Publicado 29/04/2021 20:45
Rio - Uma pesquisa realizada pela Diretoria de Estudos e Pesquisas de Acesso à Justiça da Defensoria Pública do Rio mostrou que o testemunho policial é usado como principal fonte para processos contra a milícia. De acordo com os estudos, de 53 processos analisados, 39 consideraram esse método. O levantamento foi realizado entre 2018 e 2019, mas só foi divulgado este ano.
O município do Rio é o local com maior número de ocorrências, aparecendo em 36 dos processos. Em seguida, empatados em número de casos, aparecem Duque de Caxias, Nova Iguaçu, São João de Meriti e Seropédica, na Baixada Fluminense, com dois casos cada e, por fim, Itaguaí, Mangaratiba e São Pedro d’Aldeia, com um cada.
Outros métodos usados nesses processos foram testemunhas civis; comercialização ou prestação de serviços; fatos ocorridos em "localidade de milícia"; cobrança de “taxa de segurança”; veículo utilizado fruto de ação criminosa; itens apreendidos com o possível envolvido; possível envolvido é agente público; confissão; decisão baseada na denúncia do Ministério Público; decisão baseada em denúncia Anônima recebida pelos policiais e outros motivos.
A diretora da pesquisa, Carolina Haber, ressalta que o testemunho policial é uma característica comum não só em processos relacionados às milícias, mas de todos aqueles que não têm testemunhas para depor.
"Quando há vítima, a vítima vai depor. Os que não têm, é o testemunho policial que predomina. No tráfico de drogas é assim também porque, na verdade, é após abordagem policial, em juízo é ele que é ouvido", esclarece.
Segundo Haber, o levantamento pesquisou na jurisprudência do Rio o termo "milícia" e analisou todos os processos que apareceram. A partir da leitura dos acórdãos, os estudiosos puderam entender o que é considerado por juízes e desembargadores para condenar ou não pelo crime de milícia.
A pesquisadora declarou que em determinados processos, foi possível observar a correlação feita pelos desembargadores-relatores entre os réus e suas ocupações enquanto agentes públicos. Ainda segundo ela, apesar da baixa incidência deste fator - que apareceu em apenas quatro dos 53 acórdãos analisados - todos resultaram na manutenção das condenações relacionadas à milícia.
Os réus ocupam cargos na Polícia Militar, no Corpo de Bombeiros e nas Forças Armadas. "A pesquisa não identificou quem são os réus, mas quando analisa quais são os fatores determinantes para considerar que a conduta se enquadra como milícia, um deles é o fato do réu ser agente público", explica a pesquisadora.
O estudo mostra que não há, nos casos que tratam de milícias, uniformidade no emprego dos tipos penais, mas exemplifica cinco deles, sendo associação criminosa; constituição de milícia privada ou organização criminosa; crimes patrimoniais; crimes contra a vida e estatuto do desarmamento.
"É um fenômeno complexo, são vários tipos penais que podem ser aplicados e entender tudo isso faz com que o defensor possa melhorar a atuação no processo", diz Haber. A pesquisa entende que a complexidade das atividades típicas de milícia e a dificuldade da caracterização "refletem-se numa verdadeira polissemia quanto aos fatores que indicam os seus elementos fundamentais."
"Provavelmente, essa complexidade está relacionada ao fato de se tratar de um fenômeno social multifacetário, difícil de ser definido do ponto de vista sociológico, e mais ainda, traduzido para a linguagem jurídica", conclui o relatório.
Leia mais
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.