Publicado 28/11/2021 09:00
"Para com isso que você vai cair daí!" A voz feminina vinha do caixa ao lado do meu no supermercado em Duque Caxias, na Baixada Fluminense. E me fez virar instantaneamente o rosto para conferir o que acontecia: enquanto a mulher começava a passar as compras pela esteira, um garotinho — vestido com a camiseta do Capitão América — parecia tentar surfar dentro do carrinho vazio. Com agilidade, ele mexia o corpo para um lado e para o outro, dando a sensação de que poderia se desequilibrar a qualquer momento. Vendo a cena, pensei que o menino, tão acostumado ao mundo dos super-heróis, certamente imaginava ter todos os poderes para evitar qualquer machucado. Sorri comigo mesma.
Já com as compras nas sacolas, fui embora. Voltei para casa e comecei a percorrer o mundo infantil nas minhas memórias recentes. Logo me lembrei de uma amiga que está toda feliz por finalmente levar o filho de dois anos para passear. Até então, boa parte do universo do menino era limitada só à sua casa, por conta da pandemia.
Ansiosa, a mãe já imaginava que o garoto ficaria agarrado a ela quando estivesse na rua. Mas foi ilusão. A preocupação mudou completamente: ela agora busca fôlego para acompanhar os passos do miúdo, ávido por tanta novidade. Foi assim numa visita ao BioParque, na Quinta da Boa Vista. Quando ela me enviou o vídeo do passeio, reparei que o rapazinho vestia uma camiseta estampada com ondas e um barco à vela na frente. Bem apropriado para quem descobriu que há um mar enorme para navegar por aí, muito além do seu porto seguro.
Fiquei pensando em como nossos passos vão mudando ao longo da vida, em velocidade e cadência. O compasso — mais rápido ou devagar — vem da esperança ou do desânimo, da euforia ou do cansaço, do ímpeto ou da cautela. E também dos anos vividos. Sabedoria é respeitar os diferentes ritmos, mesmo não sendo os nossos. É entender os garotos ansiosos pelas descobertas dentro de um carrinho de compras ou de uma visita ao zoológico. E também respeitar o andar mais vagaroso de quem está há mais tempo na caminhada por aqui.
Foi o que aconteceu num passeio recente das minhas parceiras de pilates a Niterói. A mãe de uma delas contou com a companhia cuidadosa do marido de outra amiga: ele a amparou na hora de se levantar e também caminhou ao seu lado. E uma cena linda ficou na nossa memória: de longe, observamos os dois conversando num dos bancos no pátio do MAC. Uma prova de que a aliança entre experiência e juventude existe.
Como também fez o meu sobrinho João Pedro no Ano Novo de 2019. Com 13 anos à época, ele apareceu para mim numa foto enviada por Whatsapp, na casa de uma querida amiga de Conselheiro Lafaiete, em Minas Gerais. O registro captou o momento em que ele conversava atentamente com a mãe dela, com mais de 90 anos, na sala. Uma imagem que encantou a todos, comprovando que nunca é cedo ou tarde demais para entender e conciliar os diferentes compassos dos nossos relógios biológicos.
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