Publicado 27/06/2021 13:53
Rio -- Eram 22h da noite da última quinta-feira, quando C.H.S.A; 37 anos, havia acabado de colocar mesas na caçamba do seu caminhão, em Copacabana. Seria mais uma noite de frete, se não fosse a abordagem do vereador Gabriel Monteiro (PSD) que, usando sua escolta enquanto parlamentar, realiza ações policiais desde o início do seu mandato. Em depoimento, o motorista disse que foi acusado pelo político de transportar material da contravenção; espancado por homens que usavam roupas pretas e toucas ninjas; algemado; e ameaçado de morte.
Um dia após o ocorrido, a Justiça determinou que caberá à Câmara providenciar a segurança do vereador e a PM já retirou os agentes que o escoltavam.
"Achei que eram milicianos ou assaltantes" disse o motorista, em depoimento. O DIA teve acesso, com exclusividade, aos depoimentos realizados na 12ª DP (Copacabana), além do laudo do exame de corpo de delito, que confirmou as agressões sofridas pelo motorista. "Apertaram muito as algemas, só com a chegada da PM que retiraram", disse. O caso segue sob investigação.
Nas redes sociais, Monteiro afirma que prendeu o motorista, fato que não foi confirmado pelas autoridades. Consta, no depoimento, a classificação de vítima ao trabalhador que, com medo das ameaças sofridas, mudou-se com a família do Rio. "Estou com muito medo, não atendo nem o telefone. Passei a receber ligações de números que não conheço, não estou nem saindo de casa", disse à reportagem. Ainda nas redes sociais, Monteiro disse que no local havia um bingo, o que não foi confirmado.
O uso da escolta da PM pelo vereador para realizar ações policiais já é debatida na Justiça e teve um novo capítulo na sexta-feira, com a sua retirada. A polêmica com a sua segurança já ocorre antes mesmo dele ser eleito, quando ainda era soldado PM. Enquanto militar, ele realizou um registro na delegacia afirmando que passou a ser ameaçado de morte por contraventores.
A ameaça teria ocorrido após Monteiro, que também é Youtuber, ter mostrado um ponto de máquinas caça-níqueis. Apesar da investigação nunca ter confirmado a veracidade da ameaça, a Polícia Militar proveu a segurança do agente, com base em uma normativa da corporação. Ela visa garantir a integridade física do policial e de seus familiares, próximo a sua residência. Mas, Monteiro passou a realizar campanha com a sua escolta, conforme O DIA noticiou, em novembro. Na ocasião, a PM instaurou um procedimento investigatório para apurar a conduta dos agentes -- alguns usavam blusa em alusão ao personagem Justiceiro, da Marvel, além de distintivos não regulamentares.
Ao ser eleito, por não ter mais de dez anos de carreira, ou seja, não possuir estabilidade na carreira, Monteiro foi desligado ex-ofício, pois perdeu o vínculo funcional com a corporação. Automaticamente, ele perdeu o direito à escolta, que foi retirada, com a sua diplomação como vereador.
No entanto, alegando ameaças sofridas, ele solicitou na Justiça o retorno da escolta, que concedeu de forma liminar. A Procuradoria Geral do Estado opinou ser contrária à disponibilização de agentes do Estado do Rio para a sua segurança. Na sexta-feira, o juiz relator Alberto Republicano de Macedo Jr, da I Turma Recursal da Fazenda Pública, votou pela retirada da escolta.
Em seu voto, ele disse: "a atribuição de conferir segurança e/ou solicitar escolta policial ao agravante é da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. (...) Resta evidenciado, portanto, que cabe à Casa Legislativa à qual o agravante faz parte fornecer a segurança ao mesmo na condição de Vereador".
Republicano ainda afirmou que, caso a Câmara não possa fornecer a segurança, cabe à mesma "solicitar e requisitar a escolta ao Poder Executivo Estadual".
Monteiro se vale da escolta para realizar diligências, diz juiz
Ainda segundo o juiz, Monteiro passou a se valer da escolta da PM para realizar diligências. "Ao que parece, fogem ao escopo da atividade parlamentar", disse. E, completou: "Isso porque o vereador agravante, mesmo alegando que está sendo ameaçado e sob risco de ter sua integridade física violada, realizou diligências que ostentam verdadeira natureza policial".
O magistrado destaca que o próprio Monteiro não procura as autoridades para denunciar ilegalidades, "mas solicita apoio à diligência que ele mesmo realizaria". Ele lista, em seu voto, depoimentos de policiais das sala das operações com as abordagens do político.
E, destaca dois links de vídeos do canal do ex-policial em que, segundo o magistrado, "são condutas de natureza eminentemente policiais, com base na escolta que lhe foi garantida".
Em seus vídeos na internet, todos editados, Monteiro filma supostos resgates a animais maltratados, invade unidades de saúde estatais, acusa policiais de corrupção, sem provas -- mesma conduta que já possuía enquanto soldado e que lhe rendeu inúmeras punições em sua ficha disciplinar.
De acordo com policiais da ativa, a escolta do vereador, que era realizada por agentes do Batalhão de Choque, já foi retirada. A reportagem não conseguiu contato com os telefones do advogado de Monteiro.
Leia mais
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.