Se tem uma coisa que incomoda, no mundo digital, é o uso de inúmeras senhas. Para evitar esquecimentos, há uns 20 anos costumo usar quase a mesma, com mínimas variações. É algo assim: no site do Brasil Econômico , minha senha seria BExyz. Já no site do jornal O Dia, seria DIAxyz, e por aí vai. Não é 100% seguro, claro, porque nada é 100% seguro no mundo digital, mas nunca me trouxe problemas. Ainda não.
Lembrei disso lendo aqui a história do mineiro Matheus Cavalieri, de 32 anos, que implantou chips nas próprias mãos e agora não precisa mais perder tempo com senhas. Trata-se de um dispositivo Near Field Communication (NFC), que serve para transmitir informações entre dois dispositivos, via radiofrequência, por até dez centímetros de distância. Ou seja: comunicação em curta distância...
Com os chips implantados (na pele entre o polegar e o indicador, sabe como é?), o Matheus usa um leitor básico para transferir as senhas para seu computador e outros dispositivos. É um documento digital, no fim das contas. Pagou R$ 300 pela brincadeira — que não é muito diferente do preço cobrado no exterior. E o chip não incomoda. Tem 12mm de comprimento.
Quem está investindo muito nessa praia, além das empresas de tecnologia, são administradoras como Visa, Mastercard e American Express, que têm o maior interesse para facilitar, ainda mais, o consumo. Não por acaso, o uso de NFC lá fora é bem mais comum do que no Brasil. Na Coreia e nos EUA, por exemplo, o Samsung Pay, sistema de pagamentos que nasceu com o smartphone Edge, começa a operar este ano.
Mas a experiência do Matheus mostra que a tecnologia tende a ficar mais barata e vingar por aqui também — até mesmo nas soluções ‘mais radicais’, como implantando-a
no próprio corpo.
Pois aí é que está o busílis. Como disse acima, nada é 100% seguro no mundo digital. E se é verdade que os chips implantados podem dificultar, mas não evitar, a ação de hackers para surrupiar os dados do sujeito, eles também podem fazer o contrário: usar o chip, mui discretamente, para abrir portas que estariam supostamente protegidas.
Foi isso que demonstrou o Seth Wahle, famoso entre os hackers dos EUA. Numa conferência de segurança em Miami, ele demonstrou que pode muito bem invadir smartphones com o uso de tecnologia como NFC.
O que o dispositivo faz, na verdade, é transmitir uma espécie de vírus que, devidamente instalado no smartphone da vítima, poderá revirar seus arquivos, roubando dados como contatos, mensagens etc e tal. Tudo o que estiver no aparelho fica vulnerável. O Wahle mostrou que, com o vírus, é possível ativar a câmera, tirar fotos, ligar a lanterna, ou seja, operar o smartphone à revelia do seu dono. Que, eventualmente, nem percebe o que está acontecendo.
Por enquanto, a arma só pode ser usada para smartphones que rodem Android — que, na verdade, são bem mais comuns do que o iOS.
O recado, entretanto, é claro. As dores de cabeça com a segurança digital nunca vão dar um descanso. Nem os pilantras online. E eles são muitos.
Mangabeira Unger tem razão
Há seis meses, durante uma visita à Universidade de Harvard organizada pelo pessoal da Innovation Trip, tivemos um encontro com o hoje ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger. Gostei da conversa e, por isso, recomendo o debate que será realizado amanhã, às 15h, com a presença do Mangabeira, do Rubens Penha Cysne (FGV/EPGE) e José Roberto Rodrigues Afonso (FGV/IBRE). Será na Praia de Botafogo,n°190, com inscrições gratuitas pelo http://epge.fgv.br/.
Isso posto, vale ressaltar algumas ideias do Mangabeira sobre o nosso setor de tecnologia, publicadas ontem aqui no BE: “Se quisermos uma escalada de produtividade, temos que dar
um choque de ciência e tecnologia na economia.”
“...ideia (que) não é consenso no governo, mas eu a defendo: é o abandono unilateral de todas as restrições tarifárias e não tarifárias à importação de alta tecnologia.”
“(O melhor caminho para o futuro é)... Unificar o mercado de crédito e ampliar drasticamente os processos, as iniciativas, para dar acesso ao crédito e à tecnologia e às práticas avançadas para esse vasto empreendedorismo. O ponto crucial, do ponto de vista do empreendedor, é o casamento
da tecnologia avançada com planos de negócios capazes de criar novos mercados, novas demandas, e novos grupos de consumidores. Um dos agentes empresariais que mais faz falta no Brasil é a figura da empresa média vanguardista. Na maior parte das grandes economias do mundo, as maiores empresas são cercadas por uma penumbrade empresas menores, porém muito avançadas, que acalentam as inovações mais radicais. É difícil para uma megaempresa ser radicalmente inovadora. A inovação ocorre nessa penumbra. E quando ela tem êxito, a grande empresa assimila a inovação, muitas vezes comprando a empresa menor.”
“Se o Brasil não operar uma grande transformação na qualidade do ensino básico, nós vamos estar condenados a ficar por toda a vida como exportadores de soja e minério de ferro.”