bem o cenário de guerra e de muito sofrimento. Como fotógrafo, ele cobriu a guerra do gás na Bolívia, em 2007, a do Afeganistão, em 2009,o terremoto no Haiti, em 2010, e retratou inúmeras vezes pelas suas lentes o triste dia a dia da violência no Rio de Janeiro. Mas Bruno garante que nada disso o deixou indiferente à dor do próximo. Em Brasília, o agora empresário,de 42 anos, resolveu entrar na luta para ajudar quem não tem nada. Cursando gastronomia desde o ano passado, ele criou o projeto Marmitinhas do Amor,preparando e entregando comida para moradores de rua. Uma iniciativa que ganhou ainda mais força durante a pandemia do novo coronavírus.
“Tudo começou em outubro do ano passado. Estava matriculado num curso de gastronomia e estava preparando em casa um prato que se chama boeuf bourguignon, um ensopado de carne.Quando comecei, vi um senhor catando latinha na porta da minha casa. Esse prato demora quatro horas para ficar pronto. E, quando terminei, o senhor ainda estava lá. Aquilo mexeu comigo demais e fui lá dar a comida para ele.Falei que era pouco e ele respondeu:'‘Meu filho, para quem não tem nada, o pouco é muito’”, lembra Bruno.
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Assim surgiu o projeto batizado como Marmitinhas do Amor. Nos primeiros pratos, Bruno preparou estrogonofe e frango xadrez. “Eu não entrego nada que eu não fosse comer. Tento fazer tudo com a melhor qualidade possível. É tirar a pessoa da invisibilidade e fazer com que ela seja visível”, diz o empresário. A partir dali, ganhou a ajuda de uma amiga, que tinha uma cozinha maior e a quantidade das marmitas só foi crescendo.Nesta pandemia, Bruno conta que manteve a iniciativa graças à ajuda de muita gente em Brasília. Atualmente,sete chefs se revezam com o empresário na preparação da comida. E os alimentos são arrecadados com a doação de amigos e empresários locais. Em 36 dias durante a pandemia, foram produzidas 2.524 marmitas.
Apesar de suas lentes terem captado as cenas mais dramáticas e dolorosas mundo afora como fotógrafo, Bruno garante não ter perdido a sensibilidade.“Estive no Afeganistão, no Haiti, na Bolívia, além de fotografar a realidade do Rio. As pessoas julgam que, como você trabalha com isso, está acostumado.Mas imagina você estar na porta de um IML e ouvir uma mãe, que teve o filho morto, falando: ‘Pelo menos agora eu sei onde ele está’. Aquilo vai te machucando”, conta.
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Num momento em que a pandemia do coronavírus trouxe muitas incertezas sobre o futuro, Bruno diz que, desde que ficou viúvo há três anos, passou a valorizar ainda mais o fato de estar comas pessoas que gosta. “A minha vida é diária, não faço planos a longo prazo.Quando você beija uma pessoa, no rosto mesmo, cumprimentando, você não sabe se terá outra oportunidade depois de encontrar esse alguém. Temos que viver tudo intensamente”.