Publicado 03/01/2021 06:00
O ano nem tinha acabado e os servidores da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) deram de cara com a "má nova": a estatal publicou uma resolução (366/2020) determinando a transferência de 540 funcionários da Administração Central do Rio de Janeiro para a nova sede em Brasília e resoluções que fatiam a companhia para facilitar sua privatização. Nessa resolução, que o jornal O DIA teve acesso vem uma carta de demissão consensual para os funcionários que não concordam com a mudança para Brasília assinarem. "Tenho mais de 30 anos de empresa, construí minha vida no Rio de Janeiro, tudo meu está aqui. Mudar para a capital nessa altura seria desestruturar minha vida", conta uma servidora que teve seu nome listado para a transferência.
O convite à demissão, que abocanha metade dos direitos dos trabalhadores, como o saque do FGTS, embora esteja previsto na Reforma Trabalhista, deixa claro que é consensual. Ou seja, o funcionário não é obrigado assinar. "Uma das alterações da Reforma Trabalhista, a demissão por mútuo acordo, está prevista na lei. Mas o trabalhador não é obrigado a assinar. Ele pode não assinar e ser dispensado sem justa causa, o que é mais vantajoso", orienta o advogado Sérgio Batalha.
Para Cristina Mont'Mor, diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Empresa Ferroviária do Rio de Janeiro, a medida é puramente política e uma crueldade com os funcionários. A transferência além de ser arbitrária, é inconsequente, ainda mais em um momento de pandemia, onde os números estão alarmantes no Rio de Janeiro, fazer com que 540 funcionários e seus familiares mudem para Brasília para atender um capricho de uma diretoria que nesse momento quer ir para o DF para fortalecer seu contato político. Isso não é nenhuma questão de transporte ou de melhoria para a empresa. Isso tem que ficar muito claro", adverte Cristina. Atualmente a CBTU tem 4 mil funcionários, soma mais de 10 mortos por covid-19 e passou por vários surtos de contágio, o último na manutenção da unidade Belo Horizonte, em Minas Gerais.
"A transferência que está sendo feita não é para melhoria da empresa, muito pelo contrário, é para deixá-la perto do poder para eles poderem fazer articulações políticas, como é em toda diretoria", alerta a sindicalista.
Sobre o pagamento de 20% do FGTS na demissão, Cristina alerta que é inadmissível. "O acordo só existe quando o empregado pede por algum motivo. nessa situação não é o empregado que está pedindo. Por ele não poder ir, levantamento mostra que mais de 50% dos funcionários da CBTU tem mais de 60 anos. Então não é porque ele não quer ir, ele tem sua vida toda estruturada o Rio, tem médico, casa, filhos em escola. Isso não existe! Nós derrubamos essa medida em qualquer esfera judicial" conta Cristina.
"Com certeza sabemos que há um movimento político por trás dessa transferência desumana nesse momento de Pandemia a nível Nacional", diz Ary Ari da Silva Vera Cruz, funcionário da gerência de apoio administrativo da companhia. "Uma comissão estará na segunda-feira na empresa para discutir essas transferências", complementa.
Em comunicado, sindicatos chamam para plantão permanente em defesa da CBTU. "Informamos que a partir da próxima segunda-feira, dia 04/01 os Sindicatos da Central e Leopoldina, estarão em plantão permanente no prédio da RFFSA/CBTU, em local ainda a ser definido no horário das 9h até 16h, com objetivo de esclarecer as medidas que estão sendo encaminhadas pelos Sindicatos, bem como apoiar todos os empregados." O prédio da RFFSA fica na Praça Procópio Ferreira 86, Centro (Central do Brasil).
Abandono de emprego
Na resolução que O DIA teve acesso, os pontos 14 a 16 dão como única alternativa aos funcionários o pedido de demissão consensual, abrindo mão de metade de seus direitos. Caso não se apresentem em Brasília no dia 01 de março de 2021, serão demitidos por justa causa, por “abandono de emprego”.
“14. Aqueles empregados que não desejarem se mudar para a nova praça de lotação em Brasília, terão a opção de solicitar, dentro dos prazos definidos em Cronograma (Anexo 1), através do email mudanca.bsb@cbtu.gov.br, a formalização de acordo de demissão consensual (na forma do Art. 484-A da CLT, fazendo jus a 50% do aviso prévio, 50% da multa sobre o saldo do FGTS e à integralidade das demais verbas trabalhistas) (Formulário de Demissão Consensual – Anexo 4).
16. Os empregados que não formalizarem acordo de demissão consensual e não se apresentarem para o trabalho em Brasília dentro da data limite definida no Cronograma (Anexo 1) terão o ponto cortado e, após 30 dias, responderão a Processo Administrativo Disciplinar Sumário (PS) com vistas à demissão por justa causa em razão do abandono de emprego, com o desconto de eventuais valores creditados ou pagos a título de ajuda de custo, passagens áreas e custo de mudança.”
16. Os empregados que não formalizarem acordo de demissão consensual e não se apresentarem para o trabalho em Brasília dentro da data limite definida no Cronograma (Anexo 1) terão o ponto cortado e, após 30 dias, responderão a Processo Administrativo Disciplinar Sumário (PS) com vistas à demissão por justa causa em razão do abandono de emprego, com o desconto de eventuais valores creditados ou pagos a título de ajuda de custo, passagens áreas e custo de mudança.”
Os pontos da resolução foram criticados por Cristina, que promete entrar na Justiça para barrar as transferências. "Isso é assédio moral", diz Cristina.
O DIA tentou contato com a CBTU, mas o horário de atendimento da assessoria de imprensa - conforme o site - é de segunda a sexta-feira, de 8 às 17h30.
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