Publicado 14/04/2021 11:15
Rio - "Eu não vejo a hora de ver a minha tia. Sei que estamos na pandemia, mas eu quero poder dar um abraço apertado nela". O desabafo, em tom de alívio, é da dona de casa Raquel Rodrigues de Castro Belfort, sobrinha da aposentada Maria das Graças de Sousa Rodrigues, de 75 anos, resgatada nesta terça-feira (14) pela Polícia Civil, depois de ficar em cárcere privado em uma casa na Praia da Brisa, em Pedra de Guaratiba, Zona Oeste do Rio. Em sua primeira noite, após anos de maus tratos, a idosa dormiu em uma cama quente, diferente daquela sem colchão encontrada em seu quarto, na casa de parentes na Zona Norte do Rio. Pela manhã, tomou uma caneca de leite e comeu biscoitos.
"Ela é uma pessoa de bom coração. Assim que acordou se mostrou preocupada com a dona da casa e com o cachorros. Queria dar comida para os cachorros e medicar a outra senhora", contou uma vizinha que ajudou a família no resgate.
Na próxima segunda-feira a família desembarca no Rio e vai levar a aposentada de volta para a terra natal.
A história para encontrar Maria das Graças poderia virar um roteiro de filme. Irmã mais nova de outras duas irmãs, também Marias - Maria de Nazaré (já falecida) e Maria da Conceição Rodrigues de Castro, de 80 anos -, Maria das Graças saiu de casa ainda moça, em uma cidade no interior de São Luís do Maranhão, para trabalhar e mandar dinheiro para a mãe, na época muito doente.
Em 1969, desembargou no Rio Grande do Sul. Anos depois, depois de terminar um noivado, veio para o Rio de janeiro, em 1982, quando encontrou com a irmã Maria de Nazaré. Seu último contato com a única irmã, Maria da Conceição, que ainda estava com a família no Maranhão foi em 1993, quando recebeu a notícia da morte da mãe. Depois disso, o paradeiro de Maria das Graças se tornou um mistério para a família.
Há quatro anos, quando a mãe entrou em depressão por conta da morte de um filho, Raquel decidiu que faria de tudo para unir as "Marias".
"Eu prometi para a minha mãe que iria achar as irmãs dela de qualquer jeito. Coloquei esse objetivo na minha vida. Comecei a procurar na internet por pessoas que saíram do Maranhão e foram morar no Rio. Procurei por sobrenomes próximos ao nosso e encontrei uma prima que morava na Zona Norte do Rio. Ela também não conhecia a nossa tia e muito menos onde ela morava. Através do cadastro dela no Sistema Único de Saúde, descobrimos que ela estava naquela região. Mas não foi tão fácil chegar ao seu paradeiro, mas Deus colocou um anjo em nossas vidas com nome de Leandra, que foi muito importante para encontrar minha tia. A minha mãe não sabe se chora ou sorri, ela só quer reencontrar com a irmã", descreveu a sobrinha.
Segundo Raquel, a tia passou a viver em Guaratiba depois que vendeu a casa onde morava para ajudar a amiga Therezinha da Silva Moraes, de 82 anos. Com o dinheiro da venda do imóvel, as duas se mudaram para a Zona Oeste e Therezinha colocou Maria das Graças em cárcere privado.
MAUS TRATOS
Para a polícia, a aposentada relatou que só podia sair de casa para jogar o lixo fora. Segundo o delegado Antônio Ricardo Lima, titular da 43ª DP (Guaratiba)., Maria das Graças foi resgatada em situação precária, sem condições de higiene, magra, debilitada, vestindo trapos e em meio a fezes de animais, que conviviam com ela no quintal da casa.
Levada para a delegacia, ela tomou banho e trocou de roupa. Na parte da noite foi levada para a casa de parentes.
INVESTIGAÇÃO E CRIME
A Polícia Civil vai investigar se a aposentada Therezinha da Silva Moraes se apropriava da aposentadoria de Maria das Graças. De acordo com o delegado, a idosa tinha o cartão do benefício do INSS, mas nunca recebeu valores referentes.
A mulher foi autuada por cárcere privado, redução à condição análoga à escravidão e maus-tratos a animais. Ela ainda pode ser indiciada por apropriação indevida, caso a polícia identifique o recebimento da pensão.
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