Publicado 03/01/2021 16:46 | Atualizado 03/01/2021 18:23
Rio - A investigação sobre suposto esquema de desvio de salários de funcionários da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), a chamada rachadinha, deve avançar, neste ano, sobre a suspeita de lavagem de dinheiro por meio da loja de chocolates mantida pelo senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Nos bastidores já há quem diga que o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) também poderá entrar no foco do Ministério Público do Rio (MP-RJ).
No início de novembro, o MP-RJ denunciou Flávio, sua mulher, Queiroz e outros 14 ex-assessores do gabinete do filho do presidente Jair Bolsonaro. A denúncia de 290 páginas aguarda análise do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ).
No início de novembro, o MP-RJ denunciou Flávio, sua mulher, Queiroz e outros 14 ex-assessores do gabinete do filho do presidente Jair Bolsonaro. A denúncia de 290 páginas aguarda análise do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ).
A intensificação das investigações no ano passado levou à prisão, em junho, do ex-motorista Fabrício Queiroz, escondido em Atibaia, em propriedade de Frederick Wassef, advogado da família do presidente Jair Bolsonaro.
Queiroz é apontado como operador do suposto esquema que teria sangrado os cofres da Assembleia Legislativa do Rio por mais de dez anos. Ficaram de fora da peça ajuizada pelos promotores pontos-chave da investigação. Um deles é o suposto uso de uma loja de chocolates na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, para lavar dinheiro. O ex-deputado e um sócio, suspeitam os investigadores, praticariam fraudes em uma franquia da Kopenhagen. Usariam a contabilidade do negócio para "esquentar" dinheiro supostamente desviado dos salários de funcionários nomeados por Flávio. Eles não trabalhariam e repassariam parte dos vencimentos a Queiroz. A defesa de Flávio sempre negou as acusações.
"Além dos componentes e estrutura ora descritos (na denúncia), ressalva-se a continuidade das investigações para apurar outros possíveis integrantes e/ou núcleos da organização criminosa, em especial a possibilidade da existência de eventual núcleo financeiro destinado, precipuamente, a lavar dinheiro por intermédio de ‘laranjas’ e empresas como a Bolsotini Chocolates e Café Ltda", assinala o MP na peça enviada ao Órgão Especial do TJ-RJ.
Outro núcleo citado ao longo das apurações e que ficou de fora da denúncia está a quase 200 quilômetros do centro do Rio, no município de Resende. Vivem ali, no sul fluminense, dez parentes de Ana Cristina Siqueira Valle, segunda mulher do presidente da República. Nomeados por anos no gabinete de Flávio na Alerj, eles moravam naquela cidade. Como mostrou o MP, chegaram a sacar em dinheiro mais de 90% do que receberam de salários do Legislativo. A prática reforça os indícios de que haveria o esquema de "rachadinha".
A prática configuraria peculato, o nome oficial dado para o desvio de dinheiro público feito por servidor.
Participação de miliciano
Na denúncia, portanto, foram priorizados alguns dos supostos núcleos da quadrilha esmiuçados nos últimos dois anos. Um deles é o de pessoas ligadas a Queiroz - como sua mulher filhas e vizinhos - e ao miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega. Ele foi morto em fevereiro de 2020 pela PM da Bahia e teve mãe e ex-mulher empregadas no gabinete de Flávio por anos. Também entraram na peça as transações imobiliárias do senador, uma das principais formas de lavagem de dinheiro detalhadas pela Promotoria. Em 2021, os núcleos que ficaram de fora da primeira etapa de denúncia deverão vir à tona, como indicou o próprio MP
Enquanto essas novas etapas não despontam, Flávio também vive a expectativa de virar réu. A denúncia por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa está no Órgão Especial do TJ-RJ - a cúpula do Judiciário fluminense. Os empecilhos residem muito mais em questões de direito alegadas pela defesa do senador do que no mérito das acusações. Uma ex-assessora, Luiza Souza Paes, já confessou ao MP a existência do esquema no gabinete do então deputado.
Carlos é suspeito de ter assessores ‘fantasmas’ em gabinete
Como os parlamentares da família Bolsonaro sempre mantiveram o hábito de trocar assessores entre si, a investigação que envolve Flávio poderá se encontrar com as apurações sobre suspeitas semelhantes sobre seu irmão Carlos Bolsonaro.
Na apuração contra o vereador do Rio, segundo filho do presidente Jair Bolsonaro, que ainda não avançou tanto quanto a do senador, há vários ex-funcionários investigados no processo que apura as "rachadinhas" na Assembleia. É o caso dos parentes de Ana Cristina Siqueira Valle. Ela própria também está sob investigação, já que trabalhou para o então enteado, no gabinete da Câmara Municipal da capital fluminense.
Por enquanto, o que se sabe sobre as investigações que têm o gabinete do vereador como foco, iniciadas no meio de 2019, ainda se concentra na possibilidade de peculato por meio de funcionários "fantasmas". Foi assim que, um ano antes, começou o caso de Flávio, que logo avançou para outros aspectos que levaram à suspeita de lavagem de dinheiro.
Em setembro, o Estadão revelou que o vereador também fez, durante sua vida pública, transações imobiliárias incomuns. Aos 20 anos, em 2003, pagou R$ 150 mil em dinheiro vivo por um imóvel na Tijuca, zona norte do Rio. Seis anos depois, desembolsou um valor 70% abaixo do avaliado pela prefeitura - com base nos preços de mercado - na aquisição de um apartamento em Copacabana, na zona sul.
As duas práticas - o uso de dinheiro em espécie e a compra por preços inferiores ao avaliado para calcular o imposto - costumam despertar suspeitas em investigadores que atuam na área de lavagem de dinheiro. São, inclusive, pontos presentes na investigação contra Flávio.
Os dois irmãos sempre negam as acusações e alegam perseguição política. Os demais envolvidos não se manifestaram.
No dia 31, ao fazer uma live, o presidente Bolsonaro colocou em dúvida a imparcialidade do Ministério Público do Rio e questionou o que o órgão faria se o filho de um promotor fosse investigado por tráfico de drogas.
No início do mês, o governador em exercício do Rio, Cláudio Castro (PSC), terá de escolher o novo chefe do MP. Aliado da família Bolsonaro e dependente dela para ter força política, ele vai indicar um dos três eleitos para a lista tríplice da Procuradoria - nenhum deles abertamente bolsonarista. Políticos fluminenses acreditam que o clã Bolsonaro será ouvido antes da escolha.
Queiroz é apontado como operador do suposto esquema que teria sangrado os cofres da Assembleia Legislativa do Rio por mais de dez anos. Ficaram de fora da peça ajuizada pelos promotores pontos-chave da investigação. Um deles é o suposto uso de uma loja de chocolates na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, para lavar dinheiro. O ex-deputado e um sócio, suspeitam os investigadores, praticariam fraudes em uma franquia da Kopenhagen. Usariam a contabilidade do negócio para "esquentar" dinheiro supostamente desviado dos salários de funcionários nomeados por Flávio. Eles não trabalhariam e repassariam parte dos vencimentos a Queiroz. A defesa de Flávio sempre negou as acusações.
"Além dos componentes e estrutura ora descritos (na denúncia), ressalva-se a continuidade das investigações para apurar outros possíveis integrantes e/ou núcleos da organização criminosa, em especial a possibilidade da existência de eventual núcleo financeiro destinado, precipuamente, a lavar dinheiro por intermédio de ‘laranjas’ e empresas como a Bolsotini Chocolates e Café Ltda", assinala o MP na peça enviada ao Órgão Especial do TJ-RJ.
Outro núcleo citado ao longo das apurações e que ficou de fora da denúncia está a quase 200 quilômetros do centro do Rio, no município de Resende. Vivem ali, no sul fluminense, dez parentes de Ana Cristina Siqueira Valle, segunda mulher do presidente da República. Nomeados por anos no gabinete de Flávio na Alerj, eles moravam naquela cidade. Como mostrou o MP, chegaram a sacar em dinheiro mais de 90% do que receberam de salários do Legislativo. A prática reforça os indícios de que haveria o esquema de "rachadinha".
A prática configuraria peculato, o nome oficial dado para o desvio de dinheiro público feito por servidor.
Participação de miliciano
Na denúncia, portanto, foram priorizados alguns dos supostos núcleos da quadrilha esmiuçados nos últimos dois anos. Um deles é o de pessoas ligadas a Queiroz - como sua mulher filhas e vizinhos - e ao miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega. Ele foi morto em fevereiro de 2020 pela PM da Bahia e teve mãe e ex-mulher empregadas no gabinete de Flávio por anos. Também entraram na peça as transações imobiliárias do senador, uma das principais formas de lavagem de dinheiro detalhadas pela Promotoria. Em 2021, os núcleos que ficaram de fora da primeira etapa de denúncia deverão vir à tona, como indicou o próprio MP
Enquanto essas novas etapas não despontam, Flávio também vive a expectativa de virar réu. A denúncia por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa está no Órgão Especial do TJ-RJ - a cúpula do Judiciário fluminense. Os empecilhos residem muito mais em questões de direito alegadas pela defesa do senador do que no mérito das acusações. Uma ex-assessora, Luiza Souza Paes, já confessou ao MP a existência do esquema no gabinete do então deputado.
Carlos é suspeito de ter assessores ‘fantasmas’ em gabinete
Como os parlamentares da família Bolsonaro sempre mantiveram o hábito de trocar assessores entre si, a investigação que envolve Flávio poderá se encontrar com as apurações sobre suspeitas semelhantes sobre seu irmão Carlos Bolsonaro.
Na apuração contra o vereador do Rio, segundo filho do presidente Jair Bolsonaro, que ainda não avançou tanto quanto a do senador, há vários ex-funcionários investigados no processo que apura as "rachadinhas" na Assembleia. É o caso dos parentes de Ana Cristina Siqueira Valle. Ela própria também está sob investigação, já que trabalhou para o então enteado, no gabinete da Câmara Municipal da capital fluminense.
Por enquanto, o que se sabe sobre as investigações que têm o gabinete do vereador como foco, iniciadas no meio de 2019, ainda se concentra na possibilidade de peculato por meio de funcionários "fantasmas". Foi assim que, um ano antes, começou o caso de Flávio, que logo avançou para outros aspectos que levaram à suspeita de lavagem de dinheiro.
Em setembro, o Estadão revelou que o vereador também fez, durante sua vida pública, transações imobiliárias incomuns. Aos 20 anos, em 2003, pagou R$ 150 mil em dinheiro vivo por um imóvel na Tijuca, zona norte do Rio. Seis anos depois, desembolsou um valor 70% abaixo do avaliado pela prefeitura - com base nos preços de mercado - na aquisição de um apartamento em Copacabana, na zona sul.
As duas práticas - o uso de dinheiro em espécie e a compra por preços inferiores ao avaliado para calcular o imposto - costumam despertar suspeitas em investigadores que atuam na área de lavagem de dinheiro. São, inclusive, pontos presentes na investigação contra Flávio.
Os dois irmãos sempre negam as acusações e alegam perseguição política. Os demais envolvidos não se manifestaram.
No dia 31, ao fazer uma live, o presidente Bolsonaro colocou em dúvida a imparcialidade do Ministério Público do Rio e questionou o que o órgão faria se o filho de um promotor fosse investigado por tráfico de drogas.
No início do mês, o governador em exercício do Rio, Cláudio Castro (PSC), terá de escolher o novo chefe do MP. Aliado da família Bolsonaro e dependente dela para ter força política, ele vai indicar um dos três eleitos para a lista tríplice da Procuradoria - nenhum deles abertamente bolsonarista. Políticos fluminenses acreditam que o clã Bolsonaro será ouvido antes da escolha.
Leia mais
Comentários